Sunday, 28 May 2023

Rua Bartolomeu de Gusmão: o Paço de D. Leonor

E já agora, duas palavrinhas acerca do Paço de D. Leonor, de Santo Elói ou S. Bartolomeu (pois não houve senão lindos Lolós um com duas designações locais). A solução do problema da sua localização — adianta Norberto de Araújo — deu-a o historiador Anselmo Braamcamp Freire, em termos irremissíveis, e ante uma argumentação documentada. Assentava no extremo deste Largo dos Lóios, num triângulo contido pelas antigas e desaparecidas Rua da Amargura, Rua de Jerusalém (que corria ao meio longitudinal do actual Largo) e Adro de S. Bartolomeu. Isto é: a ponta extrema do Paço ou Casas entrava pela actual Rua Bartolomeu de Gusmão (até há pouco de S. Bartolomeu), e que é esta que aqui corre subindo para o Castelo, correspondendo sensivelmente a setecentista Rua Direita das Portas da Alfofa.
Do Paço da Rainha, mulher de D. João II, [o Príncipe Perfeito], a excelsa fundadora das Misericórdias, residência que teve larga história realenga, tocada de certa poesia e envolta em relativa grandeza, que não ostentação  — nada existe.

Rua de São Bartolomeu, actual Bartolomeu de Gusmão |1903|
«Inventor dos Aeróstatos 1675–1724» (legenda de 1911)
Os Paços de D. Leonor eram situados, pouco mais ou menos, no local onde hoje assenta o prédio aqui se vê e que da Rua Bartolomeu de Gusmão esquina para o Largo dos Lóios
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

A Rua de São Bartolomeu passou pelo Edital de 13 de Dezembro de 1911 a denominar-se Rua Bartolomeu de Gusmão, com a legenda «Inventor dos Aeróstatos 1675–1724», em homenagem ao criador da Passarola Voadora, embora mais de 40 anos depois a legenda tenha passado a «Precursor da Aeronáutica 1675–1724» de acordo com o parecer da Comissão Municipal de Toponímia de 24 de Julho de 1958.
Este arruamento homenageia Bartolomeu Lourenço de Gusmão (1685–1724), filho dum modesto cirurgião-mor de presídio, Francisco Lourenço, e de sua mulher, Maria Álvares.
Nascido em Santos, S. Paulo, no Brasil, fez estudos no Seminário jesuíta de Belém, na freguesia de Cachoeira, Capitania da Baía, onde se ordenou. Desde muito cedo se interessou pelo estudo da Física, tendo concebido uma máquina de elevação de água a 100 metros de altura, no Seminário de Belém. Em 1701 veio para Portugal. 

Rua de São Bartolomeu |1903|
«Inventor dos Aeróstatos 1675–1724»
Em 1911, este arruamento passou a denominar-se Bartolomeu de Gusmão (com a legenda acima), antes Direita das Portas da Alfofa.
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Quando se matriculou na Faculdade de Cânones de Coimbra, em 1 de Dezembro de 1708, com o nome de Bartolomeu Lourenço, já como sacerdote, desconhecia-se, ainda, a célebre figura em que se tornaria, no ano seguinte, devido ao prodigioso invento de um aeróstato, recebendo, por isso, o epíteto de “padre voador”. Era o primeiro balão de papel que se ergueria no ar, sem fazer grande voo, tendo recebido do Rei D. João V a exclusividade da construção de “máquinas voadoras”. A primeira apresentação pública, feita em Lisboa, no Palácio Real, não teve sucesso e o balão ardeu, sem ter feito qualquer voo. Só numa segunda tentativa, em 8 de Agosto de 1709, se ergueu no ar, em voo de 4 metros de altura. A ”passarola voadora”, de que se conhecem diversos desenhos e gravuras, não seria mais do que um projecto que o engenhoso inventor nunca chegou a construir.

Rua Bartolomeu de Gusmão |1949|
Precursor da Aeronáutica [1685-1724] (legenda de 195-)
Antiga de São Bartolomeu antes Direita das Portas da Alfofa.
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Durante a segunda metade do século XVIII difundiu-se a ideia de que o próprio Bartolomeu de Gusmão teria efectuado um voo num aeróstato por ele construído, entre o Castelo de S. Jorge e o Terreiro do Paço, mas trata-se de uma lenda, não há documentos que registem esse acontecimento e as suas experiências teriam avivado a imaginação popular a tal ponto que ele seria alvo de chacota.
____________________________________________
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. II, pp. 65-66, 1938.
Olisipo : boletim do Grupo "Amigos de Lisboa", 1948.

