A estatua equestre d'el-rei D. José I — noticiava o semanário illustrado Archivo Pittoresco em 1859 —, erigida na vasta praça do Commercio, é incontestavelmente, em que peze a estrangeiros e estrangeirados, um monumento de que Portugal se pôde ufanar, que poucos ou, talvez, nenhum rival, neste genero, tem no mundo, e que honra altamente o talento dos que a conceberam e executaram, acreditando os nossos progressos nas artes. 1
E surgiu então — relembra-nos Norberto de Araújo — um Terreiro do Paço novo. Espalmou-se aqui, no chão que fora o «espalmadeiro» dos séculos XIV e XV — a mão de Pombal. E Eugénio dos Santos delineou a praça nova, ordenada por decreto de 16 de Janeiro de 1758. (...)
A «Black Horse Square» (Praça do Cavalo Preto), como dizem os ingleses, é, talvez, a mais imponente praça pública da Europa. Quanto à Estátua Equestre data de 1775.
Estamos diante do mais belo monumento consecratório de todo o país — prossegue o ilustre olisipógrafo —, glória — não de D. José ou do Marquês de Pombal — mas de Joaquim Machado de Castro.
Estátua equestre d'el-rei D. José I [c. 1870] Terreiro do Paço, actual Praça do Comércio; Castelo de S. Jorge e a Sé em fundo. Francesco Rocchini, in Lisboa de Antigamente |
Joaquim Machado de Castro, lente de escultura e estatuária, que já tinha cinquenta anos quando realizou esta notável obra — ele, o barrista peregrino dos presépios — foi um artista de intuição, desenvolvido na escola de Mafra, onde, ajudante do escultor Alexandre Giusti, revigorou a sua cultura, preparando-se para maiores destinos.
O monumento não lhe saiu de um jacto, como o bronze liquido da Estátua; o artista estudou, duvidou, trabalhou, persistiu. O primeiro modelo fê-lo [em gesso] em fins de Dezembro de 1770, e, depois, mais dois em Março de 1771; foi encarregado da obra em Julho desse ano, e em Outubro lançou-se à empresa. Dois anos depois, precisamente, começaram os trabalhos de fundição, concluídos na manhã de 15 de Outubro de 1774; a Estátua fora fundida em oito minutos, nas oficinas da Fundição de Cima (antiga Fundição de Canhões).
Na madrugada de 22 de Maio de 1775 começou a condução da estátua colossal desde Santa Engrácia, pela Rua do Paraíso, pela Rua (aberta de propósito) do Museu de Artilharia e pela Rua da Alfândega até este Terreiro do Paço; organizou-se um imponente cortejo que desfilou entre alas de tropas de linha, cortejo que teve qualquer cousa de medieval pela grandeza, pelo brilho, até pela originalidade. A zorra conduzindo a Estátua chegou aqui no princípio da tarde de 25 — levou três dias e meio no trajecto —, e a admirável obra de Machado de Castro foi colocada, onde a estás vendo, na manhã do dia 27, ficando coberta por um invólucro de seda carmesim. A inauguração efectuou-se a 6 de Junho de 1775, e as solenidades, espectáculos e festas que se realizaram então foram das de maior esplendor da história de todos os tempos.
Zorra, Museu Militar [1927] A zorra concebida por Bartolomeu da Costa que transportou para o Terreiro do Paço a estátua de D. José I. Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
Coloquemo-nos em frente do monumento, que muito se valoriza no ambiente da Praça. O fundo natural norte é-lhe dado pelo Arco Triunfal, num cenário a que o Castelo
O monumento favorecido pela situação ganha assim imenso, orgulhoso na vastidão do Terreiro.
A proporção nos elementos é, como facilmente anotas, um dos méritos deste monumento. Não se dirá que o bloco de bronze de uma patina glauca que o enobrece, tem sete metros menos sete centímetros de altura e 29.371 quilos de bronze útil. Seria necessário colocarem-se quatro homens uns sobre os outros em vertical para darem o tamanho da Estátua. O monumento mede 14 metros de altura.
