Friday 31 July 2015

Palácio Anadia

A Casa Anadia é que ainda está de pé, esse palácio à esquina das Ruas das Amoreiras e de Silva Carvalho (antiga de de São João dos BemCasados), com largo brasão armoriado dos Sás, no alto da fachada. [Araújo: 1939]


O núcleo original do Palácio Anadia remonta ao séc. XVII, correspondendo ao solar da Quinta de Recreio de São João dos Bemcasados. Objecto de ampliações, demolições e remodelações ao longo dos tempos (final do séc. XVII, séc. XIX e séc. XX), somente no 1º quartel do séc. XVIII, esta propriedade foi parar às mãos dos Senhores de Anadia, advindo daí o nome do Palácio. 
 
Aquela quinta e mais duas do mesmo Palhares (a dos Pousos, que chegava a Campo de Ourique, e a do Pé do Mu (por muro?) ou do Fetal, que se prolongava até à cerca do convento das trinas do Rato) — recorda Norberto de Araújo — , foram à praça, por dividas, em 6 de Outubro de 1700, adquirindo-as Francisco Duarte de Almeida e Sousa, bailio do Acre da Ordem de Malta, que delas tomou posse formal em 1706 (papéis do arquivo da Casa Anadia), doando logo casas e quinta de S. João (dos Bemcasados) a seu irmão Aires de Almeida e Sousa. Um descendente deste, Manuel de Sousa e Almeida, casou com D. Violante Engrácia de , filha de Aires de Sá e Melo e de D. Isabel de Melo, Senhores da Anadia, e eis como o solar arrabaldino de S. João dos Bencasados principiou por se ligar aos Anadias.

Palácio Anadia [195-]
Rua Silva Carvalho, 345-347
O Palácio Anadia situado na Rua Silva Carvalho, onde tem a sua fachada principal, e contornando para a Rua das Amoreiras, é ainda uma vistosa edificação de tipo solarengo, valorizada pelo seu alçado nobre e por alguns pormenores interiores. Pode ser considerado um dos poucos. palácios de Lisboa ainda na posse, posto que por linhas indirectas, da família dos primeiros reedificadores. [Araújo: 1950]
Horácio Novais, in Lisboa de Antigamente
Palácio Anadia [1908]
Rua Silva Carvalho, 345-347
O Palácio Anadia, no antigo sítio de S. João dos Bemcasados, é uma construção setecentista, mas com transformações radicais no decorrer do século passado [XIX]. Contudo o seu núcleo fundamental recua, pelo menos, ao último quartel do século XVII, representado por umas casas nobres, integradas na quinta de S. João, que aqui possuía José Rebelo Palhares, de uma dinastia de comerciantes destes apelidos que se instalaram em Lisboa noprimeiro terço daquele século
. [Araújo: 1950]
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Classificado como Imóvel de Interesse Municipal, trata-se de um exemplar de arquitectura residencial barroca palaciana, de planta longitudinal, composto pela articulação de 3 corpos rectangulares, separados por pilastras de cantaria, demarcando-se o corpo central, mais estreito e destacado, no qual se rasga o portal nobre, de verga curva larga, com base de cantaria e guarda em ferro forjado, de finais de Setecentos. Este eixo central surge coroado por frontão triangular com pináculos nos acrotérios e a pedra de armas dos Sás-Anadias ao centro do tímpano. 

Palácio Anadia [1967]
Rua Silva Carvalho, 345-347
Frontão triangular com pináculos nos acrotérios e a pedra de armas dos Sás-Anadias — escudo com o campo enxadrezado de seis peças em cinco palas, tendo no centro, ao alto, um pelourinho (ou coluna coroada dos Colonas?), com coroa condal sob o timbre expresso por um búfalo. [Araújo: 1950]

Augusto Fernandes, in Lisboa de Antigamente

No interior merecem destaque: os silhares de azulejos e pinturas murais do núcleo seiscentista; o programa decorativo novecentista de estuques polícromos da Sala de Bilhar e da galeria do 1º piso; e a actual capela, construída em 1884, que integra alguns elementos da anterior capela de São João dos Bemcasados (demolida para corrigir o alinhamento da rua), nomeadamente a porta de acesso do exterior datada de 1689, o altar em talha e as guardas em madeira entalhada e polícroma, que protegem o coro e o altar, sendo já de finais do séc. XVIII o seu retábulo-mor. (cm-lisboa.pt)

Palácio Anadia, jardins [195-]
Rua Silva Carvalho, 345-347
O antigo jardim e mata, hoje muito reduzidos, são defendidos da rua por um muro, com janela gradeada, que se segue à fachada Nascente, que, contornando a Rua das Amoreiras, fecha a vedação. [Araújo: 1950]
Horácio Novais, in Lisboa de Antigamente

Rua da Regueira

O arrabalde de Alfama articulava-se entre dois pólos ligados pela Regueira: o do núcleo termal e das fontes públicas e a norte, o do bosque de Alfungera. Alfungera deriva provavelmente do árabe al-fujrâ que significa lugar por onde se escapa a água. Poderá ter derivado de uma pequena gruta que tenha existido no bosque, por onde brotaria a água que alimentava um pequeno rego de água: a regueira. Ainda hoje sob a Rua da Regueira murmura a água encanada por uma antiga conduta de pedra.

