Do Castelo, da Graça, do Alto de Santa Catarina, vista do cimo dos montes, das colinas, dos miradouros, Lisboa «enfia os olhos pelo Oceano». «Poucas vezes no mundo verá o viajante, como em Lisboa, tanta magnificencia de espectaculos naturaes, e tamanha variedade de scenario!», diz-nos o olisipógrafo Júlio de Castilho, para quem Lisboa «apresenta panoramas estonteadores, pela grandeza das linhas, e pelo variegado das minucias».
É de Francesco Rocchini (1822-1895) esta «vista tomada do Castelo de S. Jorge» que Norberto de Araújo descreve: «O encanto de Lisboa não se procura: encontra-se. Não reside num único sítio: dir-se-ia móvel, deambulatório. Vadio — passeando por onde lhe apetece.
Aconselha-se o romeiro a que o não rebusque. Será a melhor maneira de dar com ele.
Os mil motivos de interesse, de sedução, de
êxtase — espraiam-se, perdem-se, ocultam-se e mostram-se pelas colinas e
pelas planícies ribeirinhas.
Num parque fecundado pelo sol, poetizado
pelo luar, nascido espontâneo, enobrecido pelas idades — não é possível
encontrar dispostos para nossos olhos os loureiros que coroam heróis e
as rosas que engrinaldam vestais. Nem os rouxinóis têm moita certa.
As colinas de Lisboa há que trepá-las para bem as
conhecer.
Os vinte miradouros suspensos de pérgolas e de torres,
dão-nos o panorama objectivo, familiar: apontam-se as coisas,
sabe-se-lhes a idade e a história. As colinas — não. Rugadas de congostas [*], quelhas, linhas de desfiladeiros, planos
indecisos, são subjectivas. O seu encantamento é de sonho.
A penha do Castelo, abarcada desde o Largo do Caldas — é uma fantasmagoria
Vista deste lado — a colina é um santuário; adivinha-se a torrinha sineira de uma ermida. Contemplada deste outro sítio — é uma muralha. Tomada do lado do mar — é um museu; alveja o perfil manuelino de uma janela.
Em todas as colinas, subindo, acavalgando-se,
amparando-se, tocando-se nos beirais, as casas, os tugúrios, os
palácios, os monumentos, os aglomerados indistintos, cinzentos ou violetas, conforme lhes dá a luz — são cenários do presépio lisboeta.
As Colinas de Lisboa — eis o panorama sagrado de uma cidade Olimpo, que enfia os olhos pelo Oceano. Os longes mandam na alma. Nas cidades e nos homens — as distâncias ganham em saudade o que perdem em nitidez. Castelo, Graça, Penha, Estrela, S. Francisco, — ascensão ideal... » 1
Bibliografia
1 ARAÚJO, Norberto de, Legendas de Lisboa, pp. 28-29, 1943.
* Nota(s): O Dicionário Houaiss e o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora registam cangosta, mas remetem para congosta, portanto, o termo preferível. Trata-se de «caminho estreito e comprido, mais ou menos declivoso» (in Dicionário da Porto Editora) e «estrada estreita, rústica, entre muros ou sebes, na região periférica de uma povoação, aldeia, vila etc.; azinhaga» (in Houaiss). A palavra vem do latim hispânico 'congusta (via)', por 'coangusta (via)', «caminho estreito», de 'coangustare', «apertar».
* Nota(s): O Dicionário Houaiss e o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora registam cangosta, mas remetem para congosta, portanto, o termo preferível. Trata-se de «caminho estreito e comprido, mais ou menos declivoso» (in Dicionário da Porto Editora) e «estrada estreita, rústica, entre muros ou sebes, na região periférica de uma povoação, aldeia, vila etc.; azinhaga» (in Houaiss). A palavra vem do latim hispânico 'congusta (via)', por 'coangusta (via)', «caminho estreito», de 'coangustare', «apertar».
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