Sunday, 30 December 2018

Palácio Mesquitela

Neste Largo [do Doutor António de Sousa], n.° 1 a 15, — refere Norberto de Araújo —  se ergue ainda o palácio seiscentista onde se instalou há trinta e cinco anos [1903] a Escola Comercial de Rodrigues de Sampaio  — , que foi pertença da família Sousa Macedo, e depois Costas, Condes de Mesquitela


Com fachada para a Calçada do Combro, situado entre as Travessas do Alcaide e do Judeu, n.ºs 1 a 15, a propriedade, relativamente extensa, com seu pátio, cocheiras, anexos e pedaço de terreno ajardinado- era um documento expressivo deste sítio. O portal do pátio nobre, hoje recreio da Escola, e o umbral de esquina da Travessa do Judeu [vd. 4.ª imagem], são armoriados, no brasão daqueles fidalgos, que ascendem aos Albuquerques, e foram senhores da famosa Quinta da Bacalhôa, em Azeitão.

Palácio Mesquitela |1932|
Largo Dr. António de Sousa Macedo, 1; Travessa do Alcaide, 19-19B; Rua do Sol a Santa Catarina, n.º 30A-30C; Travessa do Judeu, n.º 2-4
Antigo Largo do Poço Novo
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Ao tipo insonso exterior dos palácios do século XVII e XVIII, é todavia elegante na sua larga ordem de janelas rasgadas na fachada. Como notas, o prolongamento do casarão, pelas travessas que o ladeiam, é ainda da configuração antiga e deslavada. [...]

Palácio Mesquitela, portal armoriado |1959|
Largo Dr. António de Sousa Macedo, 1; Travessa do Alcaide, 19-19B; 
Rua do Sol a Santa Catarina, n.º 30A-30C; Travessa do Judeu, n.º 2-4
O brasão é partido em pala: no 1º, metade do brasão dos Sousa do Prado; no 2º, brasão dos Macedos, 
metido num gracioso ornamento e encimado por uma coroa de conde, tendo por timbre 
um braço vestido segurando uma maça cravada de pontas
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

Uma das figuras mais notáveis da família a que pertenceu o palácio foi D. António de Sousa de Macedo, escritor, jurisconsulto e diplomata, secretário de Estado de D. Afonso VI, falecido em 1 de Novembro de 1682. A sua memória foi consagrada em Agosto de 1937 pela Câmara Municipal no dístico que se apôs ao velho Largo do Poço Novo.

Palácio Mesquitela|1959|
Largo Dr. António de Sousa Macedo, 1; Travessa do Alcaide, 19-19B; Rua do Sol a Santa Catarina, n.º 30A-30C; Travessa do Judeu, n.º 2-4
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

N.B. A 30 de Novembro de 1993 o Palácio é finalmente Classificado Imóvel de Interesse Público. Em 2008 é adquirido pelo grupo Paço, que recupera e converte o antigo Palácio em apartamentos de luxo, com a premissa de um profundo respeito e valorização da obra original. Da fachada principal, totalmente restaurada, restaram intactas as pilastras que a delimitam, as 16 janelas de sacada e o imponente portal, com emolduramento de cantaria encimado por um frontão triangular que detém a pedra de armas da família Sousa de Macedo.
 
Palácio Mesquitela [194-]
Largo Dr. António de Sousa Macedo, 1; Travessa do Alcaide, 19-19B; Rua do Sol a Santa Catarina, n.º 30A-30C; Travessa do Judeu, n.º 2-4 (brasão de armas dos Macedo)
Horácio Novais, in Lisboa de Antigamente
 
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. V, p. 38, 1938.

Friday, 28 December 2018

Avenida da Liberdade, esquina com a Rua Alexandre Herculano

Em 1941, a Associação Industrial Potuguesa (A.I.P.) adquiriu nova sede, desta feita na Avenida da Liberdade, num amplo palacete onde se manteve até 1958. Foi demolido em 1963/64..

