Sunday 4 September 2022

Rua do Diário de Notícias que foi dos Calafates

A rua dos Calafates, parece ser arruamento dos homens d'este officio; em epocas bem remotas, existiam os calafates na Ribeira das Náus, e diz a tradição não serem menos de seiscentos, o que mostra evidentemente quanto eram importantes os trabalhos navaes.
Esta rua chrismou-se ultimamente com o nome de Diario de Noticias [1885], em attenção ao estarem alli estabelecidas as officinas d'aquelle popular jornal.
(in O recreio: publicação semanal litteraria e charadistica, Vol. X, p. 147, 1890)

Esta Rua dos Calafates é do século XVI, na designação e na orientação topográfica; seu nome adveio da circunstância de serem os calafates, trabalhadores de fainas navais lá de baixo, de Santos, da Ribeira das Naus, dos Remolares, os primeiros, talvez, a fazerem casas na retalhada Herdade de Santa Catarina, na banda do Alto. Foi em 31 de Dezembro de 1885 que, por edital, se transformou o dístico, tão «Bairro Alto» velho, em Rua do Diário de Noticias, tão «Bairro Alto» novo.
E porque estamos na Rua do Diário de Notícias — diz Norberto de Araújo — meia dúzia de palavras acerca deste importante órgão da imprensa portuguesa, o de maior tiragem em todo o país. Como é natural, Dilecto, o edifício de hoje [em 1938] difere sensivelmente, em aspecto e em extensão, daquele onde em 1860 blasonava a tabuleta a toda a largura como um título de página — da «Tipografia Universal», da Rua dos Calafates.

Rua do Diário de Notícias |1911|
Antigo edifício do Diário de Notícias na esquina com a Tv. do Poço da Cidade. 
Joshua Benoliel, in AML

Na primeira metade do século XVIII, já esta casa era de tipografia; o impressor, tão hábil na sua profissão quanto erudito, Francisco Luiz Ameno, manteve neste lugar a sua oficina. De 1820 a 1835 a casa pertenceu a um não menos afamado artista, José Baptista Morando, e foi nessa época que se publicou, saído dos prelos desta casa, o primeiro periódico contemporâneo vendido na rua, a «Guarda Avançada» (Fevereiro a Maio de 1835). [...] Foi então, e porque o negócio não ia próspero, apesar da boa clientela da Tipografia Universal (assim se chamava o estabelecimento gráfico), que Silveira Pinto propôs a compra da oficina a Tomaz Quintino Antunes, tipógrafo de nomeada entre editores e literatos, homem do povo, tão austero quanto empreendedor (1862). 

Rua do Diário de Notícias |1925|
Descarga de papel no antigo edifício do Diário de Notícias.
Foto Arquivo Global Imagens

Tomaz Quintino adquiriu o estabelecimento e, pouco depois, a propriedade de edifício. Imprimia-se então na Casa um jornal «O Conservador», de que era redactor Eduardo Coelho, homem culto e também empreendedor, muito relacionado com políticos e homens de letras e que por incidentes da vida se houvera feito tipógrafo da Imprensa Nacional durante algum tempo.
Tomaz Quintino e Eduardo Coelho resolveram, por proposta amadurecida do segundo, fundar um jornal, e que se publicaria na própria Tipografia Universal: o «Diário de Notícias». Apareceu o número de apresentação em 29 de Dezembro de 1864, e o primeiro número formal em 1 de Janeiro de 1865. A escritura da sociedade foi firmada em 20 de Abril desse ano.==

Rua do Diário de Notícias N→S |1911|
Junto ao antigo edifício do Diário de Notícias na esquina com a Tv. do Poço da Cidade.
Joshua Benoliel, in AML
Nota(s): o local da foto não está identificado no arquivo

Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. VI, pp. 18-19, 1939.
O recreio: publicação semanal litteraria e charadistica, Vol. X, p. 147, 1890.

1 comment:

  1. Verdadeiro serviço público. O melhor blog sobre Lisboa.
    Carlos Fróis

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