Thursday, 29 September 2016

Largo do Contador-Mor

 Os bandos das raparigas, que se espalhavam pelos quatro cantos da cidade, saíam tarde do Liceu. O caminho dela e o de umas tantas mais era em grande parte feito através da cidade velha e costeira. Seguiam juntas por ruelas, pátios, calçadas; passavam arcos, escadinhas, cotovelos, silenciosos uns, outros barulhentos; ladeavam velhos palácios desmantelados, igrejas, antigas muralhas ... tudo aquilo sendo, atestando passado, remotíssimo passado pátrio. O Liceu estava sito no Largo do Contador-Mor (quem teria sido?), com entrada pela Rua das Damas.==

Este Largo do Contador-Mor (no século XVI chamado "Terreiro das Casas do Governador") deriva seu nome do facto de aqui terem vivido alguns dos contadores-mores, um dos quais D. Tristão da Cunha Mendonça e Menezes. O cargo foi extinto em 1761.

Largo do Contador-Mor |c. 1950|
Da esq. para a dir.: Palácio dos Castros; Palácio dos Condes de Vimieiro, 3-4; encimando o Largo a Casa do Contador, 5-7.
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

[....] No Largo do Contador-Mor, n.ºs 3 e 4 [vd. 2ª foto], está um prédio que, num aspecto já desaparecido, teria sido o Palácio dos Condes de Vimieiro, com o seu curioso passadiço sobre o Arco da Rua das Damas; há mais de meio século que nele funciona uma Escola Municipal, hoje [1938] oficial.

Foto 2: Largo do Contador-Mor, 3-4. |c. 1913|
Palácio dos Condes de Vimieiro; a (belíssima) actriz italiana Monica Bellucci adquiriu, recentemente, dois apartamentos neste prédio depois de recuperado pelos arquitectos Manuel Aires Mateus e Frederico Valsassina.
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Repara neste outro prédio do topo do Largo, n.°s 5 e 7 [vd. 3ª foto], ainda de aspecto antiquado, mas simpático, na sua simplicidade, com suas janelas setecentistas, o seu amarelo característico da fachada. Não é arriscada a conjectura de nele terem vivido os contadores, ou um deles, D. Tristão, talvez.

Foto 3: Largo do Contador-Mor, 5-7 |1913|
Casa dos Contadores-Mores

Machado & Souza, 
in Lisboa de Antigamente

O grande prédio que se segue [com o n.º 1 do Largo e parcialmente à esq. na 1ª foto e na 2ª foto], em dois corpos unidos, de fachada moderna, e com radicais transformações sobre o primitivo, foi o Palácio dos Castros (de seis arruelas) de Boquilobo, senhores do Paúl. Um dos maiores desta família, foi D. Álvaro de Castro, governador da Casa Cível, e por isso este largo, como te disse, foi chamado Terreiro das Casas do Governador.
E antes de chegarmos ao final desta área vou mostrar-te, Dilecto paciente companheiro, uma outra curiosidade do sítio, oculta, e que vale umas passadas. Este prédio, n.º 18 [2º prédio à esq. na 4ª foto] do lado nascente do Largo, de medíocre aspecto, encosta-se pelas traseiras a um lanço de muralha primitiva, da Cerca Moura, que do vértice do Castelo descia às Portas do Sol.==

Foto 4: Largo do Contador-Mor |1949|
O 2º prédio à esq. no n.º 18
encosta-se pelas traseiras a um lanço de muralha primitiva, da Cerca Moura.

Eduardo Portugal, 
in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
LISBOA,  Irene (1892-1958), Voltar atrás para quê? [c. de 1910-20]
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. II, pp. 66-67, 1938.

Tuesday, 27 September 2016

O Retiro do Caliça na Estr. dos Salgados

Nas hortas, havia sempre cães famintos, pedintes, hortelões e cavadores, e o indispensável cego da guitarra, acompanhado pela mulher da viola e outros músicos, que entoavam canções de guitarredo fácil e dedilhavam e esganiçavam o fado com um estilo especial e inconfundível, indo de mesa para mesa, onde o peixe fumegava e os canjirões do roxo ferviam.


Nos arrabaldes de Lisboa, pelo Arieiro, Campo Grande, Campolide, Xabregas e muitos outros sítios, eram inúmeros os retiros campestres, onde se comia, bebia, cantava e jogava o chinquilho em mangas de camisa. 
Desapareceram já quási todos, uns porque a urbanização da cidade os sacrificou, outros porque passou de moda ir ás hortas, o cego da guitarra eclipsou-se por ordem das autoridades e foi-se o ambiente alfacinha daquelas diversões. (...)
Havia, ainda, o José dos Caracois, no Arieiro; o Faustino e o Guerra, em Cabo Ruivo, donde se viam passar, lá em baixo, os tramways de Vila Franca e se comia um delicioso pudim fabricado pelas recolhidas de Cheias; o Ferro de Engomar, na estrada de Bemfica, bem como Bacalhau, o Charquinho, que foi do Paco, da rua das Gáveas; as Pedralvas; o Caliça, todos em azinhagas próximas;» [1]

