Monday, 29 February 2016

Rua de São Bento, 140

As Cozinhas Económicas foram criadas pela 3ª duquesa de Palmela, Maria Luísa de Sousa Holstein, e por sua prima Maria Isabel Saint-Lèger, de que foi a 1ª presidente, para ajudar a população carenciada, sobretudo o operariado, colocando ao seu dispor refeições baratas.
Em 1906, existiam seis Cozinhas Económicas. A primeira cozinha foi inaugurada em 1893, na Travessa do Forno (na antiga freguesia dos Prazeres) e surgiram depois as dependências do Regueirão dos Anjos (1894), Alcântara (1895) e de S. Bento (1896).
 
Rua de São Bento, 140 [1908]
Sociedade Protectora das Cozinhas Económicas de Lisboa. Cozinha nº 6, fundada em 1896, sita na Rua de São Bento, 140, entre as travessas da Arrochela (à esq.) e da Peixeira
Machado & Souza, 
in Lisboa de Antigamente
 
As Cozinhas Económicas recebiam um subsídio de 50% do Estado. A partir de 1918 ficaram sob a alçada da Provedoria Central de Assistência. Recebiam também contributos particulares em  dinheiro e em géneros. Em 1928, a administração das Cozinhas Económicas passou para a alçada da Santa Casa da Misericórdia.

Rua de São Bento, 140 [1910]
Sociedade Protectora das Cozinhas Económicas de Lisboa. Cozinha nº 6, fundada em 1896, sita na Rua de São Bento, 140, entre as travessas da Arrochela (à esq.) e da Peixeira
Joshua Benoliel, 
in Lisboa de Antigamente

Sunday, 28 February 2016

Capela de Santo Amaro

A ermida de Santo Amaro é um caso único: renascentista, com planta centrada, uma galilé decorada com belos panos de azulejos do Rato, portais de ferro arrendados com vista para o Tejo. O terreno da base termina em quilha, qual proa de navio pretendendo soltar-se da colina e navegar mar fora atrás dos mareantes que a fundaram, segundo a lenda iconografada num dos painéis de azulejo. Historicamente sabe-se que em 1542 já existia uma ermida da Ordem de Cristo, que pagava foro à Basílica de S. João de Latrão, em Roma.¹
 
Reza a lenda que uma capela foi fundada no Alto de Santo Amaro por alguns frades da Ordem de Cristo que, no regresso de Roma (no século XVI), apanharam temporal no mar e, perante o receio de perecerem no naufrágio, prometeram a Santo Amaro levantar uma ermida no local onde dessem à costa, sãos e salvos. A capela referida na lenda foi, ao que se julga, transformada em sacristia da actual ermida, representativa do estilo renascentista, embora incorpore soluções estruturais góticas.³

Ermida de Santo Amaro, datada de 1549
Vista de Santo Amaro e Perspectiva do Lugar de Belém
 Vue du Port &de l'Eglise de Bellem [Mosteiro dos Jerónimos.]& de celle de S.Amat, Les Delices De l'Espagne & du Portugal, 1707
COLMENAR, Juan Alvarez de; Aa, Pieter van der (1659-1733)

 
Implantada numa colina sobranceira ao Rio Tejo, perto do vale de Alcântara, a Capela de Santo Amaro foi edificada em 1549, conforme indica a inscrição colocada sobre a porta principal do templo. O projecto desta ermida de planta centralizada, única na cidade de Lisboa, é atribuído a Diogo de Torralva, um dos grandes arquitectos do século XVI português, que tão bem explorou e entendeu o novo gosto do Maneirismo, nomeadamente as vias da tratadística italiana da época.

Capela de Santo Amaro, Alto de Santo Amaro, traseiras [entre 1962 e 1966]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro
Ao fundo nota-se a Ponte 25 de Abril em construção.
Artur Inácio Bastos, in Lisboa de Antigamente

Na verdade, a Capela de Santo Amaro destaca-se pela singular, e erudita, estrutura centralizada, composta por "(...) dois cilindros secantes de inspiração serliana, a que se agrega uma original galilé de planta semicircular (...)" (CORREIA, 1991). Espaço ímpar no panorama arquitectónico português, este templo terá sido inspirado numa gravura do tratadista Sebastiano Serlio, que representa o mausoléu dos Crescenzi, na Via Appia, em Roma (MOREIRA, 1995, p. 352).