Rua da Regueira, esquina com os becos da Bicha e da Alfurja, [Início séc. XX]
José A. Bárcia, in Lisboa de Antigamente

Thursday 30 July 2015

Chafariz da Rua das Amoreiras

Pouco conseguimos apurar sobre este chafariz nº. 13, junto à Mãe d'Água das Amoreiras, excepto o facto de já aparecer em desenho de 1838 e ter sido demolido por volta de 1938. Ao que tudo indica, parece ter sido «primo», ou substituto. do antigo chafariz existente no jardim da Praça das Amoreiras, construído em 1794(?) por autor desconhecido. Diz-nos a Memória de Velloso de Andrade (1851) (bom livro, e bem feito), que a fundo examinou o assunto: «Este Chafariz [da Praça das Amoreiras] foi o primeiro onde correo a Agua Livre; e os sobejos vão para o tanque de Lavadeiras na Rua do Arco das Aguas Livres [hoje Rua das Amoreiras], que foi feito em 1811; e deste vão pela Calçada para a Cerca das Freiras do Rato». Segundo relatos da época «Belo era o chafariz das Amoreiras e mais vizinho do reservatório do Aqueduto». Além disso, e de acordo com o «Diário do Governo de Abril de 1822», tinha «4 Bicas, 3 Companhias, 3 Capatazes, e 13 dispensados, que faz 91 [aguadeiros]».

Chafariz das Amoreiras [1938]
Rua das Amoreiras
Eduardo Portugal, in A.M.L.

Chafariz e Reservatório da Mãe de Água das Amoreiras [séc. XIX]
Rua das Amoreiras
Eduardo Portugal, in A.M.L.

Um dado é certo: ambos chafarizes estavam erguidos em 1911, conforme se pode constatar na Planta Topográfica de Lisboa, da autoria de Júlio António Vieira da Silva Pinto e de Alberto de Sá Correia.

Planta de alinhamento da Rua das Amoreiras, 1892
Garcia, Frederico Ressano 1847-1911, engenheiro, in A.M.L

Levantamento da Planta de Lisboa: 1911 [fragmento]
Júlio António Vieira da Silva Pinto e de Alberto de Sá Correia,  
in A.M.L.

Wednesday 29 July 2015

Casa das Bengalas

O plano de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel da reconstrução de Lisboa após o terramoto de 1755, aprovado pelo Marquês de Pombal, apresentava uma rede de ruas longitudinais e transversais, cortadas em ângulos rectos, com importância diferente que é traduzida pela largura das suas ruas e passeios.
Em 5 de Novembro de 1760 foi inaugurada em Lisboa a pratica de atribuição de nomes de ruas por decreto. Neste diploma D. José estabelece a denominação dos arruamentos localizados entre a Praça do Comércio e o Rossio, bem como regulariza a distribuição dos ofícios e ramos do comércio. 
 
Rua da Prata, 87~91 [c. 1910]
Joalharia e ourivesaria Casa das Bengalas de António Costa
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente
  
A Rua da Prata, uma das artérias, recebeu, por este diploma, a denominação de Rua Bela da Rainha. Ficou também estabelecido que nela deviam ser arruados os ourives da prata e nas lojas que sobejarem os livreiros que antes viviam na sua vizinhança.
A homenagem efectuada a um membro da realeza levou a que no período da Primeira República, designadamente, em 5 de Novembro de 1910, este topónimo fosse alterado para Rua da Prata, numa manifestação clara de republicanismo em contraposição com a monarquia. (cm-lisboa.pt)

Rua da Prata, 87~91 [c. 1910]
Joalharia e ourivesaria Casa das Bengalas de António Costa
Alberto Carlos Lima,
in Lisboa de Antigamente

Chafariz da Fonte Santa

Localizado na Rua Possidónio da Silva, aos Prazeres, este chafariz é o único em Lisboa com a designação de Fonte Santa, nome que adquiriu em virtude das propriedades medicinais da sua água, que, segundo parece, curava doenças do foro dermatológico e oftalmológico. No final do séc. XVI, esta fonte, com 2 bicas e 2 tanques, integrava a Quinta dos Prazeres, que foi enfermaria de pestíferos depois da epidemia de 1598. 

Rua Possidónio da Silva [c. 1951]
Eduardo Portugal, in A.M.L.

Actualmente, possui apenas um tanque de recepção de águas com a respectiva bica, que surge encimada por um baixo-relevo em calcário com as armas da cidade. De fachada simples, destaca-se o seu remate invulgar "em quilha", à semelhança de um frontão de igreja em forma de arco abatido, coroado por uma cruz, cuja peanha evidencia o ano de 1735, data provável da reconstrução que lhe deu o aspecto actual. (fonte(s): cm-lisboa.pt; igespar.pt)

Rua Possidónio da Silva [s-d.]
Autor não identificado, in A.M.L.

