Levantam voo as gaivotas à roda delas, e largam para o rio os bergantins reais e os botes catraios. Visão de séculos neste Cais das Colunas — dois brasões de pedra que nunca chega a ser morena. As colunas são um sinal de atenção, o mais lindo e recortado sinal na fronte de Lisboa ribeirinha. Fazem uma evocação da Veneza dos doges.
Em verdade estes dois pilares não levam duzentos anos, pois são invenção posterior ao Terramoto. E não são os primitivos. O Tejo divertiu-se sempre muito com as colunas, e arrebata-as várias vezes. Quando, em 1903, se preparava o desembarque de um rei inglês [Eduardo VII], que no cais havia de abicar na galeota dourada de trinta remeiros — houve que improvisar umas colunas de madeira, porque as de pedra tinham caído. Foi outro brinquedo: o rio levou as colunas no outro dia. . .
Este Cais das Colunas, que sucedeu ao Cais da Pedra — é o miradouro raso e rasteirinho da cidade. Um livro aberto de evocações. Viu sucessivamente as barcas, as fustas, as galeras, as caravelas, as naus; as galés e os galeões; as fragatas, as corvetas, os brigues e as escunas, depois os navios chapeados de ferro e aço, os transportes e os transatlânticos, os cruzadores e os couraçados. Guarda na retina as silhuetas da nau «S. Gabriel», que foi à Índia, do galeão «Santa Teresa», o mais imponente que cruzou os mares, da nau «D. Maria», do Marquês de Nisa, que esteve em Trafalgar, da corveta «Pero de Alenquer», e do «Adamastor».
Cais das Coluna — sem colunas |c. 1900| O Tejo divertiu-se sempre muito com as colunas, e arrebata-as várias vezes. José Artur Bárcia,in Lisboa de Antigamente |
Conheceu as velas de todo o mundo, os pavilhões de todos os povos, os alcaxas¹ de todos os marujos, e ouviu trons e salvas em todas as línguas. Da sua rampa de pedra rolada, ou da sua escadaria carcomida — viu cem gerações dizerem adeus a cem armadas que partiam. Pórtico escancarado do Terreiro do Paço, a sumir-se abaixo do nível, dir-se-á um adiantado do Arco Triunfal, o primeiro aviso de que a cidade começa.
¹ peças inconfundíveis do uniforme dos marinheiros
De acordo com alguns autores, as colunas que pontuam a escadaria de pedra que desce até ao rio, poderão ser de inspiração maçónica e representar as duas colunas do Templo de Salomão (colunas Boaz (B) e Jaquim (J) ,ou Jerusalém e Belém, conforme as interpretações) simbolizando força e estabilidade, rigor e misericórdia, força e beleza, ciência e conhecimento, o Ocidente e o Oriente. O "estar entre colunas" maçonicamente significa estar em segredo entre irmãos
Mas o que talvez poucos saibam, é o que o lodo esconde. As duas famosas colunas ainda têm os nomes que lhes foram dados em pleno Estado Novo, em homenagem às duas figuras mais importantes do país na altura: «Salazar» e «Carmona».
Acima dos nomes dessas duas importantes e polémicas personalidades da História de Portugal, estão citações que cada uma delas proferiu na sequência de duas viagens que Óscar Carmona, Presidente da República, fez às colónias.
Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Legendas de Lisboa, pp. 38-39, 1943.
lusophia.wordpress.com.
Narrativa interessante do ponto de vista histórico, com fotografias muito BELAS.
ReplyDeleteNão paro de ficar surpreendido,obrigado.
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