Capela de Santo Amaro, Alto de Santo Amaro, fachada [ant. 190-]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro
Paulo Guedes,in Lisboa de Antigamente

A par com a capelinha de Bom Jesus de Valverde, em Évora, e a capela do Paço de Salvaterra de Magos, é um dos poucos espaços religiosos quinhentistas a explorar a planta centralizada, que voltará ao panorama arquitectónico português apenas na segunda metade da centúria seguinte.
O núcleo da estrutura é o espaço circular do oratório, envolvido em metade da sua área pela galilé semicircular, que compõe a fachada, à qual corresponde, do lado oposto, a pequena capela-mor, também cilíndrica.

Portal de pedra no adro da Capela de Santo Amar[ant. 1966]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro
Artur Inácio Bastos,in Lisboa de Antigamente

Aberta por uma arcada de cinco vãos, dois dos quais são cegos, a galilé é coberta por abóbada de nervuras abatida, com fechos decorados com símbolos alusivos ao santo padroeiro, cruzes de Cristo, florões e estrelas. Os três arcos principais foram fechados, no século XVIII, com portões de ferro forjado.
As paredes deste espaço estão totalmente revestidas por azulejos polícromos tardo-maneiristas, organizados em dois registos, cujas figurações centrais, alusivas a Santo Amaro, são envoltas por ferroneries, putti, motivos de grutesco e pendurados. Nos vãos cegos da arcada foram erigidos dois altares de estrutura maneirista, em trompe l'oeil, executados em azulejo policromo.

Escadinhas e Cruzeiro de Santo Amaro [c. 1940]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro
Fernando Martinez Pozal,in Lisboa de Antigamente

O acesso ao interior é feito através de três portas, abertas na galilé, estando gravada sobre a porta principal uma inscrição alusiva à data de fundação da capela. A nave circular é coberta por cúpula semi-esférica com lanternim, possuindo coro-alto, ao qual se acede pelo terraço. Um arco de volta perfeita, sem qualquer decoração, abre para a capela-mor, também coberta por cúpula semi-esférica, que ao centro alberga retábulo de talha azul e dourada em estilo nacional. Contígua à capela-mor foi construída a sacristia.
Celebrada a 15 de Janeiro, a romaria de Santo Amaro era uma das mais concorridas da cidade, tendo sido realizada pela última vez em 1911. Com o advento da República, a ermida foi abandonada e saqueada, chegando a servir de carvoaria. Em 1927 foi entregue à Irmandade do Santíssimo Sacramento, e no ano seguinte o espaço foi reabilitado para o culto.³
  
Cruzeiro de Santo Amaro [s.d.]
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
 
Bibliografia
¹ ADRAGÃO, José Victor; PINTO (Natália); RASQUILHO, Rui, Lisboa, 1985.
³ Bonneville, Maria do Rosário Santos, Bellem/Belém, Reguengo da Cidade, 1991
³ "IGESPAR)

Saturday, 27 February 2016

Cadeia do Limoeiro: Paço a-par-de São Martinho

Mas enfrentemos o edifício da Cadeia, este Limoeiro, casarão acabado de reconstruir no ano passado [1937], mas ainda em obras, sempre naquele amarelo característico que pesa do alto sobre a Alfama, como uma nódoa infamante, e que, no seu aspecto, nada nos diz hoje do que foi nos seus tempos paçãos.

