Transposta a embocadura da Rua Capitão Leitão, surge-nos o Palácio que foi dos Patriarcas de Lisboa, a famosa «Mitra» do século XVIII, mas que a mais longe recua.
O Palácio da Mitra — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , dito de Marvila, situado na Rua do Açúcar, entre o Beato e Poço do Bispo, monumento municipal, é um dos mais lindos exemplares arrabaldinos de arquitectura solarenga seiscentista, a despeito da sua reedificação, que abrangeu todo o exterior, ser vincadamente ao século XVIII.
O primitivo Palácio da Mitra lisbonense, casa de campo dos prelados, remontava, pelo menos, ao começo do século XVII, e dele não existem vestígios; desfrutava de larga quinta e chãos que sobreviveram à transformação do palácio, restaurado e ampliado pelo penúltimo arcebispo de Lisboa, D. Luís de Sousa (1676-1702). Foi, porém, o 1.º patriarca de Lisboa (1716). D. Tomás de Almeida. da Casa Lavradio e Avintes. quem, dispondo de muitos bens e de protecção como um grande da corte, que era, reedificou totalmente o palácio, com grandeza e bom gosto. construindo mesmo. sobre o rio. um cais para seu serviço privativo. O palácio, incorporado temporariamente nos bens nacionais depois de 1884, ainda serviu de residência patriarcal a D. Frei Patrício da Silva e a D. Frei Francisco de S. Luís, Cardeal Saraiva, que nele morreu em 7 de Maio de 1845.
Em 1864 o Palácio da Mitra foi à praça para com o seu produto se adquirir uma outra residência patriarcal, que veio a ser o Palácio dos Condes de Barbacena no Campo de Santa Clara (era prelado D . Manuel Bento Rodrigues). comprando-o então, por dez contos, o espanhol D. José Saldanha. Marquês de Salamanca, um dos fumadores da Companhia Real dos Caminhos de Ferro, o qual, por sua vez, em 1874, vendeu, por cinquenta e quatro contos, a propriedade palaciana e rústica a Horácio Justus Perry. encarregado de negócios dos Estados Unidos em Madrid (onde se encontrava D. José Saldanha), marido {1862) da poetisa espanhola D. Carolina Coronado, que na casa do campo que fora dos prelados de Lisboa viveu durante anos, mesmo depois de viúva (1891). e onde morreu. Em 1902 a «Mitra» passou de D . Carolina Coronado ao Dr. António Centeno, que já possuía os direitos hipotecários sobre a propriedade do bloco rústico e urbano; alguns poucos anos depois este imóvel foi adquirido por uma sociedade constituída por Francisco de Moura e Sá e Manuel Fuertes Peres; em 1909 a propriedade era apenas de Fuertes Peres que em 1918 se ligou com Ernesto Henriques Seixas, fumando a Fabrica Seixas, de metalúrgica e fundição, encerrada em 1925, e cujos restos de barracões e armazéns ainda se viam há pouco tempo.
Palácio da Mitra, Pátio de Honra |1945| Rua do Açúcar, 56-64 O Pátio de Honra, além do portal, uma pequena escadaria, desdobrada em dois curtos lanços, que nasce à direita do pátio, decorada na frente por um tanque. com bica de carranca de mármore, e ladeada por cortina de grade de ferro forjado, de tipo setecentista, ao gosto francês; no patamar, porta de acesso ao átrio do palácio. emoldurada, sobrepujada por óculo oblongo gradeado. Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente |
Foi só em Abril de 1930 que a Câmara Municipal de Lisboa comprou à firma proprietária da fábrica, Fuertes & Comandita. o palácio, terreno e mais anexos, tudo por 4.000 contos, para aqui instalar um matadouro, projecto do qual depois a Câmara desistiu por haver encontrado nos Olivais e nos terrenos de Beirolas (quintas de S. Bento, da Letrada e do Salto) terrenos mais apropriados. A Câmara, de posse de tão belo edifício. resolveu instalar no palácio uma biblioteca municipal. inaugurada em 16 de Outubro do 1934, sendo os terrenos rústicos, com suas casas, destinados a asilo de mendicidade — o Asilo da Mitra, ou simplesmente «Mitra» no dizer do vulgo — , inaugurado em 4 de Maio de 1933. e que recebeu posteriormente importantes beneficiações.Em 1941 a Câmara resolveu instalar no Palácio um Museu da Cidade, aproveitando o melhor do recheio artístico e arqueológico do Palácio Galveias; foi esse Museu inaugurado em Abril de 1942, mas circunscrito à antiga casa nobre prelatícia e ao pátio de honra.
O tempo áureo do Palácio da Mitra — que, assinala-se, nunca passou de uma casa de campo — decorreu na primeira metade do século XVIII, durante a vida de D. Tomás de Almeida, que contudo não fazia da Mitra residência habitual (morreu, em 1754, no Palácio Niza, em S. Roque). Em ]u1ho de 1766 esteve instalado neste palácio durante três dias, como hóspede do Rei D. osé, o novo Embaixador de França. Marquês de Baschi e de Pignan, servindo de hospedeiro um vedor da Casa Real, tendo vindo do Tesouro de El-Rei os móveis ricos, tapeçarias, baixela e armações das salas.==
N.B. Em 1973 o Museu da Cidade deixa de ocupar o edifício, transferindo-se para o Palácio Pimenta; o andar inferior é cedido durante alguns anos ao grupo Amigos de Lisboa para instalação da sua sede e biblioteca, ficando o andar nobre destinado aos serviços de protocolo da Câmara Municipal.
Actualmente é utilizado para recepções oficiais. Encontra-se classificado como Monumento de Interesse Público.
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Inventário de Lisboa: Monumentos histórico, 1947.
idem, Peregrinações em Lisboa, vol. XV, p. 74-75, 1939.
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ReplyDeleteO projecto tem sido atribuído a Giacomo Antonio Canevari, com a possível participação dos arquitectos Carlos Mardel e Rodrigo Franco.
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