Avenida da Liberdade, esquina com a Rua Alexandre Herculano [Início séc. XX]
Palacete onde esteve instalada a sede da Associação Industrial Portuguesa (A.I.P.) entre 1941-1958.
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

O topónimo Rua Alexandre Herculano foi atribuído pela Câmara Municipal de Lisboa, através de Deliberação Camarária de 06/05/1882, à “perpendicular à Avenida da Liberdade, em direcção ao Largo do Rato”. Pela mesma deliberação foram atribuídas na mesma área a Rua Castilho, a Rua Barata Salgueiro, a Praça do Marquês de Pombal e a Rua Mouzinho da Silveira. 

Rua Alexandre Herculano com a Avenida da Liberdade [1961]
Palacete sede AIP
Augusto Fernandes, in Lisboa de Antigamente

Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo, escritor e historiador, nasceu em Lisboa a 28/3/1810 e morreu em Vale de Lobos, a 13/9/1877.
Juntamente com Almeida Garrett, é considerado o introdutor do Romantismo em Portugal. Foi o renovador do estudo da História de Portugal. [cm-lisboa.pt]

Palacete sede AIP, fachada sobre a Rua Rodrigues Sampaio [1961]
Augusto Fernandes,
in Lisboa de Antigamente

Wednesday, 26 December 2018

Igreja de Nossa Senhora da Luz

Classificada como Monumento Nacional, foi mandada edificar em 1575 pela Infanta D. Maria, filha de D. Manuel I. Projectada por Jerónimo de Ruão, com provável intervenção de seu pai, João de Ruão e de Francisco de Holanda, traduz um templo maneirista, estilo chão, com uma fachada monumental de dois pisos, que sofreu grande ruína com o terramoto de 1755. Subsistiu apenas a capela-mor, o arco do cruzeiro e parte das paredes. A actual fachada foi construída em 1870, sob projecto do arqº Valentim Correia.

Igreja de Nossa Senhora da Luz [1929]
Largo da Luz; Rua da Fonte; Travessa das Carmelitas
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

No interior merecem destaque: a capela-mor com abóbada de berço, decorada com caixotões marmóreos ornados com motivos de quadrelas inspiradas nos modelos de Sebastiano Serlio; a sepultura simples que acolhe os restos mortais da Infanta D. Maria, filha de D. Manuel I; o retábulo maneirista de talha dourada com excelentes pinturas de Francisco Venegas e Diogo Teixeira; o conjunto de mármores embutidos que revestem a banqueta; pelo seu valor estético e iconográfico, os retábulos pintados sobre suporte de madeira representando a Circuncisão e a Fuga para o Egipto, e S. Bento dando a Regra aos frades de Cristo e às freiras da Encarnação; os baixos relevos renascentistas do altar-mor, representando figuras alegóricas; entre outros.

Igreja de Nossa Senhora da Luz,  altar-mor [1954]
Largo da Luz; Rua da Fonte; Travessa das Carmelitas
Mário Novais, in Lisboa de Antigamente

Encontram-se ainda, no corpo sul da igreja, vestígios de uma antiga capela, construída pela população em 1463/64, nomeadamente um arco manuelino e azulejos hispano-árabes.

Igreja de Nossa Senhora da Luz [1961]
Largo da Luz; Rua da Fonte; Travessa das Carmelitas
Augusto de Jesus Fernandes, in Lisboa de Antigamente

Sunday, 23 December 2018

Natal do Sinaleiro em Lisboa

O «Natal do Sinaleiro» foi uma iniciativa criada em Portugal pelo ACP antes da II Guerra Mundial. Retomada em 1949, esta acção solidária juntava populações e empresas que reconhecidas pelo papel dos polícias sinaleiros, no trânsito das cidades, lhes ofereciam os mais diversos produtos para festejarem melhor a época natalícia: garrafões de vinho, sacos de batatas, bacalhaus e, até, — como comprovam algumas fotografias da época — leitões vivos!? Tempos de Antigamente, sem dúvida.