O Retiro do Caliça e o Cemitério de Benfica [c. 1904]
O antigo Retiro do Caliça situava-se na Estrada dos Salgados; em segundo plano, a Capela do Cemitério de Benfica,
junto à Estrada Militar
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

O Cemitério de Benfica foi mandado construir no ano de 1869, na sequência da extinção dos antigos cemitérios paroquiais de Benfica e Carnide.
No seu espaço, perto da capela, no lado direito de quem sobe a alameda de entrada, localiza-se o jazigo mais visitado de Lisboa, onde estão depositados os restos mortais do Padre Cruz, objecto da devoção lisboeta e nacional.

O Retiro do Caliça [c. 1904]
Estrada dos Salgados a Benfica
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia:
[1] FERNANDES, Eduardo (Esculápio), in Olisipo: boletim do Grupo «Amigos de Lisboa», 1942, n-º 17, pp. 40-41.

Sunday, 25 September 2016

Palácio Nacional da Ajuda: o palácio inacabado

Ora bem, Dilecto. Chegámos ao Palácio da Ajuda, monumento nacional, enorme casarão que de quási toda a Lisboa se avista presentemente reduzido a Museu, mas que não está aberto ao público. 


O nome de Ajuda deriva da pequena Ermida desta invocação, erecta no século de quatrocentos no alto da Ajuda, e à qual andou ligada uma graciosa lenda: um pastor que por aqui trazia seu gado entrou em certa ocasião numa gruta entre fragas que caracterizava o lugar, e viu nela uma imagem da Virgem, que logo — e porque auxiliava os que a ela recorriam — ficou sendo a Senhora «da Ajuda», construindo-se defronte a Ermida. (...)
Aí estão as origens do nome e da humilde póvoa quinhentista.

Palácio da Ajuda, fachada  [1866]
Largo da Ajuda; ao centro, a Torre da Ajuda ou «do Galo»
Francesco Rocchini, in Lisboa de Antigamente

A planta do Palácio da Ajuda é do risco do italiano Francisco Xavier Fabri e do português José da Costa e Silva, mais tarde alterada por Manuel Caetano de Sousa, havendo as obras principiado formalmente em 1802, tempo de D. João, príncipe regente, depois D. João VI. Pararam as obras em Novembro de 1807, e recomeçaram anos depois para paralisarem de novo em 1833, mas o Palácio, na sua grande ala logo construída começou a ser habitado em 1826, após a morte de D. João VI. No fim da monarquia era residência privativa da Rainha D. Maria Pia e do Infante D. Afonso.

Palácio da Ajuda, fachada  [c. 1900]
Largo da Ajuda
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Ora, Dilecto, não vamos «viajar» pelo grande palácio, que, a-pesar-de inacabado, é o maior do país. A fachada que vês, em cujas extremas se elevam êsses torreões, coroados por troféus, é uma das quatro que a grande mole quadrada deveria ter. É elegante esse corpo central, com três janelões sobre os três pórticos, guarnecidos de colunas dóricas.

Palácio da Ajuda, fachada poente  [1900]
Perspectiva tirada da Calçada da Ajuda sobre oa fachada poente com projecto arquitectónico que prevê a sua conclusão (remate) até 2018.
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
 
O interior do Palácio da Ajuda — entregue à Repartição do Património Nacional — só pode ser visitado com autorização especial. 
Sumariamente, e de cor, te forneço alguns elementos. Mas já te aviso: sem guia perder-te-ás aqui dentro.
Entra-se pela Sala dos Archeiros (2ª ft abaixo), à nossa esquerda, contigua à Sala do Porteiro da Cana. Logo encontraremos a Sala do Dossel, depois chamada da Audiência, e mais tarde da Espera (3ª ft.). Nesta Sala há tapeçarias feitas sobre cartões de Goya, algumas estátuas, de relativo mérito, e um tecto de Volkmar Machado.
Logo a Sala dos Cães, com algumas peças de arte, entre as quais um D. Sebastião, escultura de Simões de Almeida. Outra Sala do Despacho [vd. 4ª imagem] apresenta inúmeros exemplares de cerâmica, mobiliário e tapeçarias. Continuar-se então uma série de saletas, e logo a Sala de Música (5ª ft), o antigo quarto de D. Luiz, a Sala Azul, na qual se admiram três quadros de Silva Porto: «Carro de Bois», «À porta da locanda», e uma paisagem. As Salas de Mármore, de Saxe (6ª ft), e logo as Salas Verde e a Vermelha dão prolongamento a este desfile de aposentos palacianos, que termina no Quarto de D.Maria Pia (7ª ft), e onde esta Rainha dormiu o seu último sono em Portugal. 
(clicar nas imagens para ampliar)
Como o artigo já vai longo, decidimos inserir aqui a chamada «quebra de página», caso queira continuar a ler e visualizar imagens das dependências deste palácio clique em «ler mais [read more]»