 
Este edifício teve várias denominações — escreve o olisipógrafo Norberto de Araújo — , e algumas simultâneas, como hoje ainda acontece a prédios, palácios, ruas e sítios. Foi "Paço dos Infantes" porque nele habitaram os filhos de D. Pedro e de D. Inês de Castro; "Paço da Moeda" porque nele, ou em parte dele — e era vastíssimo — foi instalado o fabrico de moeda, que antes estava às Portas da Cruz; "Paço de a-par-de S. Martinho" pela vizinhança do templo; e ainda "Paço do Limoeiro" porque cerca dele, e em sitio de destaque, existiu — supõe-se — uma árvore que caracterizava o sitio. E Limoeiro é, e será, ainda que lá se instale um quartel ou um cinema. 1
 
Cadeia do Limoeiro, gravura em madeira. Desenho de J. R. Cristino, gravura de Oliveira

Palácio mandado construir por D. Fernando I, em 1367, numa posição fronteira à Igreja de São Martinho (demolida em 1838), daí a designação de Paço a-par-de-São Martinho. Neste local ocorreu a morte do conde Andeiro às mãos do Mestre de Aviz, futuro D. João I, em 1383, mantendo-se o edifício como residência régia com este último. Entre 1495 e 1521 foi residência das Comendadeiras de Santos-o-Velho e sede do Desembargo do Paço, para além de ter começado a funcionar como prisão e albergado várias repartições de justiça, nomeadamente a Casa da Suplicação e a Casa do Cível. Na 1ª metade do séc. XVIII, como ameaçava ruína, conheceu obras da responsabilidade do arqº Volkmar Machado

Cadeia do Limoeiro [ant. 1911]
Largo São Martinho
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

O terramoto de 1755 afectou de tal maneira o edifício, que tornou impossível manter os 500 presos, que se encontravam à data no local. Após a reconstrução de parte do imóvel entre 1758 e 1759, que foi adaptado a cadeia principal da corte, assistiu-se à construção do muro que delimitava a propriedade, por parte do arqº Possidónio da Silva, somente em 1834

Cadeia do Limoeiro, entrada principal [19--]
Largo São Martinho
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Já no século XX verificaram-se várias campanhas de obras: reconstrução do bloco central do edifício, na década de 30; demolição parcial e construção da nova ala Este, na década de 40, e continuação das obras, na década de 60. Actualmente, e desde os anos 80 do séc. XX, o edifício está afecto ao Centro de Estudos Judiciários (CEJ), do Ministério da Justiça.

Cadeia do Limoeiro, actual Centro de Estudos Judiciários [19--]
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

No que diz respeito à morfologia do edifício, trata-se de um volume irregular, associando uma planta rectangular a uma planta em L O edifício, localizado a Oeste, desenvolve-se em quatro andares, separados em três blocos por pilastras lisas e apresentando janelas rectangulares com moldura simples de cantaria, abertas em ritmo regular. A zona superior é rematada por platibanda interrompida por frontão triangular no corpo central.
____________________________________________
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. II, p. 55-56, 1938.

Friday, 26 February 2016

Palácio dos Monteiro Paim, ou do Bichinho de Conta

Este Palácio seiscentista foi pertença da família Monteiro Paim, mais tarde Condes de Alva, tendo mudado de proprietário no final do séc. XIX, quando foi adquirido por Leopoldo Wagner, da notável geração de músicos. Neste palácio foi celebrado o contrato de casamento entre o filho do Marquês de Pombal e Dona Juliana de Sousa Coutinho que resistiu à vontade férrea do marquês — que lhe valeu o cognome que este lhe deu «Bichinho de Conta» — e nunca consumou o casamento, vindo a casar (1779) sim com D. Alexandre de Sousa Holstein (pai de D. Pedro de Sousa e Holstein, 1.º Duque de Palmela), o noivo que sempre quis.

Rua de O Século, 102-114 [1968]
Palácio dos Monteiro Paim, ou do Bichinho de Conta, nome por que passou à história Dona Juliana de Sousa Coutinho; à direita, o muro do Palácio Ratton, onde está instalado o Tribunal Constitucional
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

Com uma linguagem arquitectónica harmoniosa e discreta, desenvolve-se em 3 pisos, tendo o último sido um acrescento do séc. XIX. O piso térreo abre-se em portas de variados tamanhos e vãos de intervalo regular. A porta principal e a janela do 1º andar, ligadas directamente, formam um conjunto com dois pináculos incrustados na parede, ladeando a sacada. A sua frontaria principal surge rasgada, a um ritmo regular e elegante, por janelas de sacada corrida ao longo da fachada. Exibe duas altas chaminés e através de um jardim murado torneja para a meia-laranja da Rua do Século
 
