Friday 31 December 2021

Chafariz da Calçada da Glória que foi de S. Pedro d'Alcântara

O chafariz de S. Pedro d'Alcantara era de cantaria, tinha cinco bicas de excellente agua, que começou a correr em 8 de setembro de 1754. O chafariz estava junto do deposito [Mãe de Água], mesmo defronte do convento, hoje collegio de orphâs da Misericordia, intitulado de S. Pedro d’Alcantara, e ultimamente a camara municipal transferiu-o para o começo da calçada da Gloria. [O recreio: 1890]

Chafariz da Calçada da Glória, aguadeiros [entre. 1903-1908]
Calçada da Glória
Charles Chusseau-Flaviens, in George Eastman House
Nota(s): O local não se encontra identificado pelo fotógrafo.
Chafariz da Calçada da Glória [1947]
Calçada da Glória
Fernando Martinez Pozalin AML

José Sérgio Velloso d’Andrade, na sua «Memoria sobre chafarizes, bicas, fontes e poços públicos de Lisboa, Belém, e muitos logares do termo», de 1851, conta que existia no terreiro superior da Alameda de S. Pedro de Alcântara um chafariz N.º 3 com 6 5 bicas, que tinha 5 Companhias de Aguadeiros, 5 capatazes, 165 aguadeiros e dois ligeiros. Referia-se, certamente, ao chafariz que se encontra, actualmente, um tanto ou quanto desfigurado, ao cimo da Calçada da Glória, local da paragem do Elevador da Glória. Terá sido inaugurado a 8 de Setembro de 1754. Em 1873, foi passado para o começo da Rua das Taipas e, por volta de 1880, arrumou-se onde está hoje.

Chafariz de S. Pedro d'Alcântara (ou N.º 3) [1821]
Transferido para a Calçada da Glória por volta de 1880.

Desenho  Luiz Gonzaga Pereira

Quem começou a aformosear e a aterrar o terreno da alameda de S. Pedro de Alcântara, em 18430-40, foi uma companhia da guarda real da policia, que se estabelecera em quartel no Palácio do Marquês de Santa Iria, hoje prédio n.ˢ 83 da Rua de S. Pedro de Alcântara, que ficava mesmo defronte da alameda. A calçada da Glória e a Rua das Taipas eram sítios de pouca passagem, e formavam uma ribanceira.

Localização do Chafariz de S. Pedro d'Alcântara [1856]
Legenda:
Vermelho
Chafariz de S. Pedro de Alcântara 
AzulMãe de Água
Verde: 
Localização actual na  Calçada da Glória
Levantamento [fragmento] topográfico de Filipe Folque, in AML


Bibliografia
RODRIGUES, Guilherme, O recreio: publicação semanal litteraria e charadistica, 1890.
VELOSO DE ANDRADE, José Sérgio , Memória sobre Chafarizes, Bicas, Fontes e Poços Públicos de Lisboa, Belém e muitos lugares do Termo., 1851.

Sunday 26 December 2021

Casa Campião

Em 18 de Novembro de 1783, a Rainha D. Maria I outorgou à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (S.C.M.L.) uma Lotaria, criando assim a «Lotaria Nacional Portuguesa». Em Março de 1840, Pedro José Pereira Campião, comerciante em Lisboa, natural de Tomar, fundou a casa de câmbios «Campião» que comercializava os bilhetes da Lotaria Nacional.

Casa Campião  [c. 1910]
Rua do Amparo, 116-118 [actual n.º 2C]
Joshua Benoliel, in AML

Em 1902, Pedro Campião passou o negócio ao seu empregado, José Dias, que em parceria com seu irmão, Vicente Carlos Dias, criou a firma José Dias & Dias, Sucessores de Campião & Companhia.
Com a escassez do movimento de câmbios e a especialização da firma na diversidade que o negócio dos jogos dava, em 14 de Maio de 1975, foi requerido o cancelamento do Alvará para o exercício da actividade cambial.
Embora sem o exercício do comércio de câmbios, a firma, nos dias correntes, mantém a exploração de loterias e outros jogos de fortuna. [bportugal.pt]

Casa Campião  [c. 1910]
Rua do Amparo, 116-118 [actual n.º 2C]
Alberto Carlos Lima, in AML

Depois da 2ª Guerra Mundial, o «Campião», abriu filiais por todo o País e aumentou a sua rede de revendedores que hoje atinge perto de 2.000, sendo hoje a casa de lotarias mais antiga do mundo, com mais de 180 anos de existência, tornando-se digna de menção no «Guiness Book of World Records». [campiao.pt]

Casa Campião  [1968]
Rua do Amparo, 2C
Garcia Nunes, in AML

Friday 24 December 2021

Largo das Fontainhas, a Alcântara

Esta artéria sita na confluência das Ruas das Fontainhas, Rua Fradesso da Silveira, Rua da Cozinha Económica, Rua Teixeira Júnior, Rua Rodrigues Faria e Largo do Calvário foi fixada na memória da cidade em data que se desconhece embora seja certo que já vem referida no Atlas da Carta Topográfica de Lisboa de Filipe Folque de 1857. Sabe-se também que em 1890 foram expropriados barracões para facilitar o trânsito público no Largo das Fontainhas e na Rua Fradesso da Silveira.
Como Fontainha é a denominação para uma fonte pequena, supõe-se que o topónimo advenha da presença fontes no local. [ cm-lisboa.pt]

Largo das Fontainhas |1966|
Largo Calvário e Rua José Dias Coelho
João Goulart, in AML

Sunday 19 December 2021

Liceu D. Filipa de Lencastre

No coração deste Bairro do Arco do Cego se construiu o novo Liceu D. Felipa de Lencastre. Vale uma visita.
O Liceu D. Felipa de Lencastre foi criado em 1928 — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , e funcionou primeiramente no Palacete Corte Real (onde fora a Nunciatura) na Rua do Quelhas, 36, passando em 1936 para a Rua de S. Bernardo, 16, de onde para aqui foi transferido.
As primeiras aulas no edifício novo que temos à vista efectuaram-se em 14 de Novembro de 1938.