Tuesday 28 July 2015

Jardim Zoológico de Lisboa

Inaugurado em 1884, o Jardim Zoológico de Lisboa foi o primeiro parque com fauna e flora da Península Ibérica. Foram vários os seus fundadores - Dr. Pedro Van Der Laan, José Thomaz Sousa Martins e o Barão de Kessler — que contaram com o apoio de várias personalidades, o Rei D. Fernando II e o zoólogo José Vicente Barboza do Bocage.
As primeiras instalações situaram-se no Parque de José Maria Eugénio de Almeida, à Palhavã, que foi cedido gratuitamente pelos seus proprietários.

Jardim Zoológico de Lisboa, Sete Rios, entrada [1905]
Paulo Guedes, in A.M.L.

A 28 de maio de 1905, foram inauguradas as novas e definitivas instalações na Quinta das Laranjeiras. No dia 12 de Março de 1913, o Jardim Zoológico foi declarado Instituição de Utilidade Pública.

Jardim Zoológico de Lisboa [195-]
O busto de bronze - que se vê ao centro da alameda - é de Manuel Emídio da Silva, (Benemérito Amigo do Jardim Zoológico) da autoria do escultor Anjos Teixeira, filho. Inaugurado em 1937.
António Passaporte, in A.M.L.

As inúmeras remessas de animais vindos de África e do Brasil contribuíram para que, ao longo dos anos, o Jardim Zoológico tivesse uma das colecções de animais mais vastas e diversificadas do mundo.
Destacaram-se, na realidade, alguns governadores das ex-províncias ultramarinas no contributo para o enriquecimento da colecção zoológica com exemplares de espécies exóticas, pouco conhecidas e muito atractivas.
Em 1952, a Câmara Municipal de Lisboa galardoou o Jardim Zoológico com a Medalha de Ouro da Cidade. (in zoo.pt)

Jardim Zoológico de Lisboa [1959]
Recinto dos elefantes
Arnaldo Madureira, in A.M.L.

Monday 27 July 2015

Rua Nova do Carvalho

Carvalho (Beco do) — Ou Rua Nova do Carvalho. Anteriormente ao terramoto de 1755, havia na freguesia de S. Paulo um beco denominado «da Carvalha».¹ Corria na direcção N. S., e ficava «entre a rua direita de S. Paulo e a da Praia [de S.Paulo?]». Tinha de comprimento 79 varas, 2 p. e 7/10, e de largura 2 varas, 4 p. e 9/10 [vd. N. do A.]. É provável reminiscência desta denominação transmudado o género, a da actual «Rua Nova do Carvalho», a qual, conquanto lançada na orientação oposta, deve avizinhar o poiso do antigo beco referido.
¹ «Que antigamente chamavam do Varão» , diz Carvalho da Costa [1712].
(BRITO, Gomes de) Ruas de Lisboa. Notas para a história das vias públicas, 1935)

N. do A. A «vara» correspondia a 110cm e o «pé» a 0.33cm.

Rua Nova do Carvalho, lado nascente.|c. 1940|
Denominado Arco Pequeno, sendo  o Arco Grande o da Rua de S. Paulo; Rua do Alecrim
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente
 
A Rua Nova do Carvalho, que liga a Travessa do Corpo Santo à Praça de São Paulo, na zona do Cais do Sodré, tal como a Travessa do Carvalho, evoca a família do Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, responsável político pela reconstrução de Lisboa após o Terramoto de 1755 e, sobretudo o seu irmão Paulo de Carvalho e Mendonça.
O plano urbanístico de Pombal resolveu a forte inclinação da vertente da Rua do Alecrim, prolongando-a numa espécie de ponte em dois grandes arcos sobre a Rua de São Paulo e a Rua Nova do Carvalho e, este projecto mereceu especial atenção do Marquês de Pombal (1699-1782) que encarregou o seu irmão Paulo de Carvalho e Mendonça (1702-1770), que foi Monsenhor da Patriarcal de Lisboa, Inquisidor-mor e Presidente do Senado da Câmara (1764), da administração das obras da Praça, a par de outras obras de primeira importância para a cidade, como os Paços do Concelho, o Depósito Público e o Cais da Ribeira.
 
Rua Nova do Carvalho, lado poente.|c. 1947|
Denominado Arco Pequeno, sendo  o Arco Grande o da Rua de S. Paulo; Rua do Alecrim
Martinez Pozal, in Lisboa de Antigamente

N.B. Para que a Rua do Alecrim descesse até à margem do Tejo e obtivesse assim uma formosa entrada — diz Pinho Leal no seu Portugal antigo e moderno — , foi preciso ao insigne arquitecto da nova Lisboa, Eugénio dos Santos Carvalho, vencer a grande dificuldade que lhe apresentava o terreno, na quebrada do Sul da rua.
Para isto concebeu, desenhou e executou arco (viaduto) que passa sobre a Rua de S. Paulo, por cuja circunstância se lhe deu o nome de Arco de S. Paulo (ou Arco Grande). Este arco, de ponto abatido e a ponte toda obliqua, a sua solidez e elegância, constituem esta obra um primor de arte neste género.
Pouco mais abaixo deste arco, há outro (denominado Arco Pequeno) que dá passagem à rua inferior (Nova do Carvalho). Estes arcos tinham primeiramente as guardas feitas de parede: hoje têm boas e solidas grades de ferro.
(PINHO LEAL, Augusto Soares de Azevedo de, Portugal antigo e moderno, 1874)

Chafariz da Estr. das Garridas

A Estr. das Garridas — encravada entre a rua República Peruana e a Estrada de Benfica — ainda existe,  perdida no meio da densa floresta de betão que brotou da terra naquele antigo bairro de Lisboa. O chafariz localizar-se-ia aqui a escassas centenas de metros da igreja de Nossa Senhora do Amparo.