Rua de O Século, 102-114 [c. 1940]
Palácio dos Monteiro Paim, ou do Bichinho de Conta
Novais,in Lisboa de Antigamente

Thursday, 25 February 2016

Escadinhas de São Cristóvão

As Escadinhas de São Cristóvão ficam no centro histórico da capital, no bairro da Mouraria. Estas movimentadas escadas, que ligam a Rua de São Cristóvão à Rua da Madalena, são local de passagem de muitos lisboetas e zona de comércio local e restaurantes. 

Escadinhas de São Cristóvão [1953]
Fernando Martinez Pozal, in Lisboa de Antigamente

Este arruamento e os envolventes (Rua e Largo de São Cristóvão) devem o seu nome à Igreja de São Cristovão, de que são adjacentes, e onde assentou a antiga igreja de Santa Maria de Alcamim, no séc XIII.

Escadinhas de São Cristóvão [1953]
O painel de azulejo foi substituído em 1969 por um baixo-relevo representando São Cristóvão.
Fernando Martinez Pozal, 
in Lisboa de Antigamente

Wednesday, 24 February 2016

Casa dos Plátanos

Construído em 1921 [vd. 3ª imagem], sobre uma elevação natural, trata-se de um imóvel pensado e planeado de raiz para ser uma creche e, como tal, apresenta um programa arquitectónico coerente e funcional, mantendo a sua configuração original pouco alterada. O edifício destaca-se pela sua implantação, no alto de uma colina, ocupando uma posição de destaque na paisagem envolvente que, na época da construção, se encontrava em fase de urbanização, tendo sido projectado para um bom aproveitamento dessa mesma implantação. Nas proximidades, fica a Fonte Luminosa da Alameda D. Afonso Henriques.

Casa dos Plátanos, Creche do Alto do Pina |195-|
Rua Barão de Sabrosa, 269-271
No medalhão, sobrepujando a porta principal,  lê-se: "Misericórdia de Lisboa / Creche do Alto do Pina 1921"
Judah Benoliel, in Lisboa de Antigamente

O topónimo refere-se ao 1º Barão da Ribeira de Sabrosa, Rodrigo Pinto Pizarro de Almeida Carvalhais que nasceu em Vilar de Maçada em 30/03/1788, onde veio a vindo a falecer em 08/04/1841. Bacharel em Matemática, foi ainda brigadeiro do exército, comandante interino da 5ª divisão militar, deputado da nação (1837), senador do reino (1841), conselheiro do rei, presidente do conselho de ministros, ministro da guerra, negócios estrangeiros e marinha. O Barão de Sabrosa era também membro do Conservatório de Lisboa e da Academia de Belas Artes. (cm-lisboa.pt)

Casa dos Plátanos, Creche do Alto do Pina |195-|
Rua Barão de Sabrosa, 269-271
Judah Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Nota(s): Propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Dec. n.º 15 778, 23 Julho 1928. Em 2001 beneficiou de um projecto de alterações e ampliação do edifício pelo arquitecto João N. Santos Jorge.

Casa dos Plátanos, Creche do Alto do Pina [1921-12-29]
Rua Barão de Sabrosa, 269-271
Os telhados dos torreões, actualmente de quatro águas, terminavam em coruchéus piramidais, integrando vãos moldurados, rematados por pináculo e enquadrados por fogaréus.
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

100.000

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Tuesday, 23 February 2016

Avenida Fontes Pereira de Melo, coberta de neve

A Avenida Fontes Pereira de Melo integra-se no projecto de crescimento da Cidade para Norte, aprovado em 1888, plano intitulado: «Avenida das Picoas ao Campo Grande» da autoria do Engenheiro Ressano Garcia. As terraplanagens nas ruas Fontes Pereira de Melo e António Augusto de Aguiar, iniciam-se cerca de 1897.