Liceu D. Filipa de Lencastre [1958]
Avenida Magalhães Lima, Arco do Cego
No ano lectivo 1940/1941 funcionou com 712 alunas.
Salvador de Almeida Fernandes, in AML

O Liceu feminino de D. Felipa de Lencastre é, nas suas instalações, talvez o melhor do país, pois obedece já à arquitectura pedagógica, e satisfaz condições que em 1906, quando se levantaram os liceus modernos, por João Franco, não eram ainda exigidas. Foi arquitecto do edifício Jorge Segurado.
O Liceu, com dois pavimentos, é constituído, como vês, por um vasto quadrilátero, e compõe-se, pois, de quatro alas, servidas por um pátio ou claustro, em parte coberto. A Sul prolonga-se um corpo distinto, rectangular, no qual foram, instalados o ginásio e o balneário.

Liceu D. Filipa de Lencastre [1962-07]
Avenida Magalhães Lima, Arco do Cego
Artur Goulart,  in AML

A fachada do Liceu oferece-se original e elegante, em rotunda e as fachadas laterais, largamente envidraçadas, dão um conjunto lavado desafogado, sem aspecto de casarão maciço. O átrio, todo de mármore, é muito belo.
Possui o Liceu 28 salas de aulas, duas das quais em anfiteatro, galerias, terraços, museu, laboratórios, biblioteca, refeitório, salas de conselho, de professores, e de secretarias.
   
Fotografia aérea do Bairro Social do Arco do Cego, Praça de Londres e Avenida de Roma [1953]
Na esq. baixa observa-se o Liceu D. Filipa de Lencastre.
Mário de Oliveira, in AML

N.B. O Liceu D. Filipa de Lencastre, foi baptizado em sua honra. Esposa de D. João I e rainha de Portugal entre 1387 e 1415, nasceu em Inglaterra em 1360, filha de João de Gante, 1.º Duque de Lencastre.
Nada se sabe da sua vida até à altura do casamento com D. João I, que se efectuou no Porto, em 2 de Fevereiro de 1387, e que é considerado ilegítimo até 1391, altura em que uma bula papal autoriza o casamento do Mestre de Avis, que era eclesiástico. Dessa união nasceram oito filhos — a "Ínclita Geração", como lhe chamou Camões — , de entre os quais se destacam D. Duarte, futuro rei, o infante D. Pedro, o das "Sete Partidas", o infante D. Henrique, "o Navegador", e D. Fernando, o "Infante Santo". Ignora-se qual o papel que teve na educação dos filhos.
D. Filipa de Lencastre (Philippa of Lancaster) faleceu de peste bubónica em 18 de Julho de 1415, no Convento de Odivelas, na véspera da partida da expedição a Ceuta, estando sepultada no Mosteiro da Batalha. [infopedia]
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, pp, 74-75, 1939.

Friday 17 December 2021

Avenida da Liberdade, 49-57: Fábrica de Louça de Sacavém

A Real Fábrica de Louça de Sacavém (1850-1983) foi fundada por Manuel Joaquim Afonso em 1850 na Quinta do Aranha a cerca de 5 km dos limites da cidade. Comprada em 1861 pelos irmãos Guillaume e John Howorth e depois da morte deste em 1893, a sua viúva tornou-se proprietária e estabeleceu uma sociedade com o antigo guarda-livros James Gilman que ficou como proprietário em 1909 depois da morte da associada.
Com uma produção que era sempre marcada, a fábrica além de obter a simpatia popular foi também premiada em diferentes exposições como as de 1878 e 1889 em Paris.
[José Queiroz; Ceramica Portugueza, 1907]

Avenida da Liberdade, 49-57 [194-]
Fábrica de Louça de Sacavém, loja e salão de exposições; actual Edifício Liberdade 49
Kurt Pinto, in AML

Sunday 12 December 2021

Palácio Lançada e jornal O Século

Conseguimos, enfim, chegar à Rua do Século, a antiga bairrista Rua Formosa, designação já do século XVIII, mas só legalizada pelo edital de 1 de Setembro de 1859.

Encontramos nela, à direita, — diz Norberto de Araújo a Ermida das Mercês [entretanto demolida], e logo o edifício do jornal O Século. A área ocupada por este importante órgão da imprensa é, como daqui podes ver, relativamente extensa.

