« Há trezentos e trinta anos que isto por aqui é — o Calvário.»
[...]
Onde se levanta hoje o quarteirão urbano entre as Ruas Leão de
Oliveira e da Creche [actual Rua José Dias Coelho, vd. 2ª imagem] — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , elevava-se na
segunda metade de quinhentos, com sua quinta a fazer-lhe grinalda de
flores e de frescura, a casa de um italiano, João Baptista Rovelasco,
arrematante dos direitos reais. Logo a seguir a 1580 Felipe I de
Portugal, por dividas à Coroa, ou com esse pretexto, confiscou a
propriedade que os representantes do rei espanhol reedificaram ou
acrescentaram em 1605, pelo arquitecto Teodósio Frias, mestre das obras
da cidade, e depois do Paço da Ribeira.
Largo do Calvário |1965| Quarteirão entre as Ruas José Dias Coelho (1ª a dir.) e Leão de Oliveira (ao fundo à dir.). Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente |
No Palácio de Alcântara não habitou nunca nenhum dos Felipes, ou dos governadores do Reino. D. João IV, porém, fez dele sua residência, de verão pelo menos, e de sua real família; o príncipe herdeiro D. Teodósio aqui morreu em 1653. D. Afonso VI, seu irmão D. Pedro II, com as duas Rainhas, primeira e ,segunda mulher, também ocuparam o delicioso Paço do Calvário, vivendo afastado do bulício de Lisboa, escondido quási dentro da encantadora Quinta da Ninfa [Quinta de el-Rei. vd. mapa], estância de repouso, propicia a doces e amorosas vidas.
Aqui morreu D. Pedro II em 1706, e o Paço passou então a ser habitado por seu filho, o Infante D. António (irmão de D. João V), e que nele assistia quando surgiu o Terramoto.
Largo do Calvário |1949| Rua José Dias Coelho, antiga da Creche Mário Novais, in Lisboa de Antigamente |
Arruinadas as régias casas, reedificadas dez anos depois, nunca mais o Palácio foi residência real. Moraram então nele dignitários, fidalgos, principais da côrte; foi fábrica de chitas, deixou de o ser, arrastou-se como propriedade de aluguer - uma sombra afinal. Em 1876 os terrenos da Quinta da Ninfa foram cedidos pela Casa Real à Câmara Municipal de Belém, da qual a freguesia de Alcântara dependia; os restos do palácio foram demolidos pouco depois. Começava o bairro do Calvário.
Ora, Dilecto, Palácio e Quinta eram tudo isto à nossa direita (lado Norte), e deles - «nem raça», como diz o povo.»
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. IX, pp. 30-31, 1929)
Largo do Calvário: Palácio e Quinta de Alcântara Levantamento topográfica de Lisboa, 1857 [fragmento} sob orientação do Engº. Filipe Folque |
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