Aí temos o Palácio da Legação de França. Observa a sua fachada nobre, o formoso escudo brasonado, em alto relêvo, sobrepujado da corôa dos Abrantes (Lencastres).
O Palácio Abrantes, irregular em planta, é constituído por uma série de alas, que ladeiam o pátio e os jardins, estando a fachada principal orientada a Norte, sobre a Calçada do Marrquês de Abrantes, oferecendo um aspecto repousado, setecentista.
O
Palácio dos Marqueses de Abrantes. a Santos-o-Velho — actual Embaixada de França — situado na
Calçada do Marquês de Abrantes, contiguo pelo Nascente a
Igreja de Santos. é o sucessor directo do
Paço Real de Santos. Fora este paço — do qual. deve dizer-se, não restam vestígios — começado a erigir por
D. Manuel I em 1501, sobre o núcleo de uma casa solarenga que aquele rei adquirira. por escambo
[permuta]. a Fernão Lourenço. opulento feitor das Casas da Mina e da Índia, o qual por sua vez. e alguns anos antes. levantara aquele seu solar em terreno aforado às comendadeiras de Santos, senhoras do domínio directo, onde fez arrasar as casas decrepitas do velho mosteiro que no final do século XII D. Sancho I doara aos monges cavaleiros da Ordem de Santiago. e no século seguinte se transferiu para as comendadeiras da mesmo Ordem.
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Palácio dos Marqueses de Abrantes [1908-1914] Calçada Marquês de Abrantes, 121-123; Rua de Santos-o-Velho, 1-11; Calçada Ribeiro Santos (cerca) O Corpo destacado, ou frontispício, dividido por pilastras, e no qual se abre, ladeado por janelas falsas, o portal nobre, emoldurado de cantaria; três janelas de sacada, sobrepujadas de áticas, vendo-se sobre a do centro, em pedra de relevo, o pelicano, timbre do brasão dos Lencastres; o frontão superior, em tímpano triangular, sobrepondo-se ao alinhamento geral da fachada, dentro do qual assenta, em grande vulto, e suspenso de grinalda, a pedra de armas dos Lencastres (sete castelos e cinco quinas das armas reais, mas sem o filete negro em contrabanda, indicativo de bastardia). Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente |
O
Palácio da Legação de França, propriedade, como dissemos, do Estado francês, e por êste quási integralmente adornado e mobilado, tem um indiscutível interêsse histórico subjectivo, mas ostenta ainda largas reminiscências dos séculos XVII e XVIII.
No primeiro pavimento, a
Sala de Música, de tecto apainelado, com boas pinturas decorativas, impressiona pela sua harmonia, e por um formoso
Gobelin «
Psyche no Banho», tapeçaria que não é única no palácio. Logo no Salão Nobre, adornado de mobiliário «Directório», de belo tecto em abóbada de cesto, se encontra outro
«Gobelin», êste o mais formoso da colecção
«Luiz XIV na tomada de Dunquerque». A Sala de Jantar ostenta outro exemplar daquelas tapeçarias
«Bodas de Assuerus e Ester», num conjunto discreto e composto de nobreza; ainda na Sala de Jantar, de Verão, outro «Gobelin» se admira
«A lenda de Artemisa».
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Palácio dos Marqueses de Abrantes [1908-1914]
Sala de Música, ou de Baile
Charles Chusseau-Flaviens, in GEH |
O Palácio demonstra que algumas salas foram poupadas a restauros de sumptuosidade no tempo dos primitivos possuidores, os Abrantes, e como o Terramoto poucos estragos fèz nesta casa nobre,
ainda se notam aposentos que recuam ao século XVII. Assim são de citar-se uma capela, preciosa e quente, de boas pinturas, azulejos de grande valor, uma teia de mármore e madeira do Brasil, tecto apainelado, pintura sacra, e boa talha emolddurando o retábulo do altar. A
saleta, que foi sacristia desta capela, notabiliza-se pelos azulejos, com pinturas de
«encordado», raras, evidentemente do século seiscentos, e ainda, por uma figura o «Anjo do Silêncio». à entrada, cerâmica forte.
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Palácio dos Marqueses de Abrantes [1908-1914]
Sala de estar, tapeçaria Gobelin
Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente |
Não deve deixar de citar-se uma pequena câmara, de teto em cúpula, sendo esta revestida interiormente de louças do Japão, da Índia, e algumas peças hispano-árabes, num conjunto original.
Os jardins, em dois planos, são admiráveis, engrinaldando o Palácio de uma atmosfera nobre setecentista, tranquila e repousante, com exuberância de arvoredo numa deliciosa harmonia com as fachadas dos dois corpos do edifício, um dos quais corresponderá à parte palaciana que sucedeu à conventual, e que encosta à Igreja de Santos.
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Palácio Abrantes [1908-1914]
Saleta que foi sacristia da capela
Charles Chusseau-Flaviens, in LdA |
No Jardim superior que tem por fundo a fachada Sul, posterior
da fachada principal, na qual se abrem cinco janelas de sacada e três
portas de comunicação para uma sala, situando-se do lado Poente desse
jardim a ala transversal do palácio onde se encontram as salas e
dependências principais atrás inventariadas; junto à última porta do
Salão de Recepção, no ângulo do terraço , nota-se uma mesa, de tampo de
mármore carcomido, de quatro pés de pedra, onde, segundo a tradição
mantida na família Lencastre, e passada a livros, o Rei D. Sebastião
teria almoçado, antes de partir para a infeliz jornada de África.
O actual Ministro da França [em 1938], Mr. Amé Leroy, apaixonado de assuntos históricos, e individualidade de grande sentido artístico, servido por fina cultura, capricha em que o Palácio de França mantenha o ambiente e a gracilidade que a tradição lhe empresta.
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Palácio Abrantes [1908-1914] No terraço do plano superior se
encontra a tal mesa de pedra de mármore, rectangular, sem outro
interesse que não seja o que Ihe empresta a tradição: ter ali almoçado
D. Sebastião na manhã em que se foi para Alcácer Quibir — para nunca
mais voltar. Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente |
O
pequeno edifício [foto seguinte] que se integra no corpo do Palácio pertence à Legação da França; construído em
1927 por
René Touzet, de bom estilo barroco dos
arquitectos Rebêlos de Andrade, e que ocupa o espaço que foi, primitivamente, a cavalariça do palácio Abrantes, com acesso pelo pátio interior)
[ao fundo na 1ª foto]. Nele está instalado o
Instituto Francês conforme o atesta a
legenda sôbre a elegante varanda do andar nobre.
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Palácio dos Marqueses de Abrantes, [ant. 1949]
Calçada Marquês de Abrantes
Instituto Francês pequeno edifício construído em 1927 por René Touzet
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
Os
Corpos laterais, com um
único andar superior, tendo o do lado
Nascente, mais comprido, dez janelas de sacada
sobrepujadas de cornija, com gradeamento setecentista, e
sete janelas
falsas, rectangulares e duas portas no pavimento térreo; o do lado
Poente, estreito, duas janelas de sacada superiores, e duas janelas
falsas no piso térreo..
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Palácio dos Marqueses de Abrantes, lado Nascente [1918]
Calçada Marquês de Abrantes
(Manifestação de regozijo pelo Armistício)
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. VIII, pp. 19-21, 1938.
id., Inventário de Lisboa, 1949.