O «casco» da propriedade é o do palácio que em 1755 pertencia a Manuel de Sampaio de Pina e Brederode, avô do Visconde da Lançada, antepassado dos Duques de Palmela, também um dos donos do solar primitivo.
O Palácio possuía uma capela, da invocação de N. S. do Monte do Carmo, cujos vestígios nítidos durante anos se viam numa das oficinas do jornal, e hoje ainda se descortinam, mas muito reduzidos.
Palácio Lançada e jornal O Século [190-]
Rua de O Século, n.º 41-63; à esq. a Rua João Pereira da Rosa
Fachada principal setecentista.
 Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Os salões do Palácio Lançada tiveram renome intelectual, durante um largo período do século passado; no palácio habitou D. Maria Krus, esposa de D. Pedro de Menezes de Brito do Rio.
Dezenas de figuras ilustres do século passado desfilaram pelos salões de D. Maria Krus, políticos, parlamentares, historiadores, poetas, diplomatas, desde Garrett e José Estevão a Feliciano de Castilho e Bulhão Pato, e daria uma crónica bem alfacinha esse quadro brilhante de espíritos reunidos, nada afectado, nada académico na pretensão.
Esse salão literário precedeu o de D. Maria Amália Vaz de Carvalho, a Santa Catarina, aqui bem perto e que foi igualmente um cenáculo de espírito e de distinção do final de novecentos. 
O Século assenta neste prédio — hoje irreconhecível do seu passado de há cinquenta anos — desde 1881, ano da fundação por Magalhães Lima, primeiro director, ardente paladino republicano que com vários propagandistas e escritores — entre eles Latino Coelho, já na época um alto e nobre espírito — lançaram o jornal no favor do público.
Mais tarde O Século passou à propriedade de José Joaquim da Silva Graça, que começou a figurar como director em 12 de Dezembro de 1896. Havia quatro anos, desde 14 de Novembro de 1892, que o edifício fora comprado aos herdeiros do Visconde da Lançada. Foi ainda no tempo de Silva Graça, proprietário e director, que a Empresa adquiriu (7 de Maio de 1921) o imóvel, desanexado do corpo lateral do Palácio Pombal, para acrescentamento do seu edifício, e instalações desenvolvidas de escritórios e oficinas.

Palácio Lançada e jornal O Século [ 1929-03-17]
Rua de O Século, n.º 41-63
Ao fundo observa-se o edifício novo (1922-1923), situado na ponta S. do antigo
Palácio do Pombal (ou dos Carvalhos).

 Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Integrado no edifício, existiu o Bairro [Operário] do Século, criado por Silva Graça no começo do actual século [em 1905] para moradia do pessoal, mas pouco a pouco absorvido por oficinas e anexos, consequência lógica do progresso material deste órgão da imprensa. Imediatamente a este corpo, e apenas separado por um estreito pátio, levanta-se o edifício novo (1922-1923), desintegrado. como disse, do Palácio dos Carvalhos (Pombal).

O Século ostenta instalações amplas de jornal industrial moderno, e possui, na sua parte antiga, salas, escadarias e dependências caracterizadas ainda por certa nobreza de linhas, ao tipo setecentista, e entre elas uma Sala de visitas, de tecto apainelado, com silhares recortados com muito bons azulejos do século XVIII, de motivos ingénuos palacianos. Na escadaria principal encontram-se panos de azulejos que querem reproduzir o aspecto do prédio no século passado [XIX].==

Palácio Lançada e jornal O Século [1933-06-29]
Rua de O Século, n.º 41-63
Na fachada do edifício novo (1922-1923) ressalta a ampla utilização do ferro forjado
e do vidro, em janelões com guardas de ferro policromado (em vermelhão) típicas
da arquitectura da época e que vazam por inteiro os dois andares intermédios.
 Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

N.B. Para além do valor patrimonial, como interessante exemplar da arquitectura do ferro e do eclectismo, parte da relevância deste imóvel prende-se com a própria história da imprensa em Portugal, razão pela qual as antigas instalações do jornal “O Século” estão classificadas como imóvel de interesse público. O Palácio Lançada alberga, actualmente, o Ministério do Ambiente e da Transição Energética paredes meias com o Palácio dos Carvalhos. 
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. V, pp. 51-53, 1939.
workflow.sgambiente.gov.pt

Friday 10 December 2021

Rua Artilharia Um, 105

Em 1949 o Prémio Valmor foi atribuído a um edifício de habitação com o piso térreo ocupado por estabelecimento comercial, situado na Rua Artilharia Um, 105, um projecto do arq.º João Simões para a Companhia de Seguros Sagres.
Modelo de referências da arquitectura do Estado Novo, cruzando modelos do século XVIII com a arquitectara tradicional portuguesa. Mantém a função original.

Rua de Artilharia Um, 105 [c. 1951]
Prémio Valmor de 1949
Firmino Marques da Costa, in AML

Este arruamento, anteriormente designado por Rua José da Silva Carvalho, antes Rua de Entremuros (por deliberação camarária de 08/04/1897), com início na Rua São Filipe Néri e fim na Rua Marquês de Fronteira, abrange as Freguesias de São Mamede, São Sebastião da Pedreira e Campolide. 

Sunday 5 December 2021

Palácio Pombal, à Rua de O Século

O antigo Palácio Pombal, na Rua do «Século», 65 a 93 [vd. nota], mantém ainda uma configuração uniforme exterior, mesmo depois de alienada e reedificada (1921) a ala Sul, que constitui o edifício moderno do jornal «O Século», cujo título deu, em 1911, nova denominação à antiga Rua Formosa.