Friday, 23 September 2016

Praça do Duque de Saldanha

Com esta bela Praça do Duque de Saldanha, que data da última década do século passado [séc. XIX], se deu testa à grande artéria mãe das Avenidas Novas, em correspondência paisagista com a Praça Mouzinho de Albuquerque [actual Rotunda de Entrecampos]. Na Praça, em rotunda, estrela de cinco pontas, confluem as Avenidas Fontes Pereira de Melo, Casal Ribeiro, Praia da Vitória [dois ramos] — estas duas já deste século — e da República (...) ¹


A Praça do Duque de Saldanha — antigamente chamada Rotunda de Picoas — nasceu do plano das Avenidas Novas concebido, no fim do século XIX, por Frederico Ressano Garcia, engenheiro da Câmara Municipal de Lisboa. A Praça tinha uma fisionomia mais simples do que a que lhe conhecemos na actualidade. Tinha uma tipologia de rotunda; era circular, com acesso radial, trânsito de atravessamento e envolvente. 

Praça do Duque de Saldanha |c. 1940|
Antiga Praça Mouzinho de Albuquerque, antes Rotunda das Picoas
; Avenida da República
Amadeu Ferrari, in Lisboa de Antigamente

Para responder ao crescente aumento do trânsito automóvel nas décadas de 1950-60, é rasgado um novo arruamento na  Praça em 1969. Trata-se de quebrar a forma circular de rotunda da Praça, «o espaço molusco cuja viscosidade, espraiando-se fez perder a clareza da forma geométrica pur2, para dar lugar a um novo desenho. Se se comparar a fotografia dos anos 40 com outra de finais da da década de 60, pode ver-se que a pavimentação concêntrica central foi cortada dos dois lados para favorecer o tráfego automóvel. Ficou uma faixa de betume ou “ilha” em forma de “banana” [vd. 2.ª imagem] que vem separar os dois sentidos de circulação, entre a Avenida da República e a Avenida Fontes Pereira de Melo. 3

Praça do Duque de Saldanha |1969|
Antiga Praça Mouzinho de Albuquerque, antes Rotunda das Picoas; Avenida da República

Artur Bastos, in Lisboa de Antigamente

A Avenida de Fontes Pereira de Melo termina na rotunda da Praça do Duque de Saldanha, cercada de heterogéneas edificações, e a meio da qual se ergue o Monumento ao Duque de Saldanha. A pedra fundamental do monumento, cuja parte escultural é de Tomás Costa e a arquitectónica de Ventura Terra, foi lançada em 1904, tendo-se inaugurado em 1909. A estátua, que representa o marechal de pé, com a mão direita apontando na direcção do S., assenta sobre um pedestal dórico de base quadrangular flanqueado de colunas com capitéis canelados. À frente da estátua, na base, a figura alegórica da Vitória, de bronze, nas outras faces panóplias ornamentais pendem da boca de leões, tudo de bronze. 4

Praça do Duque de Saldanha |c. 1950-60|
Antiga Praça Mouzinho de Albuquerque, antes Rotunda das Picoas; Avenida da República

Fotógrafo não identificado, postal Ed. Lifer [s.d.]

Bibliografia
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, p. 79, 1939.
2 BESSA, J. P., Saldanha – Edifício MASP e Helena Rubinstein, Análise urbana da Praça do Saldanha, 1986.
3 FRÉTIGNÉ, Hélène, Uma Praça Adiada: Estudo de Fluxos Pedonais na Praça do Duque de Saldanha, vol. I, pp. 23-29, 2005.
4 PROENÇA, Raul, Guia de Portugal: Generalidades: Lisboa e arredores, vol. I, p. 434, 1924.

Wednesday, 21 September 2016

Paços do Concelho: a Casa da Câmara

Na noite de 19 para 20 de Novembro de 1863 rebentou um terrível incêndio, que durou oito dias dos maiores que Lisboa tem visto — e reduziu tudo a cinzas. Passavam cento e oito anos menos vinte dias sobre o Terramoto.


Entre 1770 e 1774 construiu-se nesta Praça, que a reedificação da Cidade tornou possível, um edifício para a Câmara Municipal, que se estendia até à Rua do Ouro e Terreiro do Paço. A Câmara ocupava apenas uma parte do «seu» Palácio — pois para a Câmara fora destinado —, havendo-se instalado no edifício a Junta do Crédito Público, o Banco de Lisboa (1822), convertido em Banco de Portugal em 1846, a administração do Contrato do Tabaco, a Companhia das Lezirias, a Companhia Fidelidade, etc. Também parte do edifício (de 1795 a 1807) serviu de habitação a D. Maria I, e à família real, após o incêndio do Paço (Velho) da Ajuda. Na noite de 19 para 20 de Novembro de 1863 rebentou um terrível incêndio, que durou oito dias — dos maiores que Lisboa tem visto-e reduziu tudo a cinzas. Passavam cento e oito anos menos vinte dias sobre o Terramoto.