Natal do Sinaleiro em Lisboa [1933]
Praça de D. Pedro IV (Rossio)
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Era, de profissão, polícia sinaleiro, mas não era um sinaleiro qualquer. Era o afamado «Sinaleiro Dançarino». Durante o dia, em cima de uma peanha vermelha e branca, orientava o trânsito automóvel entre o Largo das Duas Igrejas e a Praça Luís de Camões, com gestos tão elegantes como autoritários, tão delicados como firmes. De capacete alto, manguitos de cabedal até aos cotovelos, cassetete, bandoleira, cinto largo e luvas de algodão imaculadas, todos estes apetrechos tão brancos como giz resplandecendo sobre a farda azul escura, rígido como um autómato, gracioso como um bailarino, Lucas Dançarino exibia arte e poderio num ballet de admirável harmonia.
Braço direito levantado em frente, mão espalmada com rigidez; braço esquerdo esticado ao lado, com o comando alongado pelo cassetete; uma apitadela estridente. [...]

Natal do Sinaleiro em Lisboa [1934]
Rua Garrett, defronte dos armazéns do Chiado
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Um espanto de eficácia e beleza. Paravam basbaques para lhe admirarem a arte revelada pela categórica gesticulação, pelos delicados meneios, pela garbosa figura que dominava tudo e todos do alto do palanque às riscas.
A veneração era de tal ordem que, no Natal, chegava-se mesmo a ir depositar uma garrafa de aguardente galega aos pés da augusta figura do «Sinaleiro Dançarino».

Natal do Sinaleiro em Lisboa [1935]
Praça dos Restauradores esquina da Rua Jardim do Regedor
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
 

N.B. Segundo parece a farda dos polícias sinaleiros era azul, desde 1944, data da constituição deste corpo dedicado ao trânsito; mudou de azul para cinzenta em 1958.
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Bibliografia
DINIS, Orlando, A Vida não está para Netos, pp. 111-113, 2017.

PSP.pt.

Friday, 21 December 2018

A Lapa aristocrática: palacete do Dr. Alfredo Bensaúde

Vamos buscar pelo caminho natural essa outra Lapa — a Lapa aristocrática, segundo Norberto de Araújo — pelo feitio e pelo isolamento, de toda a outra Lisboa tumultuosa ou palradora das coisas que foram ou começam a ser. [...]
De uma parte diste sitio vadio — não se sabe por que sentença do Destino — entrou a desenhar-se num burgo abastado, senhor de si, atracção dos ingleses, do negócio, da burguesia, do dinheiro, da nobreza escorraçada do Oriente da cidade, afastada que foi, ou reduzida a uma expressão episódica, a população marítima que subia das margens do rio, pela vereda de Santos: eis a Lapa da distinção, no semblante e nos costumes, a tal ponto criadora de um tipo seu que hoje se costuma dizer de uma pessoa ou de uma família que blasona «tom». — «É muito bairo da Lapa». [...]

Palacete do Dr. Alfredo Bensaúde  [post. 1961]
Rua de São Caetano, 4; Rua do Arco do Chafariz das Terras, 1
 Mário Novais, in Lisboa de Antigamente

Para norte corre ligando as Ruas Ribeiro Sanches e de Buenos Aires, a típica Rua de São Caetano, muito «Lapa», a qual, se pegassem nela e a transpusessem para outro bairro de Lisboa, continuaria a afirmar, só pela presença: «eu sou Lapa». Nela, entre outros, se encontra, no n.º 6, o palacete do Dr. Alfredo Bensaúde [o primeiro director do Instituto Superior Técnico] dos raros que não são impenetráveis, e recheados de boa arte.

N.B. O projecto d0 imóveltambém conhecido como Edifício Sandoz data de 1907 e é do risco do arqº. Ventura Terra.

