Sunday, 10 March 2024

Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club

Dois dos clubes em foco, o Magestic, entre 1917 e 1920, e depois o Monumental, até 1928, ocupam o edifício do Palácio Alverca, também conhecido por Palácio de São Luís ou Palácio Paes do Amaral, situado na via hoje identificada por Rua das Portas de Santo Antão. [...]

A construção da mansão da família Paes de Amaral, viscondes de Alverca, é datada, por diferentes olisipógrafos, dos finais do século XVII. Desconhece-se, no entanto, uma data precisa ou fontes que comprovem esta datação. A fundamentar esta hipótese são evocados alguns elementos arquitectónicos presentes no edifício, anteriores à transformação do Palácio Alverca em 1917-1919. O edifício terá sido erguido, após o terramoto, no espaço liberto das muralhas [Cerca Fernandina] da cidade e sobre parte das suas ruínas.

Palácio Alverca |1968|
Casa do Alentejo desde 1932. Rua das Portas de Santo Antão
Armando Serôdio ,in Lisboa de Antigamente

Segundo o olisipógrafo Luís Pastor de Macedo, no local onde foi erguido o Palácio, e onde funciona depois o Magestic Club e, posteriormente, o Monumental Club, existira antes um curral de porcos:
«No chão onde esteve o curral dos porcos, edificou-se, muitos anos depois, o palácio de Miguel Pais do Amaral, no qual, já nos nossos dias, esteve o clube mais chique de Lisboa – O Monumental. Quem pensaria então, naquelas noites lilases ou azuis, com tangos rosas ou verdes, que ali, no mesmo sítio, também já tinham chafurdado porcos? [...]
Entre 1917 e 1919, o Palácio Alverca é objecto de uma profunda intervenção, a fim de acolher o Magestic Club. No processo de obras salienta-se que nos trabalhos serão utilizados unicamente materiais de «primeira qualidade» e que todas as obras seriam «executadas conforme preceitos técnicos de construção e com os cuidados e fiscalização que a importância das obras do club reclamam». [...]

Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
Rua das Portas de Santo Antão
Pátio estilo neo-árabe risco do arquitecto Silva Júnior (1918)  e escadaria.
Naturalmente em «pastiche», transpira certa frescura mourisca, mesmo nas varandas, escadaria e galerias. [Araújo: 1939]
Fotografia: Casa do Alentejo 

Segundo a descrição feita na época pela revista A Arquitectura Portuguesa, que pela grandiosidade da obra lhe dedica dois números seguidos, o projecto da Sociedade do Magestic Club não tinha como objectivo único ganhar fortuna: era antes uma empresa com fins patrióticos, que ambicionava abrir, em local apropriado, um «club de primeira ordem, para ser apresentado pela primeira sociedade e onde, os estrangeiros que visitassem o nosso país, pudessem ser condigna e luxuosamente recebidos».
A revista descreve ainda a «grandiosa escadaria» que uma porta vulgar não deixa adivinhar, a sala de bilhar, a «sala de Bridge e outros jogos de vaza», o bengaleiro, o vestiário de homens e senhoras, as casas de banho, o Toilette das senhoras em estilo Luís XV, a barbearia e o gabinete do director, mencionando ainda sete gabinetes reservados ainda não concluídos na altura da publicação do artigo. É de referir a menção ao cuidado sistemático para que toda a decoração e mobiliário destes espaços estejam de acordo com a decoração e o estilo arquitectónico adoptado.

Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
Rua das Portas de Santo Antão
Salão dos espelhos em estilo neo-barroco (Salão de Baile e Restaurante).
A. sala de baile é toda decorada no tecto e nas paredes por Bemvindo Ceia, e outra sala contigua apresenta pinturas de Domingos Costa. [Araújo: 1939]
Fotografia: Casa do Alentejo 
Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
Rua das Portas de Santo Antão
Sala de Bridge e outros jogos de vaza com pinturas de Domingos Costa
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Fotografia: Casa do Alentejo 
Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
Rua das Portas de Santo Antão, 44-60
Pormenor  de uma das pinturas de Domingos Costa que cobrem as paredes da Sala de Bridge e outros jogos de cartas.
Fotografia: Casa do Alentejo 

O Monumental procura manter essa imagem de exclusividade, luxo, elegância e respeitabilidade sendo, nos anos seguintes, palco de diversos almoços e banquetes, alguns dos quais verdadeiramente luxuosos. Contudo, tal não impede a sua associação ao jogo e a outras actividades consideradas por alguns como imorais. A 24 de Novembro de 1928, um correspondente em Lisboa do jornal O Provir de Beja dá notícia de um fogo ocorrido no clube em meados desse mês, comentando que a Natureza, indignada com as imoralidades ali praticadas, se revoltou e «pegou fogo ao antro».
Em 1928 o clube é encerrado pelas autoridades, em consequência das medidas legislativas tomadas pelo Estado Novo para a repressão do jogo. O edifício mantém-se fechado nos quatro anos seguintes, na esperança de poder voltar a explorar o negócio dos jogos de azar. Em 1932, confrontados com a impossibilidade desta hipótese, os proprietários do Monumental Club procuraram transaccionar com o Grémio Alentejano todos os direitos que possuíam sobre o imóvel, bem como o recheio de que são donos.

Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
Rua das Portas de Santo Antão, 44-60
Sala de Bilhar decorado com azulejos de Jorge Colaço.
São de ver-se outras salas, tais as de <estar», «de fumo», de jogos de vasa, com magníficas decorações em azulejos de Jorge Colaço (1918), uma delas dando, a azul, cenas dos «Lusíadas», outra, em pintura policroma, reproduzindo quadros de romaria e feiras de todo o país, outro ainda figurando em grandes painéis caçadas aos javalis, uma da çaçada real do século xv, uma cena medieval de perseguição de touros a rojão[Araújo: 1939]
Fotografia: Casa do Alentejo

Nota(s): A agora denominada Casa do Alentejo ainda hoje tem sede neste palácio e no interior do edifício continuamos a poder ver o trabalho de remodelação que aí foi realizado.
Mais imagens aqui.




Palácio Alverca: O Magestic Club e o Monumental Club |c. 1930|
A barbearia (esq.) e o bar com painel da autoria de José Ferreira Bazaliza (dir.).
Fotografia: Casa do Alentejo







Bibliografia
 VAZ, Cecília Santos, Clubes nocturnos modernos em Lisboa: sociabilidade, diversão e transgressão (1917-1927.
ARAÚJO, Norberto de,, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, p. 105.

4 comments:

  1. Carlos Videirinha10 March 2024 at 20:10

    Além das fotos serem maravilhosas a informação é completíssima.

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  2. André Meireles11 March 2024 at 21:29

    Por aqui passaram várias orquestras de Jazz, nacionais e estrangeiras.

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  3. Armanda Carvalheira12 March 2024 at 14:19

    O pátio estilo mil e uma noite é lindissimo.

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  4. Sofisticado nightclub com vocação para o jogo.

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