Avenida Fontes Pereira de Melo, coberta de neve |193-|
À esquerda, o Parque Eduardo VII e a Av. António Augusto de Aguiar; ao fundo, à direita, o Palácio Sotto Mayor (1905)
Ferreira da Cunha, 
in Lisboa de Antigamente

Arruamento de 1900 que homenageia o chefe do partido Regenerador, António Maria Fontes Pereira de Melo (1819-1887), que presidiu ao Conselho de Ministros na década de 1876 e 1886, período que ficou conhecido como Fontismo

Monday, 22 February 2016

Calçada do Combro: vendedor ambulante de esponjas naturais

No séc. XV, esta artéria (Cç. do Combro) era parte da Estrada de Santos ou da Horta Navia. Gomes de Brito considera que era a calçada da «Bella Vista». De acordo com o olisipógrafo Norberto Araújo teve, além destas, as seguintes designações:
«Pois desçamos, Dilecto, a Calçada do Combro — que foi «do Congro» no século XVIII, «do Congo», em alguns documentos, e devia ser, afinal, pela lógica toponímica, do «Cômoro», isto é: do alto.»

Calçada do Combro: vendedor ambulante de esponjas naturais [ant. 1913]
Salta aos olhos, pela novidade, o vendedor de esponjas marinhas, que lhe afogam meio corpo.
Elevador da Estrela-Camões
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

 
Este elevador fora projectado em 1882 pelo engenheiro Mesnier du Ponsard com um troço mais longo, mas nunca foi completado, tendo funcionado somente entre o Camões e a Estrela até 1913. Chamado popularmente «maximbombo», acabou por ser substituído pelo carro eléctrico. Os seus carros foram vendidos para barracas de banhos, para barracas de feiras e para casas de guarda no campo.
 

Sunday, 21 February 2016

Rua do Salvador

A Rua do Salvador, que leva ao Menino de Deus e a Santo André, possue um cunho popular acentuado, como observas, mas pouco de típico, esse que deixamos para trás no coração da Alfama. [Araujo: 1939]

 
Esta rua, muito concorrida e de grande importância há quatro séculos, ligava as portas do Castelo de São Jorge à «Baixa». A circulação de bens e pessoas na cidade foram-se agravando com o tempo, originando acidentes diversos (sendo os atropelamentos os mais graves) e motivando frequentes discussões entre os condutores de coches e liteiras, sobretudo nas artérias mais concorridas e (ou) mais difíceis.

Rua do Salvador [Início séc. XX]
Perspectiva tirada da Rua das Escolas Gerais.
José A. Bárcia, in Lisboa de Antigamente
 
Com o intuito de resolver ou, no mínimo, minorar alguns desses problemas, a Coroa e o Senado criaram regras de trânsito e afixaram sinais ou placas de sinalização nas ruas mais problemáticas da época, subsistindo uma dessas placas num edifício da Rua do Salvador, 26-28. Datada de 1686, regulava a prioridade de passagem dos veículos, estipulando o seguinte: «Sua Magestade ordena que os coches, seges e liteiras que vierem da portaria do Salvador recuem para a mesma parte». Ou seja, quem viesse de cima perdia a prioridade em relação a quem subisse. 

De vinte e quatro letreiros que houve em Lisboa deste jaez — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , é o único que resta. O trânsito proibido do século XVII... Pois queres saber, Dilecto, qual era a pena aplicada aos transgressores? Cinco anos de degredo em terras do Brasil, e 2.000 cruzados de multa!
 
A meio da pequena subida há um edifício fora do alinhamento dos restantes que causa um estrangulamento da via. No tempo de D. Pedro II este estreitamento era causa de muitas discórdias entre quem subia ou descia a rua. Se dois se encontrassem a meio, nenhum queria ceder a passagem, uma vez que era tarefa difícil fazer recuar os animais. Consta que chegou mesmo a haver lutas e duelos, com feridos e mortos.

