Sunday 24 September 2023

Palácios dos Marqueses de Gouveia

Ora se os Portalegre e Gouveia foram sepultados na igreja do Convento de Santo Elói, é natural perguntar-se: onde seria, em Lisboa, o seu palácio?
O palácio já não existe, mas os vestígios e as referências são numerosos e com bastante interesse. 

Comecemos pela obra de Norberto de Araújo — Peregrinações em Lisboa:
Este outro prédio [vd. 1ª imagem], que antecede o que vai fazer esquina ao Arco de Jesus — recorda o ilustre olisipógrafo — , foi o famoso Palácio, à Ribeira, dos Duques de Aveiro. Não vale a pena perdermo-nos em genealogias. Duas palavras só.

Pertenceu este Palácio aos Marqueses de Gouveia, Condes de Portalegre, que foram também Condes de Santa Cruz e de Sandomil (século XVII) e depois ao Duque de Aveiro (Mascarenhas), o último dos quais, D. José, supliciado em Belém, era filho do 3.° Conde de Gouveia. Pela extinção da Casa de Aveiro é que este Palácio entrou, por herança, na Casa Lavradio (Mascarenhas, por linha feminina, pois o 1.º Marquês e Conde do Lavradio casara com uma filha do 3.º Marquês de Gouveia). 

 

O Terramoto desfigurou inteiramente o Palácio e o sítio. Na porta n.º 17 do prédio [por trás do camião na imagem abaixo], no Campo das Cebolas, se abrem as Escadinhas do Pátio do Lavradio, que conduzem ao Largo do Marquês do Lavradio a S. João da Praça, aonde iremos dentro de poucos minutos.
O palácio Lavradio desintegrou-se desta família no século passado, e era uma ruína transitou a novos proprietários.

Campo das Cebolas, 17 |193-|
Local dos Palácios dos Marqueses de Gouveia
No n.º 17 do prédio [por trás do camião] abrem-se as Escadinhas do Pátio do Lavradio; Rua da Alfândega
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Cá estamos Largo do Marquês do Lavradio. Aqui, como te disse, assentava a frente do Palácio dos Duques de Aveiro, depois dos Lavradios. O Terramoto destruiu tudo quási inteiramente. Este aspecto do sítio é do século passado [XIX].==

Diz Pastor de Macedo («Lisboa de lés-a-lés», IV, 47) falando deste Largo:
— Fora antes do Terremoto de 1755 o pátio do palácio dos Marqueses de Gouveia, Condes de Portalegre e de Santa Cruz, palácio, que ali, desde a Ribeira até à Rua de S. João da Praça se erguia há muitíssimo tempo. A primeira vez que o vimos citado é em 1654 [...] para depois passar a ser «ao Pátio do Marquês...» para depois passar a ser o Pátio do Conde de Santa Cruz, pelo menos desde 1702 a 1740 e o Pátio do Marquês de Gouveia ou do Marquês Mordomo-mor que era o mesmo titular tratado pelo seu cargo, desde 1744 até ao Terremoto. Desde então até à quarta década do século seguinte foi simplesmente, duma maneira geral, Pátio do Marquês e fugitivamente, desde 1789 a 1792, Pátio do Duque em lembrança do último Marquês de Gouveia ter sido o último Duque de Aveiro.
Passando de pois o palácio, por herança, para a casa dos Marqueses do Lavradio, o pátio passou a ser designado, em 1844, por Pátio do Marquês do Lavradio, até que por edital de 7 de Agosto de 1911 teve a categoria de Largo, ... »

Largo do Marquês do Lavradio |1901|
Local dos Palácios dos Marqueses de Gouveia
Arco e Escadinhas do Pátio do Marquês do Lavradio com ligação ao n.º 17 do Campo das Cebolas. Note-se as duas iniciais "CM" sobre o arco da entrada.
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente
Escadinhas do Pátio do Marquês do Lavradio |c. 1945|
Local dos Palácios dos Marqueses de Gouveia
Pelo n.º 17 se passa da Ribeira Velha para o Largo do Marquês do Lavradio onde foi o pátio do palácio. Note-se os corrimãos de ferro, e o candeeiro de braço. Antes existiam aqui uma casas e barracas, aproveitadas das ruínas do velho Palácio dos Portalegres, Gouveias, Aveiros, Lavradios — sequência de herdeiros em conjunção de títulos.
Martinez Pozal, in Lisboa de Antigamente

As Escadinhas são do século XVIII, anteriores ao Terramoto; oferecem uma certa curiosidade, nos seus dois aconchegados lanços guarnecidos de corrimãos de ferro, e com seu candeeiro de braço, no centro da serventia, a apontar um desenho, entre aguarela e água forte. Pertencem à Câmara Municipal, e sobre o arco da entrada lá estão as três iniciais: C. M. L.. ¹
¹ [em 1901 só se vial duas iniciais "CM" como confirma a imagem acima]

Segundo as informações de Júlio de Castilho, foi a vereação de 1867 quem mandou terraplanar e limpar o sítio, fazendo o largo e também a passagem para quem vinha das Cruzes da Sé e de S. João da Praça para o Campo das Cebolas, na Ribeira Velha.
O portal que tem o n.º 13 pertenceu ao palácio dos Marqueses de Gouveia e talvez seja o que foi mandado fazer pelo 3.º Marquês daquele título, D. Martinho Mascarenhas, 6.° Conde de Sandomil, ao qual alude Tomás Pinto Brandão nuns versos do Pinto Renascido («A Ribeira de Lisboa»):
Como todo Portugal
o vosso portal fui ver,
eu, senhor meu, lá fui ter,
porque o não tinha por tal.
Graças ao louvor tal qual,
que lhe dei com pouco alinho!
porque isso me abriu caminho
a tirar-vos de cortez,
o chapéu como a «Marquês»
e a capa como a «Martinho».
Faleceu o Marquês D. Maninho em Março de 1723; a ser pois, como é possível, o portal que ainda lá está de pé o que ele edificou, deve atribuir-se-lhe como data o primeiro ou segundo decénio do século XVIII. A verdade, porém, sabe-a o portal.==

Palácios dos Marqueses de Gouveia |1901|
Largo do Marquês do Lavradio, 13; Travessa dos Machados
Portal nobre, brasonado, de D. Martinho de Mascarenhas Marquês de Gouveia,
falecido em 1723 que escapou ao Terramoto de 1755. Corpo central mais alto no
qual se rasga uma varanda, conjunto de certa graça arquitectónica, do tipo setecentista,
mas ainda do espírito final de seiscentos.
Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente

Bibliografia
CASTILHO, Júlio de, A Ribeira de Lisboa, 1893.
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. X, pp. 25-39, 1939.

6 comments:

  1. Carolina Michaelis26 September 2023 at 15:34

    Excelente peça. Obrigada.

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  2. I'm in awe of your skill and commitment. Congrats.

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  3. Muito obrigada por esta preciosidade!

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  4. Grande trabalho, muito bom e didáctico.

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