Friday, 26 May 2023

Avenida da República, 50

Na esquina com a Avenida Barbosa du Bocage, um palacete do início do século XX, demolido em 1970.

As «Avenidas Novas» surgem no início deste século como resultado dos trabalhos e projectos do engenheiro Ressano Garcia e organizam-se em volta duma grande artéria chamada então «Avenida das Picoas». Esta ligava-se à Rotunda [actual Pç. Duque de Saldanha] pela Avenida do Campo Grande (mais tarde, de Fontes Pereira de Melo). [...] Para as suas avenidas (a das Picoas havia de se chamar Ressano Garcia e, só mais tarde, da República), o engenheiro camarário tinha previsto tudo, desde os passeios aos esgotos, passando pelo tipo de árvores que as ornamentariam. Todo este espaço era destinado a classes abastadas dentro da burguesia lisboeta e a rapidez da sua execução permitiu que um certo equilíbrio de formas fosse alcançado.

Avenida da República, |196-|
Antiga de Ressano Garcia, antes Avenida das Picoas
Do lado direito, na esquina da Avenida Barbosa du Bocage, um palacete do início do século XX, demolido em 1970.
Artur Inácio Bastos, in Lisboa de Antigamente

Nas Avenidas Novas nasceu a Rua Barbosa du Bocage, por Edital de 11/12/1902, na via pública entre as Avenidas Marquês de Tomar e Rua do Arco do Cego. Passados quase 23 anos, o Edital de 08/06/1925 mudou a classificação da artéria para Avenida.
José Vicente Barbosa Du Bocage, (1823-1907) Maçon. Bacharel formado em medicina pela Universidade de Coimbra, lente de zoologia na Escola Politécnica, do conselho de Sua Majestade, ministro de Estado, deputado, par do Reino, um dos fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa, sócio da Academia Real das Ciências, da Sociedade de Zoologia de Londres. 
Era primo em segundo grau do popular poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage.

Avenida da República, 50 |1970|
Antiga de Ressano Garcia, antes Avenida das Picoas
Palacete já demolido que tornejava para a Avenida Barbosa du Bocage
Nuno Barros Roque da Silveira, in Lisboa de Antigamente
Nota(s): Infelizmente a imagem é de baixa qualidade/resolução, graças ao paupérrimo trabalho de digitalização efectuado pelo Arquivo Municipal de Lisboa (AML).

Sunday, 21 May 2023

Rua Marquês de Fronteira que foi Estr. da Circunvalação

Por decreto de Setembro de 1852 a cidade passaria a ser circundada por muro alto e contínuo, feito propositadamente, até junto ao rio, tendo por únicas passagens, portões de ferro. Chamava-se Estr. de Circunvalação e para efeitos aduaneiros estava guardada pela Guarda Fiscal.
A estrada passava pelo Arco do Carvalhão (Arco pertencente às Aguas Livres) Rua D. Carlos de Mascarenhas — Rua Marquês de Fronteira — actual Avenida Duque de Ávila — Rua Visconde de Santarém — Largo do Leão — Rua Carrilho — Rua Morais Soares — Alto de S. João — Avenida Afonso III (sendo novo o último troço, evitando-se a Calçada das Lajes) Xabregas.

Rua Marquês de Fronteira |1927|
Antiga Estrada da Circunvalação
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
Legenda da foto no arquivo: «O carro celular com o preso (José Júlio da Costa), a caminho da Penitenciária de Lisboa»

A artéria perpetua a memória de D. José Trazimundo Mascarenhas Barreto (180 –1881), 8º conde da Torre, 5º marquês de Alorna e 7º marquês da Fronteira. Após a Vilafrancada viveu exilado para depois fazer toda a campanha das lutas liberais, tendo-se reformado no posto de marechal-de-campo. Foi também governador civil de Lisboa (1846-1851), par do reino e deixou 5 volumes das suas «Memórias do Marquês da Fronteira e Alorna».

