«O que mais o contrariava era deixar aquele arranjinho da rua de S. Francisco. Que ferro! agora que aquilo ia tão bem, o gajo no Brasil, e ela ali, à mão, a dois passos do Grémio!...»
(QUEIROZ, Eça de, Os Maias, 1888)
O Grémio Literário foi criado por carta régia de D. Maria II em 18 de Abril de 1846 — «considerando Eu que o fim dessa associação é a cultura das letras e que pela ilustração intelectual pode ela concorrer para o aperfeiçoamento moral».
O Grémio teve entre os seus fundadores as duas principais figuras do Romantismo nacional, o historiador Alexandre Herculano (Sócio nº 1) e o poeta e dramaturgo Almeida Garrett, e ainda o romancista Rebelo da Silva, o dramaturgo Mendes Leal, e grandes personalidades da vida política do liberalismo, como Rodrigo da Fonseca (que redigiu os estatutos), Fontes Pereira de Melo, Rodrigues Sampaio, Sá da Bandeira, Anselmo Braancamp,
o futuro Duque de Loulé, e da ciência, da economia e da velha e da nova
aristocracia. Com sedes sucessivas sempre na zona do Chiado, «capital de Lisboa», e passando pelo célebre Palácio Farrobo, o Grémio Literário instalou-se finalmente, em 1875, no palacete do visconde de Loures, na rua então de S. Francisco.
É um edifício exemplar da arquitectura romântica de Lisboa, preservado ao longo dos tempos, com o seu jardim de 1844, único nesta área histórica da cidade, tendo recebido em 1899 grandes obras de decoração de José de Queiroz, nas salas e na varanda aberta sobre o Tejo e o Castelo de S. Jorge. (in gremioliterario.pt)
Grémio Literário, jardim [Junho de 1910] Semana de Armas Portuguesa, prova de esgrima com a presença do rei Dom Manuel II (1889-1932) Fotógrafo não identificado, iin Lisboa de Antigamente |
Grémio Literário, jardim [Junho de 1911] Sala com programa decorativo de gosto neo-Luís XV, com projecto e direcção de José Queiroz Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
As suas salas, a biblioteca, o famoso gabinete de leitura de jornais foram frequentados por gerações sucessivas de sócios e menção do Grémio Literário encontra-se em muitas obras de autores célebres, como Teixeira de Queiroz, Abel Botelho, Ramalho Ortigão, Júlio de Castilho, G. Matos Sequeira, e sobretudo Eça de Queiroz, que nele localizou várias cenas de Os Maias — sabendo-se que no prédio do lado habitava Maria Eduarda, a maior criação romanesca feminina do século XIX português.
«O amigo que Carlos gostava de ver entrar era o Cruges — que vinha da rua de S. Francisco, trazia alguma coisa do ar que Maria Eduarda respirava. O maestro sabia que Carlos ia todas as manhãs ao prédio ver a «miss inglesa»: e muitas vezes, inocentemente, ignorando o interesse de coração com que Carlos o escutava, dava-lhe as ultimas noticias da vizinha...
«O amigo que Carlos gostava de ver entrar era o Cruges — que vinha da rua de S. Francisco, trazia alguma coisa do ar que Maria Eduarda respirava. O maestro sabia que Carlos ia todas as manhãs ao prédio ver a «miss inglesa»: e muitas vezes, inocentemente, ignorando o interesse de coração com que Carlos o escutava, dava-lhe as ultimas noticias da vizinha...
— A vizinha lá ficou agora a tocar Mendelsohn... Tem execução, tem expressão, a vizinha... Há ali estofo... E entende o seu Chopin.
Se ele não aparecia no Ramalhete, Carlos ia a casa buscá-lo: entravam no Grémio, fumavam um charuto nalguma sala isolada, falando da vizinha: Cruges que a achava «um verdadeiro tipo de grande dame». (QUEIROZ, Eça de, Os Maias, 1888)
Nota(s): Pode assistir (aqui) a um pequeno filme sobre uma das especialidades gastronómicas do Grémio Literário.
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