O
Palácio dos Azevedos Coutinhos, ocupa uma área contida entre a Rua de
Santo Estêvão, o Largo do mesmo nome (escadinhas de curiosa
perspectiva), e o Largo do Chanceler, e assenta em parte sobre o Arco do
Chanceler.
Não sei em Lisboa de cousa assim — diz-nos o ilustre Norberto de Araújo — como
esta Alfama se multiplica de aspectos raros, em mistérios de germe
urbanista, de imprevistos e de quadros locais que nunca se assemelham,
mas de que nossos olhos se vão fatigando, acabamos, em saturação, por
não fixar um apontamento. Fica-se entontecido. Não será assim, Dilecto?
O
enquadramento é gracioso, seja qual for o conceito que nós possamos ter
de beleza nestes quadrinhos bairristas, onde — e é o caso neste sítio —
o pitoresco, o religioso, o fidalgo se dão mãos, para que Alfama se
represente nos três Estados.
O Palácio de Santo Estêvão, dos Azevedos Coutinhos é uma fundação seiscentista, de tipo nobre, modesto; envolto num pitoresco de cenário, único em Lisboa, e, a despeito da sua mediania arquitectónica, pode ser considerado um espécime curioso da cidade, como tal, merecedor de relevo nesta nota histórica.
|
Palácio Azevedo Coutinho [190-]
Largo (Miradouro) Escadinhas de Santo Estêvão; Arco do Chanceler; Rua de Santo Estêvão Ângulo do edifício sobre Santo Estêvão, distinguindo-se o terraço primitivo do andar nobre com paredes ao fundo de azulejos historiados, de delicioso efeito tomado do Largo. Alberto Carlos Lima, in Lisboa de Antigamente |
Ainda no século XVII uma grande parte dos terrenos que rodeiam a
primitiva igreja de Santo Estêvão era do domínio directo do priorado ou
da irmandade da paróquia. No local onde se levantou o solar existiam na
primeira metade do seiscentos umas atafonas e depois umas casas — o
núcleo primitivo do solar — «por trás da capela-mor sobre o Arco», casas
que pertenciam a um Domingos Preto, descendente, talvez filho, de
«Simão Gonçalves Preto, chanceler-mor que foi destes reinos», segundo
atestava em 1695 o cura de Santo Estêvão, Padre Cristóvão Prestes da
Silveira, num documento traslado que lhe foi requerido, e no qual há
referência a casas no local em 1647, o que não significa que não as
houvesse antes, pois um documento existente no arquivo da Câmara
Municipal demonstra que, em 1688, aquelas casas passaram a um Tomé de
Mesquita. De admitir é que tivesse sido o chanceler Simão Gonçalves
Preto o fundador da casa, e duvida parece já não subsistir de que fosse
dele que derivou a denominação do «Arco do Chanceler».
|
Palácio Azevedo Coutinho [1899] Largo de Santo Estêvão; Rua de Santo Estêvão A Fachada, de duas faces do corpo Sul do edifício contíguo inferiormente ao principal, fazendo esquina para as escadinhas e Rua de Santo Estêvão, caracterizado por um sólido cunhal de cantarias sobrepostas, com algumas janelas (de sacada) e portas de habitações pobres; sobre este corpo assenta um terraço, com cortina de grades seiscentistas. Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente |
O
palácio, propriamente dito, recebeu dano pelo Terramoto, pois se vê que
uma parte do edifício é de reconstrução posterior ao núcleo primitivo,
este representado pela frontaria, pelo ângulo do terraço e por parte da
face sobre a estreita Rua de Santo Estêvão. Data, pois, de 1847 o
senhorio dos Azevedos Coutinhos no solar e casas de Santo Estêvão.
Entre
1847 e 1867, período
durante o qual a propriedade foi administrada por João António de
Azevedo Coutinho, este fez «Obras reais» na casa, acrescentando-lhe em
parte dois andares modestos, conservando o semblante seiscentista da
fachada amesquinhada na estreita serventia denominada ali Largo do Santo
Estêvão, mas desfigurando as salas, pela cobertura com estuque dos
tectos apainelados, e pela supressão de bons panos de azulejo que
revestiam as paredes em silhares.
Em 1911 lavrou incêndio na ala
Sul do palácio, sobre a Rua de Santo Estêvão; as obras de restauro não
lograram repor o interior dessa ala no seu aspecto primitivo.
Palácio dos Azevedo Coutinho [1939]
Arco do Chanceler, vista tomada do Largo de
Santo Estêvão
Eduardo Portugal, in LdA
Palácio dos Azevedo Coutinho [195-]
Arco do Chanceler, vista tomada o Largo de
Santo Estêvão
Almeida Fernandes, in LdAL
O
Arco do Chanceler, sob o Palácio ao qual dá passadiço, é de volta abatida. À d
ireita abre-se o portal do velho solar servido
por um átrio interior, do qual a escadaria de dois lanços se
desenvolve, amparado a um corrimão, em balaustrada de mármore branco,
transpirando de tudo um ar discreto, repousado, setecentista, só
igualado em espírito no
palácio dos Condes dos Arcos.
______________________________________________________
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. X, pp. 90-91, 1939.
id, Inventário de Lisboa, 1955.