Eléctricos na Rua Marquês de Fronteira |1960|
Dístico de 1903. Paragem junto a Rua de Campolide.
Arnaldo Madureira, in Lisboa de Antigamente

Friday, 19 May 2023

Avenida da Torre de Belém

Torre de S. Vicente de Belém (é este o verdadeiro nome da Torre de Belém), em Lisboa, foi construída no século XVI e tornou-se muito importante na época das Descobertas.
Tudo começou em 1515 quando o rei D. Manuel decide mandar construir uma torre no local onde antes o seu antecessor, o rei D. João II, pensara construir um forte para defesa do porto da zona de Belém e da barra do Tejo. As obras de construção, mesmo na zona ribeirinha de Belém, começaram logo em 1515, mas só em 1519 ou 1521, é que acabaram.
Em 1983 a Torre de Belém foi classificada pela UNESCO como «Património Cultural de Toda a Humanidade».

Avenida da Torre de Belém |1966|
Antiga Avenida «C-D» da Encosta da Ajuda (até 1945) 
Augusto Fernandes, in Lisboa de Antigamente

Situada frente à histórica praia do Restelo, a Torre de Belém (Castelo de Sam Vicente a-par-de Belem), inicialmente fazendo parte do sistema defensivo do estuário do Tejo — em que se integravam o baluarte de São Sebastião de Caparica, mais tarde conhecido por Torre Velha e Castelo de Porto Brandão, e o forte de Cascais, mandados construir pelo rei D. João II — ergue a sua formosíssima silhueta, oferecendo, quer olhada da banda do rio, quer do lado de terra, a visão de um dos mais belos e originais monumentos portugueses.

Sunday, 14 May 2023

Panorâmica de Lisboa tomada do Jardim de S. Pedro de Alcântara

Para lá do vale da Baixa, a colina de S. Pedro de Alcântara, «varanda do Bairro Alto», «janela de Lisboa aberta sobre Lisboa». «Grande panorama», diz-nos Norberto de Araújo, e exclama também o conselheiro Acácio. O conselheiro e Luiza «foram encostar-se às grades» e, «através dos varões, viam, descendo n'um declive, telhados escuros, intervalos de pátios, cantos de muro com uma ou outra magra verdura de quintal ressequido [...]»
Varanda dos amores românticos — prossegue o autor das Legendas—  do tempo em que era alameda — S. Pedro de Alcântara é um dos mais ternos miradouros naturais da cidade. [...]
Para nascente e sul, o Castelo, recortado sobre a peanha pintalgada da cidade velha; as torres alvíssimas de S. Vicente espreitando da linha do horizonte, acima do casario; a Graça, generosa, entregando-se toda; S. Gens, minúsculo, pousado no outeiro que cai sobra as Olarias; a , flanqueada de torres, morena, muito severa...

Panorâmica de Lisboa tomada do Jardim de S. Pedro de Alcântara
Fotografia anónima s.d., ant. a 1887

São identificáveis na fotografia (ant. a 1887): logo abaixo do gradeamento — proveniente em parte do Palácio da Inquisição (ou dos Estaus) no Rossio — o tabuleiro inferior do Jardim e miradouro de S. Pedro de Alcântara (com os bustos dos notáveis de Portugal); na extrema esquerda baixa, observa-se o Palácio dos Castello-Melhor, hoje Palácio Foz, e a antiga torre sineira da capela de N. S. da Pureza (demolida em 1902 após incêndio no palácio) virada à Calçada da Glória; acima, o Monumento dos Restauradores, em construção e com os andaimes ainda montados; para nascente do monumento ainda são visíveis os portões e a cerca do antigo Passeio Público (poente) (demolido c. 1885); no recanto ocidental dos Restauradores, onde hoje se encontra a Estação do Rossio (1890) e o Éden (1914), vê-se a cúpula do antigo Circo Whyttoyne, erguido em 1875 e demolido em 1887
Acima do obelisco vê-se o Palacete Anjos (hoje CTT), atrás deste nota-se a torre sineira da Igreja dos Franceses e acima desta a Cerca do Convento da Encarnação na Calçada de Sant'Ana e, à esquerda deste, o ingreme Beco de São Luís da Pena; em último plano, o Convento da Graça e as torres de S. Vicente de Fora e, ao centro o Castelo de S. Jorge e à direita a Sé de Lisboa.
_____________________________________________________
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Legendas de Lisboa, p. 114.
QUEIROZ, Eça de, O Primo Basílio, 1878.

