A ermida de Santo Amaro é um caso único: renascentista, com planta centrada, uma galilé decorada com belos panos de azulejos do Rato, portais de ferro arrendados com vista para o Tejo. O terreno da base termina em quilha, qual proa de navio pretendendo soltar-se da colina e navegar mar fora atrás dos mareantes que a fundaram, segundo a lenda iconografada num dos painéis de azulejo. Historicamente sabe-se que em 1542 já existia uma ermida da Ordem de Cristo, que pagava foro à Basílica de S. João de Latrão, em Roma.¹
Reza a lenda que uma capela foi fundada no Alto de Santo Amaro por alguns frades da Ordem de Cristo que, no regresso de Roma (no século XVI), apanharam temporal no mar e, perante o receio de perecerem no naufrágio, prometeram a Santo Amaro levantar uma ermida no local onde dessem à costa, sãos e salvos. A capela referida na lenda foi, ao que se julga, transformada em sacristia da actual ermida, representativa do estilo renascentista, embora incorpore soluções estruturais góticas.³
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Ermida de Santo Amaro, datada de 1549 Vista de Santo Amaro e Perspectiva do Lugar de Belém Vue du Port &de l'Eglise de Bellem [Mosteiro dos Jerónimos.]& de celle de S.Amat, Les Delices De l'Espagne & du Portugal, 1707 COLMENAR, Juan Alvarez de; Aa, Pieter van der (1659-1733)
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Implantada numa colina sobranceira ao Rio Tejo, perto do vale de
Alcântara, a Capela de Santo Amaro foi edificada em 1549, conforme
indica a inscrição colocada sobre a porta principal do templo. O
projecto desta ermida de planta centralizada, única na cidade de Lisboa,
é atribuído a Diogo de Torralva, um dos grandes arquitectos do século XVI português, que
tão bem explorou e entendeu o novo gosto do Maneirismo, nomeadamente as
vias da tratadística italiana da época.
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Capela de Santo Amaro, Alto de Santo Amaro, traseiras [entre 1962 e 1966]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro
Ao fundo nota-se a Ponte 25 de Abril em construção. Artur Inácio Bastos, in Lisboa de Antigamente |
Na verdade, a Capela de Santo Amaro
destaca-se pela singular, e erudita, estrutura centralizada, composta
por "(...) dois cilindros secantes de inspiração serliana, a que se
agrega uma original galilé de planta semicircular (...)" (CORREIA,
1991). Espaço ímpar no panorama arquitectónico português, este templo
terá sido inspirado numa gravura do tratadista Sebastiano Serlio, que
representa o mausoléu dos Crescenzi, na Via Appia, em Roma (MOREIRA,
1995, p. 352).
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Capela de Santo Amaro, Alto de Santo Amaro, fachada [ant. 190-]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro Paulo Guedes,in Lisboa de Antigamente |
A par com a capelinha de Bom Jesus de Valverde, em
Évora, e a capela do Paço de Salvaterra de Magos, é um dos poucos
espaços religiosos quinhentistas a explorar a planta centralizada, que
voltará ao panorama arquitectónico português apenas na segunda metade da
centúria seguinte.
O núcleo da estrutura é o espaço circular do
oratório, envolvido em metade da sua área pela galilé semicircular, que
compõe a fachada, à qual corresponde, do lado oposto, a pequena
capela-mor, também cilíndrica.
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Portal de pedra no adro da Capela de Santo Amaro [ant. 1966]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro Artur Inácio Bastos,in Lisboa de Antigamente |
Aberta por uma arcada de cinco vãos,
dois dos quais são cegos, a galilé é coberta por abóbada de nervuras
abatida, com fechos decorados com símbolos alusivos ao santo padroeiro,
cruzes de Cristo, florões e estrelas. Os três arcos principais foram
fechados, no século XVIII, com portões de ferro forjado.
As paredes
deste espaço estão totalmente revestidas por azulejos polícromos
tardo-maneiristas, organizados em dois registos, cujas figurações
centrais, alusivas a Santo Amaro, são envoltas por ferroneries, putti, motivos de grutesco e pendurados. Nos vãos cegos da arcada foram erigidos dois altares de estrutura maneirista, em trompe l'oeil, executados em azulejo policromo.
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Escadinhas e Cruzeiro de Santo Amaro [c. 1940]
Portal de pedra no adro da Ermida de Santo Amaro Fernando Martinez Pozal,in Lisboa de Antigamente |
O
acesso ao interior é feito através de três portas, abertas na galilé,
estando gravada sobre a porta principal uma inscrição alusiva à data de
fundação da capela. A nave circular é coberta por cúpula semi-esférica
com lanternim, possuindo coro-alto, ao qual se acede pelo terraço. Um
arco de volta perfeita, sem qualquer decoração, abre para a capela-mor,
também coberta por cúpula semi-esférica, que ao centro alberga retábulo
de talha azul e dourada em estilo nacional. Contígua à capela-mor foi
construída a sacristia.
Celebrada a 15 de Janeiro, a
romaria de Santo Amaro era uma das mais concorridas da cidade, tendo sido realizada pela
última vez em 1911. Com o advento da República, a ermida foi abandonada
e saqueada, chegando a servir de carvoaria. Em 1927 foi entregue à
Irmandade do Santíssimo Sacramento, e no ano seguinte o espaço foi
reabilitado para o culto.
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Cruzeiro de Santo Amaro [s.d.] Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
Bibliografia
¹ ADRAGÃO, José Victor; PINTO (Natália); RASQUILHO, Rui, Lisboa, 1985.
³ Bonneville, Maria do Rosário Santos, Bellem/Belém, Reguengo da Cidade, 1991
³ "IGESPAR)