Rua do Salvador |1899|
A primeira regra e sinalização de trânsito de Lisboa, na Rua do Salvador, 26-28

(o letreiro é perceptível entre as duas portas à direita).
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Calçada do Carmo

A Calçada do Carmo — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , que foi Calçadinha do Carmo, rasgou-se na encosta dos terrenos do Convento, para onde as habitações dos Carmelitas tinham face poente. É uma rampa, onde de pitoresco — vulgar pitoresco — existe apenas esse Beco da Ricarda que em cotovelo morre na Rua do Duque(ARAÚJO. 1938)

Calçada do Carmo [entre 1909 e 1914]
Ao fundo, a Praça D. Pedro IV
Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente
(*) O local não se encontra identificado pelo fotógrafo

Saturday, 20 February 2016

Rua da Mouraria

O olisipógrafo Norberto Araújo caracteriza da seguinte forma este arruamento do vetusto Bairro da Mouraria, onde, até aos fins do séc. XIII chegavam as águas do Tejo:
A Rua da Mouraria é o troço —  a Avenida bairrista —  que começa no Arco Marquês do Alegrete e termina na Rua Fernandes da Fonseca, no ponto de convergência da Rua do Bemformoso, Rua dos Cavaleiros e Calçada da Mouraria. (...) Os grandes edifícios urbanos da Rua são quási todos do segundo e terceiro quartéis do século passado. (...) 

Rua da Mouraria |1918|
Embocadura da Rua do Capelão (dir.), vendo-se ao fundo a Calçada da Mouraria. Os edifícios do lado esquerdo foram demolidos para construção do ominoso Centro Comercial da Mouraria
Legenda da fotografia: «A Obra da Assistência 5 de Dezembro, o Presidente Sidónio Pais agradece as manifestações que lhe são feitas no largo da Guia, onde foi inaugurar a distribuição da sopa aos pobres».
 Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Repara, Dilecto, no conjunto desta Rua, de fachadas que não oferecem antiguidade e desenho bizarro, mas que, exactamente pelo conjunto, são o mais típico possível de post-Terramoto: os prédios são altos e estreitissimos (alguns pouco mais têm do que quatro metros), como por exemplo, defronte do Capelão, os dos n.°” 39-41, 53-55, 57-59. Vê-se' que as construções ganhavam na vertical o que perdiam na largueza.==
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. III, pp. 71-74, 1938)

Rua da Mouraria |1949|
Ao fundo, o antigo Arco do Marquês do Alegrete, demolido 
em meados de 1950 para dar lugar à actual Praça do Martim Moniz.
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Rua Castilho, 64-66

O primeiro Prémio Valmor atribuído nesta década, em 1930, projecto do arquitecto Raul Lino da Silva (1879-1974) para Sacadura Cabral, que não viria a ocupá-la, tendo sido vendida nesse mesmo ano a Manuel Duarte. 

Rua Castilho, 64-66  |c. 1930|
Prémio Valmor de 1930A charmosa Rua Castilho, na placidez dos anos 40, o passeio central arborizado, as suas elegantes moradias com vista sobre o casario, destacando-se a estátua do Marquês de Pombal.
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Esta moradia reflectia as preocupações do arquitecto com a temática da «casa portuguesa», sobre a qual se debruçou durante vários anos, traduzidos nas formas arquitectónicas portuguesas tradicionais, com jardim circundante e o uso de elementos característicos como o alpendre, os beirais, as cantarias e o azulejo.
 
Rua Castilho, 64-66, traseiras |c. 1930|
Prémio Valmor de 1930
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Demolida em 1982, as cantarias, colunas e portões foram posteriormente utilizados na construção do «Pátio Alfacinha». Actualmente o espaço é ocupado por um parque de estacionamento. (cm-lisboa.pt)
 
Rua Castilho, 64-66, pátio |c. 1930|
Prémio Valmor de 1930
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Friday, 19 February 2016

Escadaria José António Marques, Palácio Óbidos-Sabugal e Museu Nacional de Arte Antiga

José António Marques (1822-1884), concluiu o curso na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa aos 20 anos de idade e foi promovido a cirurgião ajudante do Exército, sendo colocado em Caçadores 30. Militar distinto, cientista e jornalista, a ele se deve a fundação da Cruz Vermelha Portuguesa.