Palacete do Dr. Alfredo Bensaúde  [post. 1961]
Rua do Arco do Chafariz das Terras, 1; Rua de São Caetano, 4
 Mário Novais, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. VII, p. 42-52, 1938.
monumentos.gov.pt.

Wednesday, 19 December 2018

Terreiro do Paço: um secretário do povo

Na viragem do séc. XX, Portugal era um País esmagadoramente rural. Lisboa era o maior centro urbano, com uma população circa das 350.000 pessoas, maioritariamente analfabeta — três homens em cada quatro e seis mulheres em cada sete não sabiam ler nem escrever — proveniente das zonas rurais, que procurava emprego na grande cidade, mas que aqui vivia em condições infra-humanas, em casas insalubres, sobrelotadas, que necessitavam de “apoio social".

Praça do Comércio [1931]
Legenda no arquivo: «Terreiro do Paço: um secretário do povo escrevendo uma carta a uma rendeira analfabeta»
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Sunday, 16 December 2018

Monumento a Rosa Araújo

Na esquina do quarteirão onde está. a Sociedade de Belas Artes, enfrentando as Ruas Rosa Araújo e Mourinho da Silveira, foi colocado em [25 de Outubro] de 1936 um monumento, bem modesto por tal sinal, e ridiculamente situado, a José Gregório de Rosa Araújo, o criador da Avenida da Liberdade. O busto é em bronze (Costa Mota, sobrinho); sobre o soco, em pedestal, avulta em tamanho natural a figura de Lisboa coroada.

É tudo, Dilecto, quanto Rosa Araújo mereceu da edilidade!


Monumento a Rosa Araújo |1936|
Esquina das Ruas Rosa Araújo e Mouzinho da Silveira
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

A grande audácia da época — a abertura da Avenida da Liberdadeficou a dever-se ao génio perseverante e audaz de Rosa Araújo, o «Barão Haussmann Português», tendo a seu lado o engenheiro Miguel Pais.
Esse notável rasgo, partindo de 1879, com a demolição da Travessa do Salitre — e com ela a de um grande prédio onde estava a Fotografia Rocha, que, pelo seu elevado custo, tantos engulhos causou a Rosa Araújo — teve a sua culminância em 1882 quando aquele benemérito, enérgica e decididamente, lutando contra a opinião de grande parte da gente alfacinha — o próprio Júlio de Castilho o lamentou — resolveu mandar derrubar as grades que vedavam as entradas do Passeio Público. Foi esse acto inesquecível que permitiu ser a cidade dotada com a mais linda avenida que possuímos.
José Gregório da Rosa Araújo, filho do velho confeiteiro da Rua de S. Nicolau — o Có-có, fartamente caricaturado mas que não conseguiram ridicularizar, chegou a ocupar o alto cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Herdou de seu pai a honra, o título e a fortuna e pôs esta, bastas vezes, ao serviço da causa e da filantropia, morrendo pobre. O importe das primeiras obras, no valor de 22 contos, foi adiantado do seu bolso.
A Avenida da Liberdade — a que Rosa Araújo idealizou e em cuja obra pôs toda a esperança e paixão — viu passar o cortejo fúnebre desse insigne edil, um dos maiores e mais dedicados servidores da cidade de Lisboa, falecido em 26 de Janeiro de 1893, por entre alas compactas de povo, com os candeeiros acesos e envoltos em crepes.

Colocação do Monumento a Rosa Araújo |1945|
Avenida da Liberdade
Judah Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Finalmente, em Outubro de 1945, o busto de Rosa Araújo (1840-1893) foi colocado na Avenida da Liberdade, em frente da rua com o nome do antigo presidente do Município da capital.

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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, p. 41, 1939.

COSTA, Mário, Feiras e outros divertimentos populares de Lisboa, 1960.