Paços do Concelho [ant. 1863]
Praça do Município; no segundo plano o Arco da Rua Augusta em construção, faltando ainda o coroamento das colunas só concluído em 1875; no último plano a Sé de Lisboa.

Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Logo o Senado da Câmara pensou em reedificar a sua Casa, mas desta vez independente do Terreiro do Paço. O arquitecto Domingos Parente da Silva foi encarregado do risco, e as obras começaram em 29 de Outubro de 1866, só se concluindo em 1875. Alterado várias vezes no plano inicial, o edifício da Câmara de Lisboa é este que aqui se ostenta na Praça do Município.
O edifício dos Paços do Concelho de Lisboa — é nobre. A grandeza relativa equilibra-se com a pureza e harmonia das linhas severas e delicadas a um tempo.

Paços do Concelho [c. 1875]
Praça do Município

Francesco Rocchini, in Lisboa de Antigamente
Paços do Concelho, construção [c. 1875]
Praça do Município.  Note-se a ausência da platibanda no torreão oriental da Praça do Comércio.

FFotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Sete pórticos, varanda adiantada sobre as três janelas do corpo central, mais duas janelas de varanda de cada lado, e esse belo frontão triangular, do cinzel de Calmels, com as armas da Cidade e as figuras alegóricas da Liberdade e do Amor da Pátria, frontão que se apoia sobre quatro grupos de duplas colunas monolíticas de ordem compósita — eis a fachada do edifício, que uma platibanda de balaústres coroa ao alto e em redor. (O acrescentamento das mansardas data de 1934).1

Paços do Concelho [Inicio séc. XX]
Praça do Município; Rua do Comércio; Rua do Arsenal

Chaves Cruz, in Lisboa de Antigamente

No interior destaca-se a intervenção do arq.º José Luís Monteiro, sobretudo na escadaria central, bem como a rica decoração pictórica a cargo de vários artistas, dos quais se salientam José Pereira Júnior (Pereira Cão), Columbano e Malhoa, revelando deste modo todo o edifício um conjunto destacado de intervenientes, tanto a nível arquitectónico e construtivo, como decorativo, apresentando uma estética e inovação de grande qualidade. A 7 de Novembro de 1996 um novo incêndio destruiu os pisos superiores, ficando afectados os tectos e pinturas do primeiro andar.2

Paços do Concelho [194-]
Praça do Município; Rua do Comércio; Rua do Arsenal; Terreiro do Paço

António Passaporte, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XII, p. 15, 1939.
2 cm-lisboa.pt/equipamentos.

Sunday, 18 September 2016

O Largo de Arroyos e a sua Sopa

Este Largo era um verdadeiro acampamento, entre dois ou três palácios que assistiam indiferentes à cena. Mas era aqui o Largo do Cruzeiro. O padrão-cruzeiro é uma homenagem de D. João III e do senado da Câmara à memória da Rainha Santa Isabel, medianeira das pazes entre D. Afonso IV e D. Dinis prestes a entrarem em batalha no campo de Alvalade.1


O Largo de Arroios, anteriormente designado por Largo do Cruzeiro ou do Cruzeiro de Arroios, também se tornou célebre no começo do século XIX, pelas cenas populares de que foi teatro, por ocasião da terceira invasão francesa, em 1810. Encheu-se a capital, de gente fugida das diferentes terras do Reino, ao aproximar-se o exército de Massena.
Cinquenta mil pessoas, aproximadamente, entraram, por essa ocasião em Lisboa, sem contar as que ficaram nas vilas e aldeias suburbanas.

[Sopa de Arroios] Largo de Arroios, gravura [c. 1813]
No último plano, a Calçada de Arroios e a antiga Estrada das Amoreiras (Rua Carlos José Barreiros) e o antigo Palácio do Conde da Guarda;  ao lado deste a Bica nº 1 ou Chafariz de Arroios; defronte do palácio vê-se o célebre Cruzeiro de Arroios resguardado por um pavilhão envidraçado, cujo telhado piramidal descansava em pilares de cantaria. Este Cruzeiro foi erigido no reinado de D. João III, para comemorar a beatificação da Rainha Isabel de Portugal; no primeiro plano, à direita, o Palácio dos Senhores de Pancas hoje demolido.
Desenho de SEQUEIRA, Domingos (1768-1837). Gravura em buril e água forte por QUEIROZ, Gregório, in Lisboa de Antigamente

 Era necessário acudir a estes infelizes. Os governadores do Reino, o Senado da Câmara e diversos cidadãos beneméritos, organizaram várias obras sociais, entre as quais, a distribuição diária de sopas económicas, que se serviam em vários locais, onde se estabeleciam acampamentos improvisados.
 
