Este prédio alto que olha o Largo, entre a Rua da Madalena e a Travessa do Almada, encostado pelo posterior à Travessa das Pedras Negras, foi construído, num aspecto que não diverge muito do actual, em 1749, por João Manuel de Almada e Melo, visconde de Vila Nova de Sotto de El-Rei, tenente general, paroquiano, que no sítio das Pedras Negras outras mais casas edificou. Desse Almada — recorda Norberto de Araújo — veio o nome à Travessa e ao prédio, pois ainda há quem o designe por aquele título.
Lisboa está cheia de testemunhos da força inconsciente das tradições orais. O edifício — aliás sensaborão — , n.°ˢ 3 e 5 [6] do Largo, tem, como vês, seis andares, além dos estabelecimentos em loja; há quem suponha ter ele pertencido a um ramo da família Pombal, no começo do século passado. [...] Neste edifício funcionou, durante algum tempo, no século passado [séc. XIX], o Senado da Câmara de Lisboa. [...]
Prédio do Almada visto da Travessa do Almada |1901| À dir., a Travessa das Pedras Negras e, ao fundo, o Largo da Madalena. Machado & Souza, in Lisboa de Antigamente |
Na parede do edifício Almada desta Travessa estão embebidas quatro lápides e pedras romanas, que podes ler e ver sem dificuldade. Foram encontradas soterradas neste local, em 1749, quando o tal João de Almada e Melo ordenou aberturas de novos caboucos para erguer sua propriedade. Este sítio foi fértil em achados arqueológicos, do tempo da dominação romana. Mas falemos por agora apenas destes.
A maior [a 3ª lápide nas imagens abaixo] corresponde, na legenda latina, a uma dedicatória de Lisboa a um pretor. Pode traduzir-se deste modo: "Felicitas Julia, Olisipo, dedica a Lúcio Cecílio, filho de Lúcio Celeri, recto questor da província da Bética, tribuno do povo e pretor”.
Esta primeira lápide, no começo da Travessa, está incompleta; é, na melhor das interpretações, uma dedicatória de certo Caio Júlio a Mercúrio e a César Augusto.A lápide a seguir [2ª lapide abaixo], sobre uma pequena coluna, diz justamente, no seu latim, que "Tito Licínio Amarântio por voto dedicou à mãe dos deuses” [Cibele].Esta outra da extremidade [4ª lapide abaixo], mais decorativa, tem a legenda completa. Interpreta-se desta forma: Tito Licínio Cerno, natural de Lychaonia, dedicou à mãe dos deuses, a grande Ida da Frígia, sendo nobres duúnviros Cássio e Cassiano , e cônsules nobilíssimos Marco Atílio e Afroniano, e sendo governador Gaio".
Mas deixemo-nos de deuses e de cônsules; o muito interessante deste assunto (por aqui foram encontradas algumas dezenas de monumentos epigráficos romanos) excede os nossos planos.
Mas subamos: eis-nos na "Avenida" do sítio: a Rua das Pedras Negras, que abrange por um lado e outro três quarteirões , a ligarem a Rua da Madalena com a Sé .⁼⁼
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa», vol. II, p. 16, 1938)
Na imagem do google é bem visível a fiada que foi acrescenta no século XX.
ReplyDeleteExcelente publicação. Parabéns pela dignidade que trouxeram ao maltratado espólio fotográfico da relapsa CML e pago com o dinheiro dos contribuintes,
ReplyDeleteMuitíssimo interessante. Parabéns.
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