O olisipógrafo Norberto de Araújo preconizava, em 1939, o desaparecimento da muralha da Rocha Conde de Óbidos, mas tal não veio a acontecer. A muralha, bem como a escadaria, ainda lá continuam.
«Tudo isto está condenado a desaparecer para dar lugar a uma nova muralha (a actual foi construída em 1880-1882) e que é desviada do seu local actual mais para nascente, na rectificação que se fará do Jardim 9 de Abril, antigo das Albertas, em cuja cêrca conventual foi construído.
A Rocha, ou Rochedo, era pertença da casa Sabugal-Óbidos (hoje da Cruz Vermelha) se debruça sobre a Avenida 24 de Julho.»
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIII, p. 91, 1939)

Escadaria José António Marques e Palácio Óbidos-Sabugal [Início séc. XX]
Avenida 24 de Julho 
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Localizado no Jardim Nove de Abril e Classificado como Imóvel de Interesse Público, este palácio do séc. XVII permaneceu na posse da família Óbidos-Sabugal até 1919, data em que foi adquirido pela Cruz Vermelha Portuguesa, que aí instalou a sua sede nacional. Objecto de profundas intervenções de restauro e conservação desde o Terramoto de 1755, da construção seiscentista subsiste, pouco alterada, a fachada Norte, destacando-se o portal nobre, de cantaria, encimado pelas armas da família proprietária. Painéis de azulejos azuis e brancos, datados da primeira metade do séc. XX e realizados por Gabriel Constante, imitando os painéis do séc. XVIII, formam um rodapé ao longo da fachada e ocupam os vãos entre as janelas. No interior é visível uma concepção romântica patente nos silhares de azulejos, nos tectos pintados e apainelados e nos revestimentos das paredes.(cm-lisboa.pt)

Palácio Óbidos-Sabugal [1930-39]
Avenida 24 de Julho
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
Escadaria José António Marques e Palácio Óbidos-Sabugal e Museu Nacional de Arte Antiga [195-]
Avenida 24 de Julho 
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

O Museu Nacional de Arte Antiga, sito na Rua das Janelas Verdes, está instalado, desde a sua fundação, em 1884, no palácio mandado construir, em finais do século XVII, pelo 1º conde de Alvor, Francisco de Távora,, após o seu regresso da Índia, onde fora vice-rei. Mantido na família até meados do século XVIII, veio depois a pertencer a um irmão do marquês de Pombal, Paulo de Carvalho, antes de passar a residência de um rico negociante de diamantes e cônsul da Holanda, Daniel Gildemeester, que patrocinou avultadas obras de qualificação dos interiores. A sua localização, erguida sobre o rio e a zona portuária, confere-lhe uma envolvência cenográfica invejável. (MNAA; DGPC)

Museu Nacional de Arte Antiga [195-]
Perspectiva tomada do Cais da Rocha
Fotografia anónima, in Lisboa de Antigamente

Thursday, 18 February 2016

Rua Morais Soares

No início do século XX, quase toda esta zona no termo da cidade era, ainda, maioritariamente composta por quintas: Quinta do Papagaio, do Fole, da Ladeira, do Alperce,  dos Pacatos, do Bacalhau, da Perna de Pau, do Areeiro. da Curraleira, e as quintas da Horta da Cera  e da Brasileira, estas duas contíguas à Rua Morais Soares e que se vêem na imagem. Do lado esquerdo vê-se parte do Hospital de Arroios na antiga Estrada de Sacavém que, juntamente com a Azinhaga do Areeiro dir.), seguiam para N., na direcção do Areeiro. O local onde se vê o carro funerário está assinalado na carta topográfica com um círculo vermelho (fig. 2 )

Panorâmica tirada da zona da Penha de França |c. 1900|
Cortejo fúnebre na Rua Morais Soares a caminho do cemitério do Alto de São João.
José A. Bárcia, in Lisboa de Antigamente
 