Largo de Arroios [c. 1950]
À esquerda, a Calçada de Arroios e, ao centro, a Rua Carlos José Barreiros (antiga Estr. das Amoreiras) e o antigo Palácio do Conde da Guarda; ao lado deste a antiga Igreja de Arroios (1828-1970) e Rua Alves Torgo (antiga Estr. de Sacavém).
Judah Benoliel,
in Lisboa de Antigamente
 
O Largo de Arroios, pela sua área e também porque ficava perto de uma das entradas da cidade, foi igualmente escolhido por muitos infelizes que se estendiam a descansar em redor das poucas bagagens de que dispunham. Aí se fazia a distribuição da sopa, o que inspirou a Domingos António Sequeira, contemporâneo destes acontecimentos e morador no Largo de Arroios, o seu conhecido e excelente desenho, «Sopa de Arroios», de que, depois, Gregório Fernandes de Queiroz, discípulo do célebre Barrolozzi, fez uma boa gravura, tendo os contornos das figuras, sido abertos pelo próprio Domingos Sequeira.2

Largo de Arroios [1968]
À esquerda, a Calçada de Arroios e, ao centro, o antigo Palácio do Conde da Guarda.
Armando Serôdio,
in Lisboa de Antigamente
 
Bibliografia
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. IV, p. 82, 1938.

2 Revista Municipal, nº 85 de 1968, in Hemeroteca Digital.

Saturday, 17 September 2016

Tabacaria Costa

Do outro lado, porém, na esquina da rua do Ouro, a Tabacaria Costa — lê-se num número da revista Serões de 1909 — com a sua montra bem illuminada, replecta de bilhetes postaes illustrados e photographias diversas, obriga o povo a perder meia hora a vêr as collecções, e não raro é impellido pelo desejo de possuir um ou outro postal, a entrar e comprar, para mandar a um amigo ausente, ou mesmo para guardar como recordação.1

Tabacaria Costa [c. 1910]
Rua Áurea vulgo Rua do Ouro.; Rua Primeiro de Dezembro; Hotel Universo
Alberto Carlos Lima, in Lisboa de Antigamente

A Tabacaria Costa — escreve A Capitalcujo negócio de bilhetes postaes é importantissimo e que fica à esquina da Rua do Oiro, para o Rocio do lado direito de quem desce, foi, outr'ora, o celebre Pão Quente, um cambista que fez época e que estabeleceu a sua casa pouco mais ou menos quando se fundaram as loterias. Depois esteve ali o cambista Silva, que mudou mais tarde para o prédio a seguir ao do Monte-Pio, d'onde passou para a loja que presentemente ocupa. A Tabacaria Costa, ponto forçado de estacionamento para todos os estrangeiros que veem a Lisboa, não tem quem a exceda, presentemente, nos magnificos fornecimentos de postaes nem nas collecções de vistas de Lisboa e dos arredores da capital. Assim, se o Pão Quente é ainda hoje relembrado a Tabacaria Costa, que tão grande desenvolvimento tem sabido imprimir ao commercio dos bilhetes postaes, será tambem das que, no futuro, serão apontadas com sympathia.2

Tabacaria Costa [c. 1910]
Rua Áurea vulgo Rua do Ouro.; Hotel Universo
Alberto Carlos Lima, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
1 Serões: revista mensal illustrada, p. 56, 1909.
2 A Capital: diário republicano da noite, 29 Junho de 1916.

Thursday, 15 September 2016

Bica ou Chafariz de Arroios

Uma das mais belas curiosidades arqueológicas do sitio — desapareceu há três anos [c. 1935]. Já cá não está, e é pena. Mas vale um meio minuto de descrição.


Na velha Estr. das Amoreiras, antes da Charneca, havia voltada a Leste, uma graciosa bica ou chafariz — modesta é certo, mas histórica. Viam-se nela esculpidas as armas da cidade com seu navio, e as do Reino, com seu castelo e quinas. Tinha uma legenda que testemunhava ser a obra de 1624, mandada fazer pela «cidade à custa do Real d'Água». E por cima da vêrga que levava a mina viam-se duas inscrições, uma em letra gótica e outra em tipo corrente de inscrição, mas afirmando ambas que «na era de 1398 teve princípio esta fonte no campo de Lourenço Afonso Costas [thesoureiro do Concelho, sendo escrivão d'elle, Lourenço Duraens e mestre pedreiro do mesmo Concelho João Gialdi]»

Bica ou Chafariz de Arroios [c. 1900]
Largo de Arroios, antiga Estrada das Amoreiras hoje Rua Carlos José Barreiros
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Até 1848 esse chafariz, n.º 1, estava colocado na frente do prédio referido atrás que foi Palácio do Conde Guarda [vd. gravura]; depois mudaram-no para outro local, a poucos metros, onde a pobre bica acabou (1935) os seus dias: exactamente o sítio da porta 3-A do prédio novo da Rua Carlos José Barreiros.
E podia ter lá ficado, encravada no edifício, e a valorizá-lo, a Bica de Arroios. Era das mais velhas fontes de Lisboa. Foi pena, repito-te. Talvez que agora nos matasse a sede, numa evocação gótica como a legenda de Arroios de há 550 anos.1