Na frente do fuste, e sob uma escultura com as armas reais de D. José, ali vês o medalhão do Marquês de Pombal, que foi retirado deste lugar logo em 1777 para só ser reposto novamente em 1833.
Por tal sinal conta-se-que o grande Marquês, ao darem-lhe a noticia, observou entre irónico e resignado: «Ainda bem; o retrato não se parecia nada comigo...». A inscrição latina na base do pedestal exalta as virtudes do Rei.
Agora dêmos volta ao monumento, pela direita; ali tens a alegoria escultórica «O Triunfo› representado num grupo, em vulto, no qual se marcam uma figura que conduz um cavalo pisando aos pés os inimigos, avançando outra que conduz a palma da vitória; a alegoria, em baixo relevo, na face norte do pedestal, em frente ao Arco da Praça, representa a «Generosidade Régia» erguendo a Cidade dos escombros do Terramoto, ou, segundo outras divisas, «Lisia desmaiada», ou seja Lisboa vencida pelo Terramoto, enquanto o governo da Nação a ajuda a erguer-se da ruína; o grupo escultórico da esquerda do monumento não é menos belo que os seus similares: dá-nos a «Fama», com a sua tuba sonora, vendo-se as figuras de um homem prostrado e de um elefante.²
Se, peça por peça, desde a figura do Rei a cavalo, até ao pedestal, com seus grupos e esculturas, o monumento realça como uma grande peça de arte-é o seu conjunto, equilíbrio e nobre simplicidade que constituem o seu mérito.3
Baixo relevo de Machado de Castro, que está colocado no monumento do lado Norte (2ª foto) Gravura de: "Lucius sculps. Olisip." (José Lúcio da Costa, vulgo o 'Coxinho'), 1795 |
N.B. O monumento exibe na face oposta do pedestal (face Norte, vd. 2ª foto) uma alegoria de Machado de Castro em baixo-relevo à Generosidade régia (vd. Gravura, 1795), traduzindo o empenho do monarca na reconstrução da cidade destruída pela Terramoto.
Inclui
a descrição feita pelo coleccionador: "Lisboa desfalecida despis do
terremoto de 1755 é sustentada pelo seu antigo aliado, o deus Marte. A
realeza acompanhada do génio da paz anima-a com o olhar e com o gesto.
Ao lado entrevê-se o leão, símbolo da sua força. O comércio abre os seus
cofres, e põe-os ao serviço da realeza; esta aponta para os edifícios
nascentes da reconstruída Lisboa, Por trás da figura do comércio vê-se a
navegação, que o auxilia. A diante as mós simbolizando a indústria
agrícola. Junto à navegação vê-se a arquitectura ostentando a planta da
cidade baixa."
Autor: "J.M.C. inv. delin." (Joaquim Machado de Castro)
Autor: "J.M.C. inv. delin." (Joaquim Machado de Castro)
Nota(s): Para saber mais sobre este magnifico monumento e o o seu autor, mestre Joaquim Machado de Castro, pode assistir a pequeno filme no n/ sítio do Facebook apresentado pelo escultor Lagoa Henriques e produzido pela RTP em 1971.
___________________________________
Bibliografia
1 Archivo Pittoresc: semanario illustrado, p. 41, 1859.
2 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XII, p. 23-25, 1939.
3 cm-lisboa.pt.
Bibliografia
1 Archivo Pittoresc: semanario illustrado, p. 41, 1859.
2 ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XII, p. 23-25, 1939.
3 cm-lisboa.pt.
Sempre que aqui venho aprendo qualquer coisa. Parabéns por este excelente blogue.
ReplyDeleteJoão Freitas Branco
A estátua é magnífica. Já tive ocasião de estar junto ao modelo (tamanho real) em gesso, aquando uma exposição (Páteo da Galé) relacionada com a Lisboa de antes e após o terramoto.
ReplyDeleteExcelente blogue. Parabéns.
ReplyDeleteGrato pelo apreço.
DeleteObrigado pelo blogue, magnífico!!!
ReplyDeleteGrato pelo apreço.
DeleteExcelente blogue, estou sempre a aprender...Parabéns e obrigado.
ReplyDeleteGrato pelo apreço. Volte sempre.
Delete