O Palácio Pombal, da Rua de «O Século» — e melhor será dizer o Palácio dos Carvalhos, da Rua Formosa  — é uma construção que já existia no segundo quartel do século XVII, recebendo ampliação e reedificação no meado do século XVIII.
Era este o solar de Sebastião de Carvalho e Melo, 3.º senhor do morgado de Sernancelhe, capitão dos familiares do Santo Oficio. falecido em 1719, e de cujo casamento com D. Maria Leonor de Ataíde nasceu Manuel de Carvalho e Ataíde, humanista e académico, casado com D. Teresa Luísa de Mendonça e Melo, pai de Sebastião José de Carvalho e Melo. neste palácio seiscentista nascido a 18 de Maio de 1699, e de cujo baptismo foi padrinho seu avô, senhor da casa.

Palácio Pombal (ou dos Carvalhos) [194-]
Rua de O Século, 65-93 (antiga Rua Formosa); Rua da Academia das Ciências, 1-5
Os Portais Nobres (talvez segundo risco de Carlos Mardel), idênticos, ladeados por candeeiros de gás, de braço, oitocentistas, com escudetes de ferro fundido com o brasão dos Carvalhos e Albuquerques, os quais  portais com ombreiras e portais de cantaria, dão  passagem, além  de  um  passadiço, com abertura de arco de volta abatida, para  o Pátio e para os antigos jardins.
Horácio Novais, in Lisboa de Antigamente

No período áureo do seu poderio, o descendente dos Carvalhos, da Rua Formosa, já Conde de Oeiras, beneficiou e transformou, por acrescentamento, o solar dos seus maiores, no qual viveu antes e depois de entrar na carreira politica, e cuja parte rústica se prolongava para Poente e Norte, constituindo o que se chamava «as Hortas», também com prédios de habitação. Um arco aberto, ainda existente na antiga Rua do Arco [do Marquês, actual da Academia das Ciências], comunicava com dependências do palácio do outro lado da rua e um outro arco-aqueduto servia as antigas hortas. Quase toda a área deste troço da então Rua Formosa, a Poente e a Nascente, era da casa Pombal, da qual o palácio formava a cabeça, como núcleo primitivo.
As reedificações e restauros ordenados pelo Marquês de Pombal podem datar-se além dos meados do século XVIII, cerca de 1770; o Marquês de Pombal aproveitou o merecimento do escultor e estucador italiano João Grossi, que já em 1748 exercia a sua actividade em Lisboa, e foi este artista quem deu a característica decorativa do interior das solar do palácio renovado, embora em quase todas elas subsistisse, como ainda hoje, a decoração cerâmica das paredes, em parte seiscentista. [...]

Palácio Pombal (ou dos Carvalhos) [1918-09]
Rua de O Século, 65-93 (antiga Rua Formosa); Rua da Academia das Ciências, 1-5
Perspectiva tomada do Palácio dos Viscondes de Lançada (antigas instalações do Jornal "O Século").
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

As cinco janelas do andar nobre do corpo onde se rasgam os portais, e as duas contiguas pelo Sul, correspondem a um terraço, sobre o qual no começo do actual século [XX] foram construídos uns anexos de moradia, cujo telhado é inferior ao do frontispício do edifício, e não se vê da rua.
O Palácio Pombal, onde no tempo dos Carvalhos se realizaram sessões da Academia dos Ilustrados (1716), e depois tantas cenas políticas e palacianas se desenrolaram, está hoje de aluguer; na parte nobre instalou-se em 1927 a Casa da Madeira, que sucedeu, como inquilina, a uma Casa de Espanha como esta sucedera à Legação da Alemanha, e à Confederação Geral do Trabalho (1913). O pátio e troços de jardim estão ocupados por barracões de oficinas de Alfredo Alves & Filhos, firma proprietária também do edifício e terrenos «das Hortas». na Rua da Academia das Ciências.
Nenhum outro prédio da vasta zona que pertenceu à Casa Pombal está hoje na posse de qualquer membro da família.

Palácio Pombal (ou dos Carvalhos) [1912-01]
Rua de O Século, 65-93 (antiga Rua Formosa); Rua da Academia das Ciências, 1-5
Esta frontaria adorna-se de duas ordens de janelas: vinte no andar nobre, de sacada com varões seiscentistas, e dezanove de peitoril no andar superior (o lugar onde devia existir uma janela é ocupado pela pedra  de  armas).
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

N.B. Em  paralelo,  talvez  segundo  risco  de Carlos Mardel,  desenvolveu uma cenográfica operação urbanística fronteira ao palácio, com o fim de engrandecer a envolvente. Um jogo barroco de linhas curvas e rectas permitiu o alargamento de parte da estreita Rua Formosa com a criação de duas meias-laranjas, tendencialmente simétricas. Numa, frente  à entrada nobre do palácio, foi erguido o delicado chafariz, enquanto na outra se rasgavam elaborados portais de acesso  a cavalariças (?).

Palácio Pombal (ou dos Carvalhos) [1930]
Rua de O Século, 65-93 (antiga Rua Formosa); Rua da Academia das Ciências, 1-5
Meia-laranja e portais de acesso  a cavalariças (?).
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Nota(s): O edifício n.º 89-103 da Rua de O Século, tornejando para a Rua da Academia das Ciências, 1-5, actualmente uma propriedade separada, fazia parte do conjunto designado Palácio Pombal.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Inventário de Lisboa: Paços e  palácios nacionais, 1949.