Largo de Arroios, gravura [c. 1813]
No último plano, a Calçada de Arroios e a antiga Estrada das Amoreiras (Rua Carlos José Barreiros) e o antigo Palácio do Conde da Guarda;  ao lado deste a Bica nº 1 ou Chafariz de Arroios; defronte ao palácio vê-se o célebre Cruzeiro de Arroios resguardado por um pavilhão envidraçado, cujo telhado piramidal descansava em pilares de cantaria. Este Cruzeiro foi erigido no reinado de D. João III, para comemorar a beatificação da Rainha Isabel de Portugal; no primeiro plano, à direita, o Palácio dos Senhores de Pancas hoje demolido.
[Sopa de Arroios] Desenho de SEQUEIRA, Domingos (1768-1837). Gravura em buril e água forte por QUEIROZ, Gregório, in  Biblioteca Nacional Digital

Por determinação camarária, de 9 de Março de 1848, passou a Bica de Arroios para o princípio da Estrada das Amoreiras (hoje Rua Carlos José Barreiros), a pedido do proprietário do Palácio do Conde da Guarda, Desembargador João Lopes Calheiros de Meneses, que contribuiu com a quantia de 48$000 réis. A primeira água veio a correr em 6 de Dezembro de 1848, sendo os sobejos concedidos ao Palácio dos Senhores de Pancas, mediante o foro anual de 50 réis. Possuía duas torneiras onde o povo e os aguadeiros se abasteciam e, da parte de baixo, uma bica [de água salobra] corria continuamente para um grande tanque, que servia de bebedouro para o gado.
Crê-se que as pedras de maior valor, tanto as inscrições como o escudo e a caravela, recolheram ao Museu das Galveias. 2
3

O prédio da Rua Carlos José Barreiros, antiga Estrada das Amoreiras, que tem actualmente o n.º 3, em cuja frente estava colocada a mencionada bica ou chafariz de Arroios [c. 1950]
Judah Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia:
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. IV, p. 85)
2 Revista Municipal, nº 50 de 1951, p. 10, in Hemeroteca Digital)
3 idem nº 85 de 1968, p. 20)

Tuesday, 13 September 2016

Salão de Jogos, Casa Senna

Conhecido popularmente por "Salão de Jogos", este estabelecimento, sito na Rua Nova do Almada, 48-52, abriu as portas ao público em 1834. O fundador, Alexandre José de Senna, era um comerciante estimado que, em cerca de meio século, conseguiu conquistar o bom nome de que hoje esta casa usufrui.



Em 1880, por falecimento daquele, passou o estabelecimento à posse de seu filho José Alexandre de Senna, que, em 1897, confiou a gerência ao sobrinho, Frederico Carlos de Senna Cardoso. No exercício dessas funções, deu provas de competência e saber administrativo, continuando desde então a manter e desenvolver as tradições granjeadas pelos antecessores. Morto José Alexandre de Senna, tomou conta da sociedade a viúva Leopoldina Pereira de Sena. Sob a razão social "Viúva de José Alexandre de Senna", prosseguiu Frederico Carlos de Senna Cardoso no cargo de gerente até 1918, ano em que, havendo falecido a referida senhora assumiu, por sua vez, a sociedade que começou a gerir com a firma "F.C.de Senna Cardoso". Durante a sua gerência fundou uma revista quinzenal ilustrada de educação física e actualidades com o nome "TIRO E SPORT", que era vendida por 150 réis, em que abordava as principais notícias desportivas da época. A fundação dos actuais clubes de futebol estão ali historiadas. 

Salão de Jogos de Alexandre José de Senna [c. 1911]
Rua Nova do Almada, 48-52
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Assim se resume a história da primeira casa de venda de artigos desportivos em Portugal, a qual ao longo de 170 anos teve a honra de ser nomeada fornecedora da Casa Real, pelo Rei D.Carlos, cuja ordem, por curiosidade, se transcreve:
"Eu El Rei faço saber a vós António Maria José de Mello Silva Cezar e Meneses, Conde de Sabugosa, Par do Reino, Gra Cruz da Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo e de outras estrangeiras, Gentil Homem da Minha Real Camara e Meu Mordomo Mór: que attentas as circunstancias que concorrem na Viúva de José Alexandre de Senna, com estabelecimento nesta cidade de Lisboa, de bilhares e jogos diversos, Hei por bem e Me Praz Fazer-lhe mercê de a Nomear Fornecedora da Minha Real Casa, dos artigos do seu comércio sem vencimento algum pela Fazenda Real, gosando porém de todas as honras e prerrogativas que lhe competirem e podendo com este titulo collocar as Armas Reaes Portuguezas no frontispicio do seu estabelecimento. Mando-vos a façais assentar no Livro da Matricula dos Moradores da Minha Casa em seu titulo como dito fica."Paço em nove de Julho de mil novecentos e três.  (in casasenna.com)
Anúncio Salão de Jogos, Casa Senna [1909]
in Serões : revista mensal ilustrada