Friday, 14 December 2018

Esquina das Ruas Luisa Todi e de D. Pedro V

Esta Rua de D. Pedro V — recorda-nos o olisipógrafo Norberto Araújo — designação do ano de 1885, era, antes, «dos Moinhos de Vento», o que bem dá nota da sua feição campesina e da sua situação ventosa. Já existia o Bairro Alto de S. Roque, e ainda esta estrada, sem desenho que não fosse o de pé posto, e que não fazia parte da herdade de Santa Catarina (origem do Bairro Alto) corria entre terras de semeadura. [...]
Esta ruazinha chamada de Luiza Todi, antiga Travessa da Estrela, nada tem que mereça a nossa atenção. Morou, e morreu aqui em 1833, a grande cantora Setubalense, em memória da qual uma vereação municipal, já neste século, após à rua o nome da artista. [...]

Esquina das Ruas Luisa Todi e de D. Pedro V |entre 1901-1908|
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Já agora observa-me esse alto prédio moderno de gaveto [ainda por erguer à data da foto] da Rua de Luíza Todi, propriedade de Manuel Madeira, começado a construir, sobre o terreno de um velho barracão em fins de 1935.
O barracão, a que várias vezes se tentou imprimir um certo aspecto decente, passando de madeira tijolo, mas sempre acanhado e desprovido de comodidades, foi animatógrafo popular durante três ou quatro anos, e depois serralharia, armazém de sucata, havendo servido também de atelier de pintura. Era uma relíquia teimosa da artéria nova, e que custou a entregar-se ao fatal destino da demolição.

Rua Luisa Todi e de D. Pedro V |entre 1901-1908|
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

N.B. Luísa Rosa de Aguiar Todi (Setúbal/9,01,1753-1833/Lisboa) foi uma cantora lírica que neste arruamento morou e aqui morreu, na casa com o antigo nº 2.
Estreou-se no Teatro do Bairro Alto em 1767 e casou em 28 de Julho de 1769 com Francisco Todi, natural de Nápoles, violinista na orquestra do mesmo teatro. Depois de muitos aplausos pelos palcos da Europa, cega completamente em 1822 e em Junho de 1833 é acometida de um insulto apoplético, pelo que faz o seu testamento e morre a 1 de Outubro desse ano, ficando sepultada na Igreja da Encarnação.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. V-VI, 1938.
cm-lisboa.pt

Wednesday, 12 December 2018

Teatro Luís de Camões (Belém-Clube)

Na calçada da Ajuda foi construído, a expensas de um commerciante de apellido Assucar, um theatrinho elegante e bem regular, que foi inaugurado a 10 de junho de 1880, a fim de festejar o tricentenario do grande epico. Tomou o theatro o nome de Luiz de Camões. O espectaculo de inauguração foi desempenhado pela companhia Soares.


É um teatrinho elegante que dispõe bem á primeira impressão — lê-se em Divagando: impressões de teatro — , amplo, com uma ordem de confortáveis camarotes, espaçosa plateia, transformável, sendo necessário, em sala de baile. Decorado com certo gosto a branco e ouro, vêem-se no tecto algumas figuras de mitológica alegoria artisticamente pintadas a óleo. Possui um palco desafogado e próprio para representações movimentadas e pena é que esteja situado tão longe do centro da cidade, o que nos privou de assistir ao final da récita. Representou-se a espirituosa comedia «Seguro de vida», do saudoso escritor Gervasio Lobato, e a «Arte de Montes», adaptação de Ernesto Rodrigues, que muito agradaram [...] Casa cheia, destacando-se, nos camarotes e plateia, algumas figuras femininas pela beleza física, artísticos penteados e lindas toilettes, cuja policromia dava à sala um tom alegre garrido. 