Friday 3 December 2021

As Torres da Igreja de Santa Maria de Belém

O Monumento dos Jerónimos, opulenta jóia  quinhentista de arquitectura e de estatutária representa na realização global uma projecção das glórias marítimas portuguesas. É certo que não foi concebido e projectado para celebrar essas glórias. pois a bula de Alexandre VI (1496) que aprovou a construção do mosteiro é anterior à largada das naus de Vasco da Gama para a India (1497), e a doação, por escambo com os freires de Cristo, da pequena ermida quatrocentista, fundada pelo Infante D. Henrique, de N. Senhora do Restelo, aos frades de S. Jerónimo, precedeu no ano de 1499 (Janeiro) a boa nova trazida pela «Berrio» (Julho) da chegada da frota a Calicut.
No fim do século o monumento não estava, porém, ainda lançado, o que só sucedeu  em 1502, ano da primeira pedra.

Igreja de Santa Maria de Belém, fachada Sul |ant. 1878|
Mosteiro dos Jerónimos
Torre, erguida no ângulo sudoeste, rematado o seu corpo central sineiro por um elegante coruchéu piramidal (da primitiva traça).
Fotógrafo não identificado in Lisboa de Antigamente

Mosteiro dos Jerónimos está localizado na margem direita do rio Tejo e é composto por dois grandes espaços: a Igreja e Claustros e os dormitórios (actualmente Museu da Marinha e Museu Etnográfico de Arqueologia).
Este conjunto monumental estende-se numa área aproximada de 300X50 m2 com uma altura média de cerca de 20 m (50 m nas torres). A sua construção iniciou-se nos primórdios do século XVI tendo-se prolongado durante aproximadamente um século. Não se conhecem os documentos originais do seu projecto. Foi construído em calcário de Lioz com materiais provenientes, segundo documentos históricos, dos arredores de Lisboa e da pedreira de Belém adjacente ao monumento.

Igreja de Santa Maria de Belém, fachada Sul |c. 1881|
Mosteiro dos Jerónimos
A Torre, erguida no ângulo sudoeste, rematado o seu corpo central sineiro por uma cúpula em rotunda octogonal interiormente (que substituiu no século passado e elegante coruchéu piramidal da primitiva traça), aberta de cinco ventanas emolduradas, adornada de oito pináculos e coroada por esfera armilar.
Fotógrafo não identificado in Lisboa de Antigamente

A Igreja é constituída por uma nave principal, um transepto com duas capelas laterais, uma capela-mor e uma torre sineira, no canto da fachada Sul com a fachada poente. A volumetria da Igreja apresenta dimensões consideráveis, com 70 m de comprimento, 23 m de largura na nave (40 m no transepto) e uma altura média de 24 m.
Entre 1867 e 1878 os cenógrafos do Teatro de S. Carlos, Rambois e Cinatti, vão reformular profundamente o anexo e a fachada da igreja, dando ao monumento o aspecto que conhecemos hoje. Vão, assim, demolir a galilé e a Sala dos Reis, construir os torreões em cada extremo Nascente e Poente do dormitório (em construção na 1ª foto), a rosácea do coro-alto e substituir a cobertura piramidal da torre sineira (vd. 1ª imagem) por uma cobertura mitrada (vd. 2ª imagem).
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Inventário de Lisboa, 1944.
ROQUE, J. A,.bibliotecadigital.ipb.pt/, 2007

Sunday 28 November 2021

Travessa de S. João da Praça, antigo Beco das Moscas, ou da Mosca

O nosso caminho vai ser a Travessa de S. João da Praça — o antigo e bairrista Beco da[s] Mosca[s] — e pela pitoresca serventia penetraremos em Alfama. Por agora espreitemo-la apenas-que curioso é esta perspectiva!


Ora aí tens — diz Norberto de Araújo — uma das mais pitorescas e originais betesgas de S. João da Praça: este enfiamento, sob os passadiços que ligam os dois corpos do velho Palácio dos Vila Flor, Duques da Terceira, e que foi até há poucos anos da Viscondessa da Abrigada, como te disse atrás. 
Tem qualquer cousa ainda de medieval, dando teatro, embora se venha desfigurando com arranjos e enxertos desde há uns anos a esta parte. 

Travessa de S. João da Praça. arco de entrada em pedra |1929|
Antigo Beco das Moscas, ou da Mosca
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

O tecto dos passadiços, sobre arcos de alvenaria, é de madeira, e por isso te digo que «dá teatro»; a nobreza da pedra não distingue esta serventia. Visto do lado de cima, o enfiamento ganha perspectiva, e à noite dá-nos ainda uma ilusão da Alfama quinhentista.
Aí tens o arco de entrada em pedra, com meias pilastras, e uma indicação do que deveria ter sido, expressão nobre bairrista ainda há um século.==

Travessa de S. João da Praça. arcos e  passadiços |c. 1900|
Antigo Beco das Moscas, ou da Mosca
José Artur Bárcia, in Lisboa de Antigamente

N. B. O Edital do Governo Civil de Lisboa de 17 de Outubro de 1863, crismou o Beco das Moscas, ou da Mosca, em Travessa de São João da Praça, a pedido de «alguns proprietarios de predios, e outros individuos, residentes» nesses arruamentos, alterando os topónimos comuns por referências religiosas dos locais onde se inseriam. O Beco das Moscas já aparece em 1858 no levantamento cartográfico de Lisboa executado por Filipe Folque e de acordo com aquele edital «dá serventia do Caes de Santarem para o largo da egreja parochial de S. João da Praça». [cm-lisboa.pt]
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. X, pp. 27-37, 1939.