Saturday, 10 September 2016

Café Nicola

O actual Nicola, que sucedeu à Ourivesaria Xavier de Carvalho, foi fundado por Joaquim Fonseca e Albuquerque (que deixara o Chave d'Ouro) em 1929; o arquitecto foi Norte Júnior. O actual semblante, em remodelação radical, data de 1935, sendo arquitecto Raúl Tojal. [1]


Em 1909, a revista «Serões» publicava um extenso artigo assinado por Pinto de Carvalho (1858-1936) intitulado «Os cafés de Lisboa». João Pinto de Carvalho (jornalista, escritor, olisipógrafo), conhecido principalmente por Tinop escreveu uma «Lisboa d'outros tempos: Os Cafés)», pintando-nos, no seu estilo original e pitoresco, um pouco da história e das origens deste antigo e afamado café lisboeta:

"Os dois primeiros cafés litterarios de Lisboa foram o Nicola e o botequim das Parras.  Na vida lisbonense representaram um papel semelhante áquelle que os cafés Foy e Suiede  representaram na vida parisiense porque Musset ia procurar idéas no fundo dos calices de absintho do primeiro e Emilio de Girardin ia descobrir a sua idea diaria no fundo das chavenas de café do segundo. Também Bocage e o seu claro auditorio davam alôr á imaginativa, emborcando os calices de genebra, de cró, de champurrião e de philippina, nos dois celebérrimos cafés do Rocio. O café e bilhar do Nicola foi estabelecido pelo italiano Nicolau Vitaliano, o Nicola, em 1779, occupando duas lojas do predio de D. José da Silva Pessanha. sito no Rocio, n.ºs 22, 23, 24 e 25, sendo as primeiras duas portas destinadas ao bilhar. N'aquella época, os botequins enxameavam pelo Rocio. porque só no quarteirão dos frades de S. Domingos havia oito e no quarteirão dos Padres Vicentes (actual Francfort-Hotel) havia um e a loja de registos de Pedro Zanarte.

Café Nicola |1932|
Praça D. Pedro IV vulgo Rossio
A multidão em frente da sucursal de O Século, lendo as notícias sobre a 3ª Volta Ciclista a Portugal.
Fotógrafo não identificado,  in Lisboa de Antigamente

Os preços das bebidas do Nicola em 1798 eram estes: almoço de café com torradas ou biscoitos, 200 réis; copo de ponche ou limonada, 30 réis; frasquinho de licor 40 réis; copo de philippina ou de neve, 200 réis; bule de chá, 150 réis. No botequim da Opera estas bebidas duplicavam de preço. O Nicola foi trespassado a Joaquim Coelho de Athayde em 1801, conservando-se com o mesmo titulo que tambem serviu de alcunha ao novo proprietário. Este café archi-celebre acabou em 1834. Mas ainda hoje existem descendentes do segundo Nicola (o Athayde). Este ultimo teve uma filha, Rosa Nicola. depois Rosa Pinto, que foi actriz no teatro de D. Maria ll. estreando-se na peça Um Par de Luvas." 2

Café Nicola, fachada |1929|
Praça D. Pedro IV vulgo Rossio
Fotógrafo não identificado,  in Lisboa de Antigamente

Refere Tinop na sua divertida «Lisboa d'outros tempos» um episódio picaresco envolvendo a polícia e o poeta Bocage que regressando certa noite do café do Nicola a sua casa, foi detido por uma patrulha da policia, que «apontando-lhe as pistolas aperradas, lhe perguntou quem era, d'onde vinha, e para onde ia. Outro, que não elle, sentiria passar á fllôr da pelle um frémito gelado, sentiria o terror de ser preso como suspeito, o que, n'esse tempo, não era brincadeira. Bocage, porém, respondeu imperturbável:
Eu sou o Bocage,
Venho do Nicola.
Vou pr'o outro mundo,
Se dispara a pistola.»
3

Café Nicola |1935|
Praça D. Pedro IV vulgo Rossio
 Os quadros das paredes são do pincel de Fernando Santos, e representam passos anedóticos da vida literária e romântica do Poeta [Bocage]. A estátua  que se vê ao fundo da Sala, e que esteve primeiramente no exterior, é do escultor Marcelino Ncrte de Almeida (1929) .[ARAÚJO, 1939]
Fotógrafo não identificado,  in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
¹ Serões: revista mensal illustrada, 1909.
² ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XII, p. 74, 1939.
³ CRVALHO, Pinto de, (Tinop), Lisboa d'outros tempos: Os Cafés, p. 56-57, 1898.

Wednesday, 7 September 2016

Igreja de Santa Engrácia; as obras eternas e uma lenda

Estamos defronte de um monumento nacional, de singular expressão arquitectónica, único, talvez, no país, nem conservado nem abandonado, rico de forma e triste aparência: o templo inacabado de Santa Engrácia. Melhor o designaremos, como o vulgo, e dentro do estribilho alfacinha, por «Obras de Santa Engrácia».