Estr. das Garridas [Início séc. XX]
Sabendo-se que existiu no local uma Quinta das Garridas pode-se colocar a hipótese de derivar desta a origem do topónimo.
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente


Sunday 26 July 2015

Igreja de S. Jorge de Arroios

Esta igreja terá sido erguida entre 1820-1828, depois da anterior ter ficado destruída pelo sismo de 1 de Novembro de 1755. Foi demolida por volta de 1970. Eis como a descreve o mestre Norberto de Araújo nas suas «Peregrinações em Lisboa», vol. IV, p. 84:
   "Na sua simplicidade, fachada banal com uma única porta e com três janelas envidaraçadas, tudo liso, apenas com um apontamento arquitectónico nas pilastras de ordem jónica - é esta a Igreja de S. Jorge de Arroios. Podemos fazer-lhe uma pequena visita.
   S. Jorge de Arroios é uma das mais pobres igrejas de Lisboa embora, cheia de claridade, esimpática. Possue uma única nave. Ostenta quatro capelas laterais: do lado esquerdo, a começar da entrada do templo, a primeira capela é de S. Miguel, N.ª S.ª do Carmo e N. S. do Perpétuo Socôrro, e a segunda (antiga do Santíssimo) é do Senhor dos Passos e de N.ª S.ª das Dôres; do lado direito as capelas são do Sagrado Coração de Maria e de Santa Terezinha, a primeira, e do Sagrado Coração de Jesus e Santa Cecília, a segunda. Nos topos há os altares pequenos de Santo António e de N.ª S.ª de Fátima.
A capela-mór guarda hoje o Santíssimo no centro do altar, e sôbre ela a imagem, tão graciosa, embora sem valor artístico, de S. Jorge; aos lados N.ª S.ª da Conceição e S. José.
   O grande interêsse da Igreja é, porém, o Cruzeiro — considerado monumento nacional."

Largo de Arroios [Início séc. XX]
José Artur Leitão Bárcia,  in A.M.L.

O padrão-cruzeiro é uma homenagem de D. João III e do senado da Câmara à memória da Rainha Santa Isabel, medianeira das pazes entre D. Afonso IV e D. Dinis prestes a entrarem em batalha no campo de Alvalade. É obra dum escultor portuense cujo nome se perdeu e apresenta numa face Cristo Crucificado; na outra, N. Senhora da Piedade com Jesus descido da Cruz no regaço e, por baixo, S. Vicente segurando a nau e os corvos numa mão e a palma do martírio na outra. Foi primeiramente erigido no largo, resguardado por uma cobertura em pirâmide assente em quatro pilares de cantaria, donde foi retirado em 1837. 
Em 1895 a paroquial de S. Jorge de Arroios recebeu obras e o cruzeiro passou da sacristia para o adro coberto da igreja de Arroios.


Cruzeiro da igreja de São Jorge de Arroios [Início séc. XX]
José Artur Leitão Bárcia,  in A.M.L.

Rua da Esperança

«Esta Rua da Esperança, com carácter bairrista, despido de pitoresco, mas expressivo - e que deve seu nome ao nobre Convento da Esperança [...] foi reconstruída depois do Terramoto; dela saem, pelo lado Norte, agora à nossa esquerda, a Calçada do Castelo Picão, a Travessa das Izabéis, e a Travessa do Pasteleiro, bizarras e populares, que vão dar ao coração da Madragoa, e pelo lado Sul a já citada Travessa dos Barbadinhos». (ARAÚJO,Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. VII, p. 22, 1938)
Artéria anterior ao Terramoto de 1755, já que depois deste foi aberta a Calçada Marquês de Abrantes para descongestionar o trânsito que se fazia então pela Rua da Esperança.

Rua da Esperança [Início do séc. XX]
O n.º 46 corresponderá à loja de alfaiate que ali se vê à esquerda. Segue-se a Tv. do Pasteleiro e, ao fundo, a Avenida Dom Carlos I. Boa parte destes prédios ainda lá estão.
Fotógrafo não identificado, in A.M.L.

Rua dos Cegos, 20-22

«Havia na fachada desta casa, há anos — e vê-se em estampas antigas — um altarzinho com o seu lampião, cousa de aguarela e de museu de humildades religiosas; o "procurador do senhorio" vendeu-o.»  (Norberto de Araújo, in Peregrinações em Lisboa, vol. II, p. 74, 1938)
Casa quinhentista da Rua dos Cegos, 20-22 [s.d.]
Calçada do Menino Deus
Ferreira da Cunha, in Lisboa de Antigamente

Numa casa de ressalto quinhentista, rara na Lisboa pós terramoto, encontra-se aplicado a cópia de um registo de azulejos seiscentista, realizada por volta de 1930. Trata-se de uma peça policroma, sobre fundo branco, tendo representada uma custódia (alusão à Eucaristia), ladeada por dois anjos. O exemplar original pode ter constituído o elemento central de um frontal de altar reaproveitado, sendo paradigmático a passagem da peça, do espaço sagrado para o espaço profano. Os painéis daquela centúria são geralmente pintados por artesãos sem escola, tendo os desenhos contornos a manganês.[...] in museudacidade

O registo de azulejos retrata a apresentação do Santíssimo por dois querubins. O pequeno elemento em ferro destinava-se à suspensão da candeia para iluminar o Santíssimo.

