O antigo Palácio dos Condes de Aveiras, Marqueses de Vagos, em S. Cristóvão — hoje revestido de um semblante burguês incaracterístico — entra no inventário patrimonial de Lisboa apenas por seu significado e expressão histórica subjectiva. É uma peça urbana do século XIX, mas de remoto fundamento nuclear. Com efeito eleva-se este edifício onde assentou, em área mais reduzida, e de mais recuada frontaria em relação ao século XVIII, o Paço — ou Paços — de S. Cristóvão, que pertenceu ao 1.º Duque de Bragança, D. Afonso, ao 2.º D. Fernando I, e depois ao filho deste, D. Álvaro, Regedor das Justiças (....)
Neste sitio — diz Norberto de Araújo — assentaram os Paços de S. Cristóvão, nos séculos XV e XVI, com grandes tradições realengas e cortesãs, e que no
tempo de D. João II pertenceram a D. Álvaro de Bragança, Regedor das Justiças [e daí se deu à rua que vai do Largo de S. Cristóvão para o Largo do Caldas o nome de Rua do Regedor], filho de D. Fernando, l.º Duque deste título. Quando do Terramoto, as riquezas deste Palácio,
já dos Condes de Aveiras [e marqueses de Vagos], que nele haviam feito em 1740 grandes
melhorias, desapareceram completamente, salvando-se apenas a livraria. O portal, que notas aqui na Rua do Regedor,
deve ter sido aproveitado da primeira fábrica, quando da obra anterior ao Terramoto, e ficou sempre como um sinal
de atenção para o passado solarengo e pação da casa.
Palácio Vagos ou S. Cristóvão [1901] Largo de São Cristóvão, 1; Rua do Regedor, 2 Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente |
Nos tempos em que este edifício foi Paço, nele se realizaram as pomposas festas do casamento de D. Leonor, filha do Rei D. Duarte, com o
Imperador Frederico III da Alemanha; neste Paço nasceu o
malogrado príncipe D. Afonso, filho de D. João II, e porventura o próprio «Príncipe Perfeito».
Certo é terem no Paço de S. Cristóvão reunido, em 1456, as Cortes para aclamarem este Rei.
Em 1864 — pode ler-se na Lisboa antiga e Lisboa moderna — comprou-o então o rico capitalista Leomil, que daquelas ruínas fez ressurgir uma das mais lindas casas de Lisboa. Aproveitou-lhe a fachada principal, que ficara incólume, limitando-se a substituir as armas da família Vagos pela firma de seu uso. As armas representavam um belo cão. Para o lado do Caldas tem o palácio um lindo jardim e uma esplêndida fachada que sobre ele deita [3ª. foto]. Dá entrada ao jardim um elegante portão de grades, de moderna factura. Pelo lado da Rua do Regedor [2ª. foto]. há uma porta que é ainda da primitiva edificação, quando ali residiam pessoas da família real.
O Palácio Vagos ou S. Cristóvão foi objecto de novas intervenções, tanto no séc. XIX, como no séc. XX, dando lugar ao acrescento de pavilhões anexos e de novos andares,conferindo o aspecto actual ao edifício,pertencente à Associação de Socorros Mútuos de Empregados de Comércio de Lisboa, desde 1913.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de,Inventário de Lisboa: Monumentos históricos, p. 57, 194.
Lisboa antiga e Lisboa moderna : elementos históricos da sua evolução, pp. 10-11, 1900.
Apenas uma curiosidade: Abel Botelho, em "O Barão de Lavos", situa neste palácio o "palacete do barão". Várias dicas ao longo do texto apontam para isso: a proximidade da igreja de S. Cristóvão ("Breve, casaram, em S. Cristóvão, perto do palacete do barão"), o portão para o Largo do Caldas, as janelas de onde se vê o Tejo ao fundo da rua da Madalena, etc.
ReplyDeleteEstamos a preparar uma edição anotada de "O Barão de Lavos" (http://obaraodelavos.blogspot.pt/2012/07/o-barao-de-lavos-cap-1-sec-1.html) e, com a vossa permissão, faremos uma referência a este vosso excelente artigo sobre o Palácio de Vagos.
Gratos pelo apreço. Podem fazer referência ao n/artigo, com todo o gosto.
ReplyDeleteAí viveu uma tal "tia Luclélia"(brasileira abastada), casada com um Saraiva, que se refugiava dentro de um cofre aquando da guerra civil.
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