Friday 26 November 2021

Rua Morais Soares

Este arruamento nasceu em 1906 como Rua do Conselheiro Morais Soares, no troço da antiga Estrada de Circunvalação compreendido entre a rotunda (hoje, Praça do Chile) no término da Avenida da Dona Amélia (hoje Avenida Almirante Reis) e a Parada do Cemitério Oriental (hoje Parada do Alto de São João), e foi já após a implantação da República, pelo Edital Municipal de 27/11/1916, que passou a Rua Morais Soares, já que o título de "conselheiro" recordava o regime monárquico, por ser atribuído pelo soberano, tradicionalmente aos magistrados do Supremo Tribunal e por vezes, a pessoas que tinham prestado serviços honrosos.

Rua Morais Soares |195-|
Antiga Estrada de Circunvalação
Judah Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Rodrigo de Morais Soares (1811–1881), bacharel em Medicina pela Universidade de Coimbra, distinguiu-se como alto funcionário da Administração Pública e especialista em assuntos aduaneiros, agrícolas e financeiros. Quando em 1852 se criou a Secretaria das Obras Públicas foi nomeado chefe da repartição de Agricultura e mais tarde Director geral, tendo fundado a Quinta Regional de Sintra e o Instituto Agrícola. Em 1858 fundou o Arquivo Rural, importantíssimo jornal de agricultura e artes e ciências correlativas. A Escola de Regentes Agrícolas de Santarém teve o seu nome, passando em 1910 a Escola Prática de Agricultura. Ainda escreveu diversos opúsculos sobre temas agrícolas e financeiros.[cm-lisboa.pt]

Rua Morais Soares |1955|
Antiga Estrada de Circunvalação
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

Sunday 21 November 2021

Torre de Belém

Neste monumento, de maior beleza que imponência, há a considerar o Baluarte, avançado desde os extremos da frente Sul da Torre, com seis faces, e com cerca de 41 me­tros de comprimento, e a Torre, propriamente dita, vertical, com quatro faces regulares, e com cerca de 36 metros de altura.


A Torre de Belém, o mais belo monumento fortificado de todo o pais, ainda que reduzido hoje a um padrão de beleza, evocativo das glórias marítimo-militares, com reflexos dos descobrimentos e projecção da opulência quinhentista, data de 1515-1519-1521, anos respectivamente do começo da obra, da sua conclusão, e da investidura do seu primeiro alcaide-mor, Gaspar de Paiva. 
Realização do reinado de D. Manuel não resta dúvida de que foi concepção de D. João lI, destinada a defender a entrada do rio. O «Baluarte do Restelo», também chamado «Castelo de S. Vi­cente a-par de Belém». ou. simplesmente, «Torre de S. Vicente», foi executada por Francisco de Arruda, designado em 1516 o «mestre do baluarte do Restelo», lavrante de pedraria, pertencente a uma família de artistas que trabalharam em Tomar, na Batalha, nos Jerónimos, e na construção de fortalezas em Çafim e Azamor.

Torre de Belém  [c. 1866]
Antiga Praia do Restelo hoje Avenida de Brasília
Em  cada um dos vértices da face Norte uma guarita, com sua cúpula, igual às da muralha do baluarte; sobre estas dois nichos com baldaquinos, num dos quais se  vê a imagem escultórica de S. Miguel e noutro a de S. Vicente, padroeiro da Torre e da cidade de Lisboa; uma janela de perfil românico, à altura do primeiro andar; um lindo balcão, saliente da parede, apoiado em cachorros, com dois arcos assentes sobre três colunelos, com balaustrada e cúpula, no mesmo perfil do grande varandim da face principal; uma janela geminada sobre aquele  balcão.
Autor desconhecido, iin Lisboa de Antigamente

Parece incontroverso que a primeira traça ou desenho da fortaleza não foi de Francisco de Arruda, mas do cronista, também debuxador [o mesmo que desenhador], Garcia de Rezende, ainda no reinado de D. João II, e/ou, de Boytac, o insigne «mestre» dos Jerónimos, já no reinado de D. Manuel. Francisco de Arruda foi, porém, o grande arquitecto realizador desta obra, cujos planos, se os havia, ele interpretou, ou transformou na «mais graciosa, a mais elegante, e a mais encantadora das jóias cinzeladas sob a ins­piração das fantasias mouriscas» (Oliveira Merson: 1861).
A antiga fortaleza desenvolve-se, com inspiração nacional autónoma, nascida dos elementos construtivos gótico-romanos, a qual através das sugestões da Índia e da África mourisca, deram o manuelino, exuberante, neste monumento, de originalidade, de simbolismo e de fantasias, singularmente reguladas pelo poder contemporizador de Francisco de Arruda. Esteve o «Baluarte do Restelo» rodeado de água por todos os lados, até que o deslocamento do curso do Tejo o foi envolvendo de areias, prendendo-se à torre como uma nau de quinhentos encalhada, com a proa mergulhada no rio, A Torre de Belém tem expressão nacional, na evocação dos descobrimentos e dos feitos marítimos que se lhes seguiram, mas constitui também, nas suas particularidades históricas, um documento olisiponense, de formoso semblante e impecável beleza.