Casa quinhentista da Rua dos Cegos, 20-22 [c. 1900]
Calçada do Menino Deus
José Artur Leitão Bárcia, in Lisboa de Antigamente

Saturday 25 July 2015

Praça Duque da Terceira, o Relógio de Sol e o Hotel Central

Foi no famoso Hotel Central (encerrado em 1919), o melhor hotel de Lisboa desse tempo, onde se hospedavam reis, presidentes e figuras ilustres, como Júlio Verne (que lá jantou duas vezes), que Carlos da Maia viu pela primeira vez Maria Eduarda:

        «Entravam então no peristilo do Hotel Central — e nesse momento um coupé da Companhia, chegando a largo trote do lado da Rua do Arsenal, veio estacar à porta.[...] Craft e Carlos afastaram-se, ela passou, com um passo soberano de deusa, maravilhosamente bem feita, deixando atrás de si como uma claridade, um reflexo de cabelos de oiro, e um aroma no ar.» 
(in Eça de Queiroz, Os Maias 1888)
Praça Duque da Terceira [1858]
Praça Duque da Terceira, o Relógio de Sol e o Hotel Central
Amédée de Lemaire-Ternante, 
, in Lisboa de Antigamente

De acordo com olisipógrafo Noberrto de Araújo, a configuração desta praça dos «Remolares», era muito diferente da actual: «Há sessenta anos [c. 1880] o mar chegava sensivelmente aonde corre a linha do eléctrico» [...]
«Ao centro desta Praça onde se ergueu o monumento ao Duque da Terceira, existiu até 1874 (não sei desde quando) um relógio de sol que assentava sôbre um pedestal acima de uma escadaria circular. A «Merediana dos Remolares» ou «do Cais do Sodré», que muita chalaça mereceu aos alfacinhas, era, afinal de contas, mais leal que os relógios das torres.»  
(in Norberto de Araújo, Peregrinações em Lisboa, vol. XIII, p. 40 [*1939])

Praça Duque da Terceira [c. 1910]
Praça Duque da Terceira e o Hotel Central
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Friday 24 July 2015

Royal Cine

Em 1929, Agapito da Serra Fernandes, entregava ao arquitecto Norte Júnior a tarefa de conceber uma sala de cinema — o Cine Royal. Exibindo na fachada o «selo» do seu proprietário — a famosa estrela que insistentemente se reproduz nos painéis azulejares e na calçada do «Bairro Operário Estrela de Ouro» (Graça)  — é inaugurado no Natal com o filme «O Cadáver Vivo», disponibilizando ao público uma sala com espaço para orquestra e com capacidade para 900 lugares, contando com 1ª e 2ª plateias e um balcão a descrever um «U», localizando-se os camarotes lateralmente. 
O Royal Cine estabeleceu a quinta-feira como seu dia de estreias, apresentando a particularidade da realização, todas as quartas-feiras, de «matinées-dançantes», por convite.

Cinema Royal, carinhosa e popularmente conhecido como o «Rolhas» [1977]
Rua da Graça, 100
Vasques, 
in Lisboa de Antigamente

A 5 de Abril de 1930 — através duma aparelhagem «Western Electric» considerada, então, uma das marcas mais reputadas — é exibido o filme «Sombras Brancas nos Mares do Sul», de W. S. Van Dyke, apresentado pela Metro-Goldwin-Mayer, introduzindo deste modo o cinema sonoro em Portugal, facto que foi devidamente assinalado pela presença do Presidente da República.
Na década de 1980 o espaço é transformado em supermercado, o que implica demolições, restando hoje do antigo edifício apenas a fachada e o átrio da entrada.

Cinema Royal, matiné [1930-01-24]
Rua da Graça, 100
Fotógrafo não identificado, 
in Lisboa de Antigamente

Publicidade ao filme  sonoro «Sombras Brancas nos Mares do Sul»

Café Royal

O afamado Royal, fundado em 1906, era frequentado por alguma da elite intelectual portuguesa; por ali passaram figuras como o pintor Columbano Bordalo Pinheiro ou o escritor Fernando Pessoa, entre outras.
«No predio que torneja da praça dos Remolares [Pç. Duque de Terceira] para a rua do Alecrim. encontra-se o modernissimo café Royal, no 1.º andar do qual predio existiu, em 1854, o restaurant de João da Matta, o mais espirituoso theorico da gastronomia portugueza, aquelle cujos divinos pitéus excitavam o paladar da aristocracia do garfo.»
(in Serões:revista mensal illustrada, Ferreira & Oliviera, 1909, p. 366)
 Café Royal [1939]
Praça Duque da Terceira; Rua Bernardino Costa
Alberto Carlos Lima,  in Lisboa de Antigamente