Obras — porquê? De Santa Engráeia — porquê?

   
Em 1569, desanexada de Santo Estêvão, constituiu-se a nova paroquial de Santa Engrácia, cuja Igreja sede foi erecta neste sítio entre aquele ano e o de 1578. Era um templo pequeno mas suficiente, ao estilo seiscentista, certamente modesto. Em 15 de Janeiro de 1630, produziu-se na Igreja, de noite, um sacrilégio, o qual, dentro do espírito da época, provocou a mais profunda indignação e deu aso a solenes manifestações de penitência e piedade: haviam arrombado a porta do sacrário do Santíssimo e roubado as sagradas partículas.
Projectou-se, em desagravo, erguer um templo novo, e logo a igreja foi considerada em profanação, e a paroquial transferida para a já citada Ermida do Paraíso, onde o culto normal continuou,  com excepção das festividades solenes que se realizavam em S. Vicente.
Ia a nova Santa Engrácia quási concluída quando (1682) aconteceu cair a cúpula, incidente gravíssimo e que deve atribuir-se a erro de engenharia, por falta de precisão no cálculo. 
Aqui se enxerta uma história romântica que mais adiante resumo. 

Igreja de Santa Engrácia (Panteão Nacional) [c. 1900]
Campo de Santa Clara
José A. Bárcia, in Lisboa de Antigamente

Foi então encarregado de erguer novo e majestoso templo um ilustre artista, João Antunes, arquitecto de D. Pedro II,  [o Pacífico], mas sendo de crer que aproveitasse grande parte do que já estava feito, embora o seu risco, ao que se deduz de velhos escritos, fosse mais rasgado do que o primeiro.
A forma orbicular da nova Igreja mantinha-se contudo, e, assim, subsistia a dificuldade do remate na cúpula acima da cimalha real. Os arquitectos hesitaram, pois o fracasso da anterior construção constituía um aviso.  
Veio o Terramoto. As sólidas paredes resistiram na sua mole de pedra; a cúpula não caiuporque a não havia. Nunca se acabou Santa Engrácia; obras eternas: «obras de Santa Engrácia. [...]
Santa Engrácia, Dilecto, é isto que vês, indiscutivelmente belo e triste. Chega a confranger os menos devotados a cousas de arte e pouco zelosos do destino dos edifícios sacros.
Por diploma de 29 de Abril de 1916, este monumento foi destinado a Panteon Nacional.

Igreja de Santa Engrácia (Panteão Nacional) [1908-02-08]
Funeral de Dom Carlos e de Dom Luís Filipe; Campo de Santa Clara
Chaves Cruz, in Lisboa de Antigamente
    
Agora cumpre referir, em duas palavras, o romance episódico que se liga à história das «Obras de Santa Engrácia».
Acusado de ser autor de sacrílego roubo foi preso um jovem hebreu, Simão Pires Solis,  não soube ou não quis defender-se nos interrogatórios, e, condenado, foi queimado vivo. Diz-se — e é aqui que entra a lenda — que momentos antes do sacrifício dissera: «Tão certo eu morrer inocente, como as obras de Santa Engrácia nunca se acabarem». E não acabaram
Afinal o moço andava de amores com uma freira de Santa Clara [Violante, de sua graça] e só por essa circunstância não quis revelar o que fazia «por aqui» quando, por suspeito noctívago, o prenderam.
Exposta a lenda com fundo verídico demos uma vista de olhos a Santa Engrácia.1

Igreja de Santa Engrácia (Panteão Nacional) [1966]
Construção da cúpula; Campo de Santa Clara
Garcia Nunes, in Lisboa de Antigamente

As obras da actual igreja só foram concluídas em meados do séc. XX, 1966, com a construção da cúpula baseada no projecto do arq.º Amoroso Lopes. Tinham passado 284 anos. Desde então alberga o Panteão Nacional, encontrando-se em 2 torreões distintos os túmulos dos Presidentes da República e de artistas célebres. De planta octogonal, centralizada por uma cruz grega, de topos arredondados, inscrita num quadrado formado por 4 torreões-bloco, apresenta a sua fachada principal rasgada por um portal enquadrado por colunas salomónicas de capitéis compósitos e remate de baixo-relevo com a padroeira. [cm-lisboa.pt]

Igreja de Santa Engrácia (Panteão Nacional) [1966]
Observa-se a cúpula baseada no projecto do arq.º Amoroso Lopes; Campo de Santa Clara.
Garcia Nunes, in Lisboa de Antigamente

Igreja de Santa Engrácia (Panteão Nacional)
O Panteão Nacional foi inaugurado solenemente em 7 de Dezembro de 1966.
Catalão Monteiro, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
1 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. VIII, pp. 81-83, 1938.
Web Analytics