Rodrigo de Morais Soares (1811-1881) foi bacharel em Medicina pela Universidade de Coimbra. Depois da organização do ensino é feita pelo governo liberal, foi nomeado professor e comissário de estudos em Vila Real. Em 1848 foi eleito deputado pela primeira vez, voltando às câmaras em várias legislaturas. Quando em 1852 se criou a Secretaria das Obras Públicas foi nomeado chefe da Repartição de Agricultura, e mais tarde director geral. Nestes lugares prestou relevantes serviços, principalmente com a fundação da Quinta Regional de Sintra, a que deixou a sua biblioteca, a criação do Instituto Agrícola e dos postos hípicos. Em 1858 fundou o Arquivo Rural, importantíssimo jornal de agricultura e artes e ciências correlativas. Colaborou também no Recenseamento Geral dos Gados. Escreveu muitos opúsculos notáveis sobre assuntos agrícolas, financeiros, etc. Teve o seu nome a Escola de Regentes Agrícolas de Santarém, que foi depois transformada em Escola Prática de Agricultura em 1910. Tem em Lisboa uma rua com o seu nome.
(Dicionário dos mais ilustres Transmontanos e Alto Durienses» vol. I, coordenado por Barroso da Fonte)

Fig. 2 - Fragmentos das Plantas Topográficas de Lisboa 11 K e 12 K, Levantamento da Planta de Lisboa: 1911
por Júlio António Vieira da Silva Pinto

Wednesday, 17 February 2016

Palácio do Barão de Quintela e Conde de Farrobo

O Palácio dos Quintelas-Farrobos sito na Rua do Alecrim, erguido entre 1781-1882 pelo desembargador Luís Rebelo Quintela, fidalgo da Real Casa, sobre as ruínas do Palácio do Marquês de Valença (destruído por um incêndio, em 1726, e abandonado até 1777),  traduz um exemplar de arquitectura residencial pombalina, caracterizado por um eclectismo de matriz neo-clássica ou neo-barroca. O palácio foi muito ampliado e enriquecido por Joaquim Pedro Quintela, 1.° Barão de Quintela, sobrinho daquele desembargador, que instituiu o Morgado de Farrobo. O 2.° Barão e 1.° Conde de Farrobo, também Joaquim Pedro Quintela, revestiu o Palácio de ostentação rara em Lisboa. 
Foi neste palácio que se instalou o odioso general Junot em 1807/1808, durante a Primeira Invasão Francesa.

Palácio do Barão de Quintela e Conde de Farrobo [1933]
Rua do Alecrim, 56-72; Rua António Maria Cardoso, 37
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

De planta rectangular simples, com dois pequenos pátios interiores, do mesmo formato, a que se adossa um corpo também rectangular correspondente às antigas cocheiras, possui jardim murado com pórtico de acesso.
No final do séc. XIX, após a falência do Casa Quintela-Farrobo, é adquirido pelo capitalista Mendes Monteiro, e, posteriormente, herdado por António Carvalho Monteiro — o construtor da Quinta da Regaleira, em Sintra, e a quem toda a Lisboa chamava o «Monteiro Milhões» (ARAÚJO, 1939) — e alguns anos depois, por via matrimonial, passou para a Casa Pombal, cuja família aí mantém residência. 

Palácio do Barão de Quintela e Conde de Farrobo [c. 1910]
Rua do Alecrim, 56-72; Rua António Maria Cardoso, 37
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

O interior foi objecto de uma campanha de remodelação e enriquecimento artístico, dirigida pelo arq.º Hildbrandt e pelo cenógrafo e decorador Cinatti, no 1º quartel de Oitocentos, merecendo destaque as alterações estruturais introduzidas, os estuques artísticos e as pinturas a óleo e a fresco de António Manuel da Fonseca e de Wolkmar Machado.
A Classificação como Imóvel de Interesse Público abrange os jardins, os muros e o pórtico de acesso.

Palácio do Barão de Quintela e Conde de Farrobo [c. 1910]
Rua do Alecrim, 56-72; Rua António Maria Cardoso, 37
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente
 
N.B. A partir de meados de Fevereiro escreve-se um novo capítulo na história deste palácio, a antiga casa do Barão de Quintela abre ao público sob o nome Palácio Chiado. Lá dentro estarão 7 chefs e respectivos conceitos, do sushi aos hambúrgueres, e cerca de 250 lugares sentados.
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