Thursday 23 July 2015

Pátio do Carrasco (ou do Gama)

Do passado arquitectónico fala-nos ainda o Pátio do Carrasco, essa curiosidade cenográfica de Lisboa, em cuja fachada se vislumbram três janelas quinhentistas, de verga, e caneladas, com vestígios do delicioso mainel que as bipartia. Para o interesse pitoresco do sítio do Limoeiro o Pátio do Carrasco chega, mais no conjunto do que no pormenor, frentes de pardieiros disfarçados, escada decorativa sem alpendre, boca de entrada sem arco nem abóbada dois palmos de pobreza resignada, que se engrinalda pelo Santo António, e canta durante todo o ano.
(ARAÚJO, Norberto de Araújo, Legendas de Lisboa, pp. 71, 1943)
Em Lisboa, e imediatamente à frente do Largo do Limoeiro, junto à antiga Cadeia encontramos o Pátio do Carrasco, estranhamente funesto e degradado. Por aqui terá vivido temporariamente Luís António Alves dos Santos (1806–1873), «o Negro», marcado pela casualidade histórica de ter sido o último carrasco de Portugal.

Pátio do Carrasco |c. 1940|
Largo do Limoeiro, 3
Muito interessante é a fachada sobre o Largo do Limoeiro, onde se abrem em três pavimentos, janelas do séc. XVI, de verga direita canelada, com moldes e contra-moldes nas ombreiras, em algumas das quais se percebem vestígios do mainel que as bipartia ao alto. É dos poucos exemplares de casas quinhentistas existentes em Lisboa, É curioso o aspecto interior do pátio, onde há ainda pormenores construtivos dos séc. XVII e XVIII. [Proença: 1924]
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Dizem que haveria ali um túnel subterrâneo por onde Luís caminhava até à prisão do Limoeiro, mesmo ao lado. No local onde estaria essa passagem, ainda hoje se ouvem gritos.
Os moradores pensam que são do próprio Luís, atormentado pelas mortes que causou e que fizeram dele «o último carrasco de Portugal», com um salário de 4.100 réis e direito a referência num livro de Camilo Castelo Branco.

Pátio do Carrasco |c. 1960|
Largo do Limoeiro, 3
Artur Pastor, in Lisboa de Antigamente

Mas é aqui que a história se torna difícil de entender: é possível que Luís Alves nunca tenha executado ninguém. Da única vez que foi encarregue de o fazer, em Tavira, deu ao seu imediato o dinheiro que tinha consigo, para que o substituísse. Como na época os carrascos usavam capuz, era possível trocarem de lugar sem que ninguém se apercebesse. Será que Luís grita atormentado pelas mortes que causou na juventude? O carrasco lutou ao lado dos absolutistas, no século XIX, e confessou ter matado dois homens em legítima defesa. Morreu aos 67 anos, com um ataque de asma, já depois da abolição da pena de morte em Portugal.
(FIDALGO, Vanessa, 101 Lugares para Ter Medo em Portugal, 2013)
Pátio do Carrasco, Roque Gameiro, 1925
 É curioso o aspecto interior do pátio, onde há ainda pormenores construtivos dos séc. XVII e XVIII.

Almirante Reis, 2-2K

Em 1908 premiou-se, pela primeira vez, um edifício de rendimento cujo piso térreo era ocupado por estabelecimentos comerciais. Edifício de gaveto, localiza-se na Avenida Almirante Reis, 2-2K, propriedade de Guilherme Augusto Coelho com projeto de Arnaldo R. Adães Bermudes (1864-1948). De destacar a decoração em motivos Arte Nova, com elementos em ferro forjado e painéis de azulejo, e ainda a cúpula que remata o edifício.

Almirante Reis, 2-2K [1965]
Prémio Valmor de 1908
Arnaldo Madureira, in Lisboa de Antigamente

Wednesday 22 July 2015

Casa do Ferreira das Tabuletas

Mandada edificar, em 1864, nos terrenos do extinto Convento da Santíssima Trindade, por Manuel Moreira Garcia, capitalista galego de fortes convicções maçónicas, a Casa do Ferreira das Tabuletas é um edifício, de feição pombalina, com a fachada dividida em três panos e quatro registos, que apresenta um revestimento azulejar da autoria do pintor e azulejador Luís António Ferreira (Fáb. Viúva Lamego), mais conhecido por Ferreira das Tabuletas, daí o nome da da casa. A composição azulejar preenche o espaço dos três pisos superiores por completo, integrando-se perfeitamente na estrutura arquitectónica como um esquema cenográfico, criando efeitos de profundidade e riqueza cromática. 

Casa do Ferreira das Tabuletas [194-]
Rua da Trindade, 28-34
Em 1834 na sequência da extinção das ordens religiosas, os terrenos e o que restava do convento da Santíssima Trindade, foram divididos pelo governo e vendidos a capitalistas. Manuel Moreira Garcia, capitalista de origem galega e de fortes convicções maçónicas, compra e constrói no local o Palácio da Trindade, a Cervejaria Trindade e esta Casa do "Ferreira das Tabuletas". 
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Sendo um dos mais originais programas decorativos exteriores da arquitectura lisboeta, congrega símbolos maçónicos, ligados aos ideais do proprietário, como o Olho da Providência, com diversas alegorias. Neste caso revela a sua originalidade por integrar falsos elementos arquitectónicos, como os nichos com figuras humanas de gosto clássico, representando a Terra, a Água, a Indústria, o Comércio, a Agricultura e a Ciência, assim como por imitar a pintura em «tromp l'oeil». 
Encontra-se classificada como Imóvel de Interesse Público.