Friday, 12 May 2023

Rua de São Tomé, 9-23

Este sítio de São Tomé deriva seu nome de uma Igreja Paroquial que existiu exactamente aqui. O povo chamava ao local “São Tomé do Penedo” por aqui ter havido uma penedia. A paroquial datava — recorda o ilustre Norberto de Araújo — , pelo menos, do princípio do século XIV e foi demolida em 1839.⁼⁼
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. II, pp. 72-73, 1938)

Rua de São Tomé, 9-23| 1908|
Antiga do Infante D. Henrique (até 1948). Deriva daquela circunstância o ter-se dado o nome
do filho de D. João I a esta artéria do velho S. Tomé.

Nota(s): Neste edifício está instalado, actualmente, o restaurante "Frei Papinhas".
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Sunday, 7 May 2023

Jardim de Campo de Ourique (da Parada ou Teófilo Braga): biblioteca municipal ao ar livre

O Jardim de Campo de Ourique, no encontro da Rua de Infantaria 16 com as de 4 de Infantaria e Tomás da Anunciação, é recente, posterior alguns anos ao começo da urbanização. Ali tens, no centro do  Jardim, — recorda o autor das Peregrinações —  uma escultura, em pedra, que representa a figura popular da Maria da Fonte [vd. 3ª imagem]; é obra de Costa Mota, tio, e foi inaugurada em 1920. O jardinzito é simpático — única mancha de vegetação em todo o Campo de Ourique, velho e novo.

Jardim de Campo de Ourique (da Parada ou Teófilo Braga) |1959|
Biblioteca municipal ao ar livre e sequóia —  árvore classificada.
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

As bibliotecas ao ar livre sem chaves ou cadeados com livros constantemente disponíveis à comunidade, eram, para a população que vivia e trabalhava na cidade, um recurso fundamental para a criação de hábitos de leitura, para o desenvolvimento harmonioso de crianças e jovens, para a aquisição de competências de leitura e utilização de informação indispensáveis ao exercício da cidadania e para um conhecimento mais amplo da nossa e de outras culturas.

Jardim de Campo de Ourique, fotógrafo “à la minute” |1948|
Por ter sido o antigo terreiro da parada do quartel, começou por se chamar Jardim da Parada, mas todos o conhecem simplesmente como o Jardim de Campo de Ourique, já que não há outro. Tem parque infantil, belas árvores — uma sequóia e um cipreste-dos-pântanos — inúmeros pombos incrivelmente mansos e dois lagos e uma fonte-cascata.
Martinez Pozal, in Lisboa de Antigamente

N.B. Teófilo Braga (1843-1924). Fundador do Partido Republicano, foi nomeado presidente da República por via constitucional em 1915. É conhecido pela grande variedade de actividades e pela riqueza prolífica da sua obra, que constitui uma abordagem pioneira na História da Literatura portuguesa. Em consequência da morte da mulher e de todos os filhos, retira-se para uma vida solitária, após o fim da presidência.

Jardim de Campo de Ourique, monumento a Maria da Fonte |1920|
Em Setembro de 1920, Teófilo Braga preside à inauguração da estátua de Maria da Fonte, da autoria de Costa Mota, (tio). A heroína popular que deu o nome ao jardim, representa «uma mulher como as mais», gadanha ao ombro, braço erguido de revolta, expressão exaltada, «pistola à cinta» — toda em pedra , que é uma maneira de não fazer mal a ninguém e de se aproximar da eternidade.
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XI, p. 74, 1939.
ADRAGÃO, José Victor, PINTO, Natália & RASQUILHO, Rui, Lisboa. 1985.

Friday, 5 May 2023

Rua Ferreira Borges com a Rua de Campo de Ourique

Arruamento construído no prolongamento da Rua D. João V, situado entre a Rua Silva Carvalho e a Avenida Engº Duarte Pacheco. Também designado por sua Rua A da urbanização das Amoreiras e antiga Rua dos Pousos (1859).
Aquele que no seu Panfleto Mágico ousou avisar «É proibida a entrada a quem não andar espantado de existir» – o escritor José Gomes Ferreira — , desde o próprio ano da sua morte que está perpetuado na artéria de Campo de Ourique que liga a Rua Joshua Benoliel à Avenida Engº Duarte Pacheco.

Rua Ferreira Borges com a Rua de Campo de Ourique |1966|
A esq., a Rua José Gomes Ferreira (Poeta 1900-1985) e, acima, o Liceu Francês Charles Lepierre (1952). À sua direita, a Estação da Carris, demolida em 1981 para dar lugar ao Complexo das Amoreiras, inaugurado em 1985. Em frente, os terrenos e reservatório da EPAL.
Garcia Nunes, in Lisboa de Antigamente

Web Analytics