Thursday, 27 October 2016

Estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolónia

   Iria à noite a Santa Apolónia, e no momento do comboio partir correria à portinhola, a balbuciar fugitivamente uma desculpa; não lhe daria tempo de choramigar, nem de recriminar; um rápido aperto de mão, e adeus, para nunca mais...

   
   Atirou-se para o coupé (...) Ao chegar a Santa Apolónia faltavam, para a partida do expresso, dois minutos. Precipitou-se para a extremidade da sala, já quase vazia àquela hora, a comprar uma admissão; e ainda aí esperou uma eternidade, vendo dentro do postigo duas mãos lentas e moles arranjar laboriosamente os patacos d'um troco.

Estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolónia [ant. 1900]
Largo dos Caminhos de Ferro
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
 
   Penetrava enfim na sala de espera — quando esbarrou com o Dâmaso, de chapéu desabado e sacola de viagem a tiracolo. Dâmaso agarrou-lhe as mãos, enternecido:
 — Ó menino! pois tiveste o incomodo?... E como soubeste tu que eu partia?

Estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolónia [c. 1900]
Largo dos Caminhos de Ferro
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
      
   Ainda estavam chegando passageiros, esbaforidos, de guarda-pó, com chapeleiras na mão. Os guardas rolavam pachorrentamente as bagagens.(...)
   Todas as portinholas agora estavam fechadas, um silêncio caíra sobre a plataforma. O apito da máquina varou o ar; e o comprido trem, num ruído seco de freios retesados, começou a rolar, com gente às portinholas, que ainda se debruçava, estendendo a mão para um último aperto.  Aqui e além esvoaçava um lenço branco. (...) O compartimento do correio resvalou, alumiado; e com outro dilacerante silvo o comboio mergulhou na noite...
(QUEIROZ, Eça de, Os Maias», 1888)

Estação de Caminhos de Ferro de Santa Apolónia [1944]
Rua dos Caminhos de Ferro; Largo dos Caminhos de Ferro
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

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