Casa do Ferreira das Tabuletas [1949]
Rua da Trindade, 28-34
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Lojas de Antanho: Rua 1.º de Dezembro

Esta artéria, na designação — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , sucedeu em 1908 à antiga Rua do Príncipe. A serventia parece que fora chamada pelo vulgo, no tempo de Pombal, depois do Terramoto, Rua Nova das Hortas e Rua das Hortas (e que constituiria referência oral à Horta da Mancebia ou a horta dos terreiros do Duque de Cadaval ou dos Condes de Faro, mais para Norte).

Rua 1.º de Dezembro  |c. 1911|
Casa Memória, aparelhos de gymnastica; Alfaiataria Leão Verde; Luvaria e  perfumaria;  Alves, rouparia e gravataria. E ainda, um dentista e um otorrinolaringologista no 2º. andar
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Antes de 1755 a Rua tinha já o traçado sensivelmente idêntico ao de hoje, e chamava-se Rua de Valverde – lindo nome.==
(ARAUJO, Norberto de Araújo, Peregrinações em Lisboa, vol. XII, p. 85, 1939)

Praça de D. Pedro IV esquina com a Rua 1.º de Dezembro  |c. 190-|
CAlfaiataria Leão Verde; Luvaria e  perfumaria;  Alves, rouparia e gravataria. 
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Tuesday 21 July 2015

O Arsenal de Marinha no Terreiro do Paço

Neste local foi mandado construir por D. Manuel I os chamados estaleiros da Ribeira das Naus, a ocidente do novo palácio real, sobre o local das tercenas medievais. O terramoto de 1755 destruiu esse importante complexo, tendo sido reconstruido em 1759 segundo projecto de Eugénio dos Santos. No início da segunda metade do séc XIX, o Arsenal da Marinha começa a adaptar-se à construção de navios de ferro movidos a vapor.

Fotografia aérea do Terreiro do Paçoo, destaca-se a antiga Doca Seca do Arsenal de Marinha e o Cais da Caldeirinha [entre 1930 e 1932] 
Manuel Barros Marques, in Lisboa de Antigamente
Doca seca do Arsenal de Marinha e a Caldeira (esq) [ant. 1900]
Chaves Cruz, in Lisboa de Antigamente

Nos fins do século XVI, ainda. no tempo do domínio filipino, construiram-se duas docas ou caldeiras lado a lado (uma elas quais era conhecida por caldeirinha, vd. 3ª foto), uma terceira doca de abrigo de pequenas embarcações, e duas carreiras de construção de barcos de guerra; e ainda, pelo tempo adiante, construíram-se naquele recinto, armazéns, oficinas e edictos para. serviços de administração.

Cais da Caldeirinha e a Casa da Balança  do Arsenal de Marinha [ant. 1939]
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

A caldeira ocidental foi entulhada em 1864; a carreira de construção de oeste foi demolida. pouco antes de 1888. O dique teve origem no reinado de D. Ma.ria 1; foi reconstruido na segunda. metade do século XIX, e entulhado em 1948, assim como a caldeirinha aquando da abertura da Avenida da Ribeira das Naus.

Doca seca (ou de reparação) do Arsenal de Marinha [ant. 1939]
O dique do Arsenal de Marinha tinha 84 metros de comprimento útil, e 12 metros de largura.
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Palácio Valada-Azambuja

Aí temos, Dilecto, ainda no Calhariz, esquina da Rua Marechal Saldanha — antiga da Cruz de Pau — este palácio, há poucos anos reedificado, e onde esteve instalado o jornal A Lucta. É este, seguramente, o monumento urbano que mais atrás recua na história do sítio.


Para quem se interessa pela história destes velhos palácios e para melhor perceber o longo e intrincado historial deste solar dos Almadas e dos Valadas, vale a pena a leitura e a descrição  detalhada feita pelo ilustre olisipógrafo Norberto de Araújo.

Aqui se erguiam no século xv, tempo de D. Afonso V, as casas e quinta de D. Álvaro Vaz de Almada, o famoso Conde de Avranches, morto com o Infante D. Pedro, «o Regente», na triste batalha de Alfarrobeira. Logo aos herdeiros de Avranches foram confiscados os bens deste sítio, e doados a Álvaro Pires de Távora, em Agosto de 1449; foi este fidalgo quem aqui fez levantar um novo palácio sobre velhas casas. Estes Távoras foram ascendentes dos Menezes, Tarocas e Castros, cujas armas campeavam num brasão, que existia sobre o portão principal, enfrentando o Largo actual do Calhariz. Por ocasião do Terramoto, o Palácio, que certamente beneficiara de obras e ampliações no decorrer de três séculos, ruiu estrondosamente e, sob os escombros, morreu o Embaixador de Espanha que nele morava. Mais obras recebeu o arruinado edifício, feitas por um dos Menezes, ascendente de D. Francisco de Menezes da Silveira e Castro, 1.º Conde da Caparica, e, em 1813, feito Marquês de Valada, e que no seu palácio habitava no começo do século passado [XIX]. Antes, em 1791, morava aqui o Marquês de Pombal, Henrique, que era casado com uma Menezes , filha de D. José. É ainda célebre «o coche do Marquês de Valada» , D. José de Menezes, como notáveis foram as recepções na sua casa e a sua vida envolvida em fausto.