Uma notícia de um jornal referia que Joaquim Maria Nunes [comerciante do bairro da Ajuda e primeiro proprietário] vai construir em Belém «um elegante teatro com lotação para 1000 pessoas», que «tomará o nome de Luís de Camões e será inaugurado no dia 10 de Junho próximo». No frontão, os bustos de Camões, Garrett e Castilho. (O Comércio do Porto n.° 277, de 27/V1880)
Através de outra fonte, faz-se saber que será distribuído «no Teatro, a expensas do mesmo Sr. Nunes, um bodo a 55 pobres da freguesia de Santa Maria de Belém, número de anos que viveu Luís de Camões». (DN, n.° 5129, de 17/V18880)

Calçada da Ajuda, 76-80 |1937|
Teatro Luís de Camões (Belém Clube) vendo-se no frontão, os bustos de Camões, Garrett e Castilho. A fachada é de um revivalismo neo-clássico, e apresenta a ideia de um só piso.
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

O Belém-Clube é um “teatrinho” à italiana. De uma forma simplificada, pode dizer-se que o teatro à italiana se compõe por uma sala destinada aos espectadores, com os respectivos e diferenciados lugares, e a caixa de palco, ao fundo desta daquela. O teatro à italiana foi introduzido em Portugal no século XVIII, durante o reinado de D. João V e de D. José, período em que gosto pelo género lírico se tornara na moda europeia a seguir.
Pequeno teatro de gosto neoclássico tardio, inaugurado em 10 de Junho de 1880, por ocasião do tricentenário da morte do poeta. O projecto é da autoria do arquitecto(?) João da Cunha Açúcar. A partir de 1911 albergou o histórico Belém-Clube. Não existem muitas notícias sobre o que se passou após a inauguração do teatro, e até ao arrendamento à colectividade Belém Clube, em 1911, embora seja possível que não tenha tido o sucesso ou a rentabilidade desejada pela família Nunes.

Calçada da Ajuda, 76-80 |1964|
Ao centro, o antigo Teatro Luís de Camões (Belém Clube) inaugurado em 1880, quando do centenário camoniano. A entrada principal é iluminada por dois grandes lanternões. Junto à entrada, está um painel decorativo de azulejo com os seguintes dizeres: Belém Clube / Antigo Teatro Luiz de Camões / Fundado em 3-3-1889.
Augusto Fernandes, in Lisboa de Antigamente

Encerrado ao público pela Inspecção Geral de Actividades Culturais por razões de segurança, em 2012 foi aberto um concurso para arquitectos com experiência de teatros, caso de Manuel Graça Dias e Egas José Vieira, autores do projecto do actual Teatro de Almada, que foram escolhidos para conceber o projecto de reabilitação. Na fachada tudo se manterá como no projecto original. Nas pesquisas foi encontrada uma foto original que deixou perceber que o edifício era de cor mais escura, um vermelho escuro tijolo.

Calçada da Ajuda, 76-80 |1964|
Teatro Luís de Camões (Belém Clube) vendo-se no frontão, os bustos de Camões, Garrett e Castilho. Nas das duas portas laterais, está inscrita a data 10 de Junho de 188080, ena principal as iniciais J.M.N. nome do e  primeiro proprietário.
Augusto Fernandes, in Lisboa de Antigamente

Nota(s): Chama-se agora LU.CA e é um espaço pensado em exclusivo para as crianças e o público jovem. A inauguração aconteceu no dia 1 de Junho de 2017.
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Bibliografia
BASTOS, Sousa, Diccionario do theatro portuguez, 1908.
SILVA, Rolando da, Divagando: impressões de teatro, 1925.
CABRAL, Alexandre, Notas Oitocentistas, vol. I, 1980.
RIBEIRO, Mário de Sampayo, A Calçada da Ajuda, Lisboa, 1940.

