O moço de fretes ou moço de esquina, como também era conhecido, foi uma instituição de Lisboa. Normalmente eram homens oriundos da Galiza, embora entre eles se contassem muitos elementos das nossas Beiras. Gente pacífica, honrada e mansa no tracto, a esses homens podia entregar-se, utilizando os seus serviços, uma carta confidencial que, pressurosos, iam levar ao seu destino; valores ao penhor, de gente de bom-tom que se escondia; transporte de mobílias e outros carregos e até puxar as pequenas bombas de incêndio pelas ruas estreitas dos bairros populares.
Profissões de antanho: o moço de fretes |1912| Largo do Chiado, esquina com a Rua Nova da Trindade Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente |
Todavia, a sua maior actividade era transportar mobílias, de casa para casa, nas mudanças que os lisboetas então faziam com frequência, porque havia casas para alugar! Era vulgar ver-se escritos nas janelas, sinal de que as casas estavam devolutas, e os alfacinhas, sobretudo as senhoras, adoravam mudar de domicílio. Bons tempos!
Profissões de antanho: o moço de fretes |1907| Calçada do Combro Joshua Benoliel, iin Lisboa de Antigamente |
Os moços de fretes, os galegos como eram conhecidos, encarregavam-se desses serviços, desarmando em casa os móveis e acomodando-os nas padiolas, amarrados com boas cordas. Depois de tudo empoleirado, dois ou quatro homens, consoante o volume e o peso, a passo certo, cadenciado, mas alternado, seguiam com a tralha para a nova residência onde rearmavam tudo com muito cuidado, no que eram mestres. Só que quando algo se partia, logo tinha justificação: — Tenha paxiêrixia, acontexe!...
Profissões de antanho: o moço de fretes |1908| Rua Rodrigo da Fonseca com a Rua Barata Salgueiro Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente |
Profissões de antanho: o moço de fretes |entre 1908 e 1914| Calçada do Carmo Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente |
Era curiosa a forma como se auxiliavam no transporte com a padiola: dois à frente e dois atrás, com um grosso pau de carga que eles suportavam aos ombros, adoçando o incómodo com chinguiços — pequenas almofadas em forma de ferradura que ajustavam ao pescoço — e assim aguentavam o peso bem equilibrado.
Profissões de antanho: o moço de fretes |1910| Rua do Comércio com a Rua dos Fanqueiros Joshua Benoliel,in Lisboa de Antigamente |
Profissões de antanho: o moço de fretes |c. 1930| Rua de São Lázaro Ferreira da Cunha, in Lisboa de Antigamente |
Os moços de fretes ou de esquina agrupavam-se em vários locais da cidade nas praças principais, como o como o Rossio, Terreiro do Paço, Chiado, Graça, Alcântara e outros, e também pelas esquinas das ruas, onde eram procurados para ajustar os serviços que deles se pretendia
É de salientar um serviço que era sempre muito bem pago porque obrigava a discrição: levar cartas confidenciais, naquele tempo em que ter telefone era um luxo!
— Leva esta carta e entrega-a só à própria. Entendido?
— Xagrado! — respondia o Xoaquim.
E pelo serviço cauteloso pagava-se cinco tostões de boa prata!
Profissões de antanho: o moço de fretes |1908| Largo do Chiado: A Ilha dos Galegos Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente |
Profissões de antanho: o moço de fretes |post. 1902| Rua do Arco do Marquês de Alegrete, Palácio do Marquês de Alegrete (Martim Moniz) José A. Bárcia, in Lisboa de Antigamente |
É de salientar um serviço que era sempre muito bem pago porque obrigava a discrição: levar cartas confidenciais, naquele tempo em que ter telefone era um luxo!
— Leva esta carta e entrega-a só à própria. Entendido?
— Xagrado! — respondia o Xoaquim.
E pelo serviço cauteloso pagava-se cinco tostões de boa prata!
Profissões de antanho: o moço de fretes |190-| Largo de São Domingos Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente |
Bibliografia
DINIS, Calderon , Tipos e Factos da Lisboa do meu tempo (1900-1974), p. 216.
Cinco Estrelas !
ReplyDeleteGrato pelo apreço.
DeleteAdorei.
ReplyDeleteMaravilhoso artigo.
ReplyDeleteMuito esclarecedor. Obrigada.
ReplyDeleteCHEGUEI A ESTE ARTIGO DEVIDO AO POEMA DE ALVARO DE CAMPOS (PESSOA) - POEMA EM LINHA RETA...................NÃO ENTENDIA A FRASE...........MOÇOS DE FRETES.......
ReplyDeleteACHEI O ARTIGO.............FANTÁSTICO........sou brasileiro, neto de portuguêses, e adoro LISBOA........e por não dizer, Portugal, todo.........desde Guimarães.........
FANTASTICO!!!!
Muito esclarecedor! Agora o poema de F. Pessoa ficou claro. Parabéns!
ReplyDeleteSou de Lisboa, nasci em 1953 e lembro-me perfeitamente dos moços de fretes.
ReplyDeleteBom artigo, lindas fotos.
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