Torre de Belém e Forte do Bom Sucesso  [c. 1900]
Antiga Praia do Restelo hoje Avenida de Brasília
Em 1780 inicia-se a construção do forte, com projecto do engenheiro e general francês Vallerée (segundo o sistema do marquês de Montalembert); o mesmo ficava ligado à Torre de Belém por meio de um passadiço. Durante a ocupação francesa, em 1808, o general Junot determina que a bateria seja ligada à Torre de Belém por uma bateria corrida, chamada Bateria Nova do Bom Sucesso ou do Flanco Esquerdo.
Autor não desconhecido, in Lisboa de Antigamente

A iconografia do monumento é vastíssima. A sua crónica é dilatada, viva de glórias mas tam­bém testemunho de tristes factos políticos: baluarte recamado da simbólica e da mística portuguesa do mar; prisão do Estado, do século XVII ao XIX. Conta algumas vicissitudes; no tempo de Filipe II a Torre de Belém esteve pronta ser arrasada, a conselho de um arquitecto napolitano, Vicencio Cazale, que no lugar daquela jóia pretendia construir uma «grande fortaleza». Em 1780-82 foi a Torre de Belém ligada por um suporte de bataria, ao forte do Bom Sucesso, e quando, mais tarde, este forte passou a ficar isolado, a Torre sofreu em parte desmantelamento. No período das invasões francesas de 1807 a 1810, foram reduzidas as ameias e guaritas do baluarte a meia altura, e retirados os arcos do varandim e outros elementos decorativos. Em 1845, por efeito dos protestos de Almeida Garrett, e a esforços do Duque da Terceira, governador da Torre, foi o monumento reintegrado pelo engenheiro militar António de Azevedo e Cunha. Em 1865 foi nela colocado o farolim que só há poucos anos dali foi retirado, e em 1867 deu-se-lhe a vizinhança das instalações abarracadas e negras da fábrica do gás, e a sentinela obesa do gasómetro.

Torre de Belém e Fábrica de Gás de Belém e gasómetros (dir.)  [c. 1900]
Antiga Praia do Restelo hoje Avenida de Brasília
A  muralha envolvente,  hexagonal, com cerca de um quarto da altura da Torre, e 
nela: A guarda ameiada em escudos de Ordem de  Cristo; Seis guaritas (das oito que envolvem, decorativamente todo o monumento) no vértice das faces do polígono, com janela de vigia, apoio cónico, e cúpula golpeada de gomos, no estilo  bizantino; Dezassete frestas rectangulares, ou canhoneiros, abertas na  muralha um pouco acima do nível de água.
Autor desconhecido, in Lisboa de Antigamente

O monumento, constituído pela torre propriamente dita, quadrangular, e por um baluarte hex­agonal, que defende a torre por envolvimento e avança sobre o rio, forma uma peça de conjunto, na qual os elementos interdependem sem dispersão; desta sorte não comporta a anotação de espécie móveis ou soltas. Objecto de vários estudos, monografias criticas e descrições, a Torre de Belém está desde há muito inventariado em pormenor; pela sua unidade não admite neste trabalho mais que uma síntese de inventário.

Torre de Belém  [c. 1869]
Antiga Praia do Restelo hoje Avenida de Brasília
No  Baluarte há que  anotar o portal principal de acesso ao monumento, contíguo  pelo nascente ao envasamento da Torre, servido (actualmente) por ponte levadiça, ornado ao  gosto da Renascença, com arco lavrado de volta redonda, sobrepujado de escudo régio e de esferas armilares.
Jean Laurent Minier, iin Lisboa de Antigamente

N.B.  1982 — A Torre de Belém é classificada Monumento Nacional e Património Mundial (UNESCO)  2007 — Nomeada como uma das Sete Maravilhas de Portugal.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Inventário de Lisboa, 1944.

Friday 19 November 2021

Rua de S. Bento

O nome do sítio de São Bento data do séc. XVI em que o topónimo do local era feito por referência ao Convento de frades beneditinos que vieram de Tibães.
Segundo o olisipógrafo Norberto Araújo, em Peregrinações em Lisboa, da Rua dos Poços dos Negros até ao Largo passado o Arco de S. Bento, o topónimo Rua de S. Bento seria antigo. Dali para cima até ao Rato, considerava ser do séc. XVIII já que eram os Olivais de S. Bento e antes Rua Nova de Colónia
Segundo outro olisipógrafo, Luís Pastor de Macedo, em Lisboa de Lés-a-Lés, o troço superior da Rua de S. Bento poderia anteriormente ter sido designado como Rua de S. Bento às Trinas, por referência às Trinas do Rato.
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XI, p. 33, 1938-39)

Rua de S. Bento [1911]
O Arco de S. Bento, de autor desconhecido (séc. XVIII/XIX), esteve neste local até ao final dos anos trinta do séc. XX (1938), altura em que, a remodelação do antigo Palácio das Cortes, actual Assembleia da República, implicou que as suas pedras fossem desmontadas e numeradas, tendo sido reconstruído na Praça de Espanha.
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Aquele terreno que existia murado em frente do velhinho Mosteiro de S. Bento da Saúde — depois sede do Parlamento — formava declive para a Rua de S. Bento, pois o edifício ficava no alto, imponentemente, tendo aos pés as ruelas e hortos. Terraplanou-se, construiu-se um muro de defesa e ficou um largo, onde as carruagens dos parlamentares esperavam a sua saída. Cavalos de seges e depois os das tipóias comiam as suas rações sob as árvores , os segeiros e cocheiros pugnavam entre si , enquanto lá dentro tronitroavam os representantes do povo.