Sunday, 9 December 2018

Chafariz de Belém (ou dos Golfinhos)

Ora vejamos o chafariz — recorda o ilustre Norberto de Araújo. É um exemplar interessante com seus dois planos ou peças independentes, realizando um conjunto decorativo neste Largo Frei Heitor Pinto, antigo Largo do Chafariz de Belém. No plano inferior (a Praça faz declive) assenta um tanque, em cujo espaldar se vê essa tradicional caravela, com a inscrição «Câmara Municipal de Lisboa. Ano de 1847»

Chafariz dos Belém (ou dos Golfinhos) |1939|
Antigo Largo do Chafariz, actual Largo dos Jerónimos; foi transferido para o Largo do Mastro c. 1947
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente
Chafariz dos Belém (ou dos Golfinhos)  |1939|
Antigo Largo do Chafariz, actual Largo dos Jerónimos; foi transferido para o Largo do Mastro c. 1947
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

No segundo plano alto eleva-se propriamente o Chafariz, com seu obelisco e uma simpática expressão arquitectónica decorativa, para o qual se aproveitaram lavores escultóricos destinados a um projectado chafariz para o Campo de Sant'Ana [que não se chegou a construir], nomeadamente quatro golfinhos, obra do escultor António Gomes. Êste Chafariz substitue o «da Bola» que estava em ruína em 1837, ao qual atrás aludi, e que havia sido construído em 1611; fôra começado a construir em 1846 e inaugurou-se em 4 de Abril de 1848, havendo a Câmara de Lisboa comprado, para abrir o Largo, umas casas que neste sítio — «Chão Salgado», mas já não proscrito — existiam de pé por essa época.

 Rua de Belém |1939|
À esquerda o chafariz de Belém e, mais adiante, no prédio com toldos junto ao poste de catenária, a fábrica dos  Pastéis de Belém
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente
Chafariz dos Belém (ou dos Golfinhos)
Desenho de Nogueira da Silv1830-1868), gravador Coelho

Segundo Velloso de Andrade, «os quatro Golfinhos, por onde corre a agua, estavam desde ha muito guardados em um telheiro a S. Pedro d' Alcântara, e alguém presume serem os tirados do Chafariz do Rocio; mas nós estamos persuadidos, que elles eram também pessas para o Chafariz do Campo de Santa Anna; 1.*, por que não davam idéa alguma de já terem servido; — 2.º por que na Planta do dito Chafariz , [...], também ali se vêem os mesmos Golfinhos.»
Em 1851, o chafariz n.º 23, tinha 4 bicas, 1 companhia de aguadeiros, 1 capataz e cabo, e 33 aguadeiros.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. IX, pp. 90-91, 1939.
ANDRADE, José Sérgio Velloso de, Memoria sobre chafarizes, bicas, fontes, e poços públicos de Lisboa, 1851.

Friday, 7 December 2018

Rua Antero de Quental

Nove anos após o suicídio do poeta Antero de Quental, a Câmara Municipal de Lisboa perpetuou-o na toponímia citadina (Edital de 08/06/1900), no arruamento que liga o Largo do Intendente com o Largo do Conde de Pombeiro, como Antero «do» Quental, designação que foi rectificada para «de» Quental em virtude de uma parecer da Comissão Municipal de Toponímia de 18 de Junho de 1948.

Rua Antero de Quental [1970]
Esquina com a Avenida Almirante Reis
João Goulart, in Lisboa de Antigamente

Antero Tarquíneo de Quental (1842–1891) foi uma personalidade que se notabilizou pelo seu envolvimento na agitação académica de Coimbra (de 1859 a 1864), enquanto estudante e presidente da organização secreta Sociedade do Raio; por suscitar a Questão Coimbrã em 1865; por ter formado o Cenáculo em Lisboa, em 1867, com outros como Eça de Queirós e Ramalho Ortigão; por passar a uma intervenção activa no movimento socialista após conhecer Oliveira Martins em 1869; por ter organizado as Conferências do Casino em 1871; por ter aceite a presidência da Liga Patriótica do Norte quando do Ultimato de 1890. Da sua obra, destacam-se os títulos de poesia Sonetos (1861), Odes Modernas (1865) e Raios de Extinta Luz (1892), uma obra em prosa reunida em 3 volumes publicados de 1923 a 1931 (Prosas) e nos quais se inclui o ensaio Tendências Gerais da Filosofia na Segunda Metade do Século XIX (1890). [cm-lisboa.pt]