Palácio Valada-Azambuja [séc. XIX]
Largo do Calhariz, 15-19; Rua da Bica Duarte Belo, 71-81; Rua Marechal Saldanha, 30-40;
Ascensor da Bica
Alberto Carlos Lima, in A.M.L.

Em 1867, era proprietário de direito deste edifício D. Francisco de Menezes, Conde de Caparica, de menor idade, e administradores e usufrutuários seus pais D. José de Menezes Silveira e Castro e D. Maria Isabel de Bragança, marqueses de Valada.
Em Janeiro desse ano, precedendo autorização do Conselho de família o palácio foi vendido por 23 contos e 500 mil réis ao conselheiro Francisco José da Silva Torre que em 1874 remiu o foro devido ao Hospital de S. José, por 48$523. 
Este Silva Torre: tinha uma enteada, casada com um Conde de Azambuja, e foi esta senhora que, depois, herdou a propriedade. Desta data em diante começou o velho solar dos Almadas e dos Valadas a ser conhecido por «Palácio Azambuja».

Palácio Valada-Azambuja [1968]
Largo do Calhariz, 15-19; Rua da Bica Duarte Belo, 71-81; Rua Marechal Saldanha, 30-40
Armando Serôdio, in A.M.L.

Em 1922, D. José de Melo, da família Azambuja, vendeu o edifício ao comerciante e antiquário Sr. Manuel Henriques de Carvalho. Já no edifício estava instalado o jornal A Lucta, em cujas salas tantos dramas políticos se conceberam. Em 1925, o proprietário mandou encurtar o átrio nobre para abrir estabelecimentos comerciais, colocando nas paredes do vestíbulo belos panos de azulejos — estes que vês — que haviam pertencido a um palácio da vila de Almada, única afinidade de procedência que eles têm com o primitivo solar dos Almada-Avranches do século XV, e adornando um pequeno pátio, à direita, com dois registos de azulejos, um datado de 1760, e que estavam numa dependência do edifício.
Em 1936, fizeram-se novas obras no antigo Palácio Azambuja (cuja frontaria ainda diz alguma coisa) respeitando-se contudo alguns pormenores interiores, e construindo-se uma Sala onde era o Jardim de  Inverno. Desapareceram as salas da Lucta e do Centro Nacionalista, e  instalaram-se o 7.º, 8.° e 9.º Juízos Criminais da Comarca de Lisboa, e uma repartição de Registo Civil. Os inquilinos multiplicaram-se.

Palácio Valada-Azambuja [1936-03-19]
Largo do Calhariz, 15-19; Rua da Bica Duarte Belo, 71-81; Rua Marechal Saldanha, 30-40
Fotógrafo não identificado, in Arquivo do Jornal O Século

A Travessa Rua do Almada que aqui corre paralela à face lateral do velho Palácio, não deriva seu nome — como Júlio de Castilho supôs — do solar de D. Álvaro Vaz de Almada (Conde de Avranches), mas de um Fernão Rodrigues de Almada, homem abastado, que no meado do século de quinhentos aqui morava (Informação generosa do Sr. Luiz Pastor de Macedo; veja-se «Livro de Lançamento e serviço que a cidade de Lisboa fez a El-Rei D. João III, no ano de 1565», fol. 374, 375 e 394).

Do antigo jornal republicano de Brito Camacho, das suas tertúlias políticas e literárias, das suas congeminações conspiratórias (Sidónio Pais aqui urdiu discretamente a sua conjura de 1917) não resta mais do que a memória: «o palácio da Lucta».
Não vale a pena subirmos. Basta que observemos a fachada que olha para a Rua Marechal Saldanha [vd. imagem acima], respeitada pelas obras do século XIV e do presente, oferecendo ainda um semblante muito aproximado da arquitectura civil banalíssima posterior ao Terramoto.==
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. V, pp. 25-26, 1939)

Palácio Valada-Azambuja [1960]
Largo do Calhariz, 15-19; Rua da Bica Duarte Belo, 71-81; Rua Marechal Saldanha, 30-40
 Arnaldo Madureira, in A.M.L.

No seu interior são de destacar: o silhar de azulejos azuis e brancos, setecentistas, figurando cenas galantes, localizado no átrio de entrada; a decoração com estuques levemente relevados da escadaria de mármore; e os dois registos azulejares, figurando S. Francisco e S. Marçal, do pátio interior.

N.B. De espaço residencial converteu-se em espaço comercial, de serviços e cultural, acolhendo inclusivamente a Biblioteca Municipal Camões.

 
 
 Painel de azulejos com a imagem
de São Francisco de Borja


Painel de azulejos com a imagem
de São Marçal
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