Rua de S. Bento, Arco e Palácio de São Bento [1901-1908]
O arco, a escadaria e o paredão foram demolidos por ocasião das obras de terraplanagem e de remodelação do Palácio de São Bento em 1938-1939, dando lugar à configuração actual.
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Sunday 14 November 2021

Lojas de antanho: Papelaria Palhares

O jornal diário A Capital:Diário Republicano da Noite, na sua edição de 29 de Junho de 1916, dedicava um longo artigo às mais antigas e tradicionais lojas da Baixa, mais precisamente aquelas situadas na Rua Áurea, vulgo do Ouro. Sobre a história do estabelecimento denominado Papelaria Palhares — e respeitando a grafia da época — o texto rezava assim:

A Papelaria Palhares [fund. 1889?] é das mais antigas casas da especialidade existentes em Lisboa. A sua reputação vem de longa data e pol-a em relevo é prestar justiça a um dos melhores estabelecimentos da Rua do Ouro, onde tem os n.ºs 141 e 143.
A Papelaria Palhares reformou há pouco ainda todas as suas installações modernisando-se por completo. O «Almanach Palhares» deu a esta casa bastante voga, e entre os artigos que ahli se encontram figuram os seus papéis de phantasia, magnificos «bibelots», artigos de pintura, etc. Entre os artigos mandados fabricar exclusivamente pelo sr. Antonio Palhares figura o papel para cartas denominado — Rainha D. Amélia — que é um verdadeiro primor.
 
Papelaria Palhares |c. 1910|
Rua Áurea, 141-143
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

N.B. O Almanach Palhares «do commercio, industria, agricultura, sciencias, artes e literatura. Muito noticioso e de utilidades praticas. Illustrado com mais de oitocentas gravuras», foi fundado em 1889 pelo chefe da policia civil A. Morgado e pelo industrial Palhares, estabelecido com papelaria e tipografia Rua do Ouro, 139.

Papelaria Palhares |1901|
Rua Áurea, 141-143

Bibliografia
A Capital: diário republicano da noite, Guimarães, Manuel, 1868-1938, ed. com., N.º 2106, 26 Jun. 1916.
SILVA, Inocêncio Francisco da Silva, Dicionário bibliográfico português, 1858-1923.

Friday 12 November 2021

Rua Fresca

Topónimo que se fixou na memória de Lisboa em data que com exactidão não se pode precisar. A sua origem parece derivar das condições climatéricas próprias da artéria.
No entanto, Luís Pastor de Macedo ("Lisboa de Lés a Lés") refere este assunto: «A rua Frêsca, citada na demarcação de 1632, não devia corresponder à actual. A própria orientação que se lhe marca — de perlongo para o norte até à quinta de Francisco Soares — dá a entender isso mesmo. Quanto a mim tal designação correspondia à moderna rua de Caetano Palha e mais anteriormente à junção desta com a rua da Cruz dos Poiais, como o atestam as denominações de rua Fresca abaixo dos Poiais e rua Fresca que vai para os Poiais, citadas respectivamente em 1641 e 1644, nos Livros de Óbitos de Santa Catarina, e, ainda a circunstância de, desde 1630 a 1637, aparecer incluída na área das Mercês. O Sr. Matos Sequeira tem razão. A rua de Caetanao Palha foi a antiga Rua Fresca, como o demonstram as formas que em determinadas alturas serviram para designá-la — Rua Fresca do Poço dos Negros (1760) e Rua Fresca de Caetano Palha (1802) — e o facto de Manuel Palha Leitão, não sabemos se pai de Caetano Palha da Silva Leitão, mas decerto da sua família, ter morado na Travessa Fresca, onde faleceu em 1 de Maio de 1725.»

Rua Fresca [1967]
Ao cimo a Rua Caetano Palha
João Goulart, in Lisboa de Antigamente

Sunday 7 November 2021

Ruas do Carmo e 1º de Dezembro: venda de castanhas assadas

Quentes e boas!
Apregoa-se a castanha,
Desde o Rossio ao Saldanha,
Os pregões são sempre assim.
O segredo de como são assadas e como ficam com a cor «branca» está na temperatura do forno que é aquecido por brasas de carvão vegetal; as castanhas são colocadas num assador metálico (antigamente era em barro e ainda há quem use) com forma de cone em que a ponta de cima foi cortada de maneira a servir de «boca» e o fundo é perfurado por vários orifícios e encaixa perfeitamente no forno, de maneira a aproveitar o calor ao máximo. As castanhas antes de irem para o assador são cortadas com um único e profundo golpe e durante a assadura são repetidas vezes polvilhadas com sal grosso e mexidas.

Ruas do Carmo e 1º de Dezembro |1985|
Venda de castanhas assadas
Por Edital municipal de 7 de Agosto de 1911 a Rua do Príncipe e Largo da Rua do Príncipe passaram a denominar-se Rua Primeiro Dezembro, a data da Restauração em 1640. 
Georges Dussaud, in A.M.L.

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