Rua Antero de Quental [1905]
Machado & Sousa, in Lisboa de Antigamente

Wednesday, 5 December 2018

Avenida Almirante Reis com a Travessa do Cidadão João Gonçalves

João Gonçalves, merceeiro de profissão, contribuiu notavelmente para a causa da educação das classes operárias, ao subsidiar generosamente várias escolas primárias da capital.
Foi um fervoroso republicano, um notável orador, e envolveu-se com afinco na organização de associações de classe. Fundou os centros eleitorais republicanos dos Anjos e de S. Jorge de Arroios. Morreu pouco antes da implantação da república.

Avenida Almirante Reis com a Travessa do Cidadão João Gonçalves |Início séc. XX|
Troço da Rua Antero de Quental compreendido entre a Rua dos Anjos e a Avenida Almirante Reis
Estabelecimento União Metalúrgica
Alberto Carlos Lima, in Lisboa de Antigamente

João Gonçalves assinava todos os documentos comerciais como Cidadão João Gonçalves, daí resultando o topónimo.

Avenida Almirante Reis com a Travessa do Cidadão João Gonçalves |Início séc. XX|
Troço da Rua Antero de Quental compreendido entre a Rua dos Anjos e a Avenida Almirante Reis
Estabelecimento União Metalúrgica
Alberto Carlos Lima, in Lisboa de Antigamente

Sunday, 2 December 2018

«Queres jogar ao berlinde?»


Dois pequenos amigos jogam o berlinde, junto à valeta do passeio, de uma qualquer rua da cidade:
— Pòsso jogar? — perguntou ele.
— Tens «bilas»?
— Tenho os suficientes para te «limpar»!

Creio que de todos os jogos populares o mais clássico era o «Bolindre». Era assim que nós lhe chamávamos  na minha terra e não «berlinde». Havia-os de várias qualidades: de pedra, de vidro e ainda os que têm variantes de cores interiores, o que constituía suprema ambição dos rapazes. Jogava-se, bem entendido, como era hábito e não tinha nenhuma variante. No jogo do berlinde, com três poças era cada coquinada que até fervia... Então quando se misturavam bugalhos com berlindes de vidro e de metal... era um destempero...¹

Largo de Santo Estevão [c. 1930]
Ao fundo vê-se a antiga Cadeia do Limoeiro.
Ferreira da Cunha,
in Lisboa de Antigamente

Nota(s): BELINDRE, s. m. Bolinha de pedra ou vidro para jôgo de rapazes, o mesmo que BERLINDE.
ENCICL. Jôgo vulgar também conhecido por bute e que tem como finalidade fazer a própria bola percorrer duas vêzes um grupo de três pequenas covas abertas no chão a distâncias iguais e em linha recta, afastando para isso, dentro das regras do jôgo, as bolas dos adversários ou retendo-as em qualquer das covas que não seja aquela para que o contrário se dirige. O jôgo, que exige uma grande destreza e pontaria certeira na projecção da bola, oferece por vezes lances interessantes que põem à prova a habilidade dos jogadores.
No fim de cada partida o vencedor ganha a bola do contrário.
²

Calçada da Tapada com a Rua José Dias Coelho [1932]*
Legenda no arquivo:« Abertura do ano lectivo. Dois alunos que faltaram às aulas para jogar o berlinde.»
Fotógrafo não identificado, 
in Lisboa de Antigamente
* o local não está identificado no arquivo

Bibliografia
¹ Nominalia: Manteigas - a festa dos NOMES: toponímia, alcunhas, falas..., 2004.
² Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. 4, p. 481, 1983.
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