Sunday 13 January 2019

Palácio dos Távora

Aqui temos a Travessa da Nazaré — diz Norberto de Araújo — , que deve seu nome à Ermida de que te falei, demolida há muito, e que em cotovelo leva à Calçada do Monte.
Oferece-nos à vista um curioso prédio Solarengo, n.ºˢ 13 a 21, palácio grado que foi no século XVIII. É hoje [em 1939] na sua parte nobre a sede do Centro Escolar Dr. António José de Almeida, aqui instalado desde 1913, e que foi fundado em 1906 na Travessa do Borralho aos Anjos [hoje Rua Francisco Lázaro].

O velho palácio em cujos baixos estão moradias pobres, ostenta dignidade nas suas dez varandas nobres, no seu alto e rasgado pórtico, e num conjunto severo de arquitectura civil. Possui três salas apaineladas, das quais uma pintada a claro escuro e outra com figuras e perspectivas interessantes, que talvez merecessem estudo. A Ermida da Nazaré nada sofreu com o Terramoto. Estou em crer que este Palácio teve restauro no século XVIII, mas não em consequência de ruína ou desmoronamento; aquelas pinturas, pois, uma delas pelo menos, pedem bem recuar ao princípio de setecentos.
 
Palácio dos Távora [c. 1900]
Travessa da Nazaré, 13 a 21
Machado & Souza, in AML

Os silhares de azulejos que revestem as salas são muito bons, e de variados tipos, azues e policromos, frescos, decorativos, exemplares de marca. 
Tinha capela privada, e possui um belo terraço com ampla vista sobre a cidade, verdadeiro miradouro.
Pertenceu nos meados da século passado este prédio ao Conselheiro Dr. Alfredo Dias Ascensão. Pertence agora [1938] a Artur Simões Faria, que do passado remoto da Casa nada sabe dizer. 

Dilecto: Lisboa está cheia destes mistérios, destas graças perdidas, destes romances vagos de famílias. 
Cada palácio morto é um Tombo-vazio. Deles raras vezes fica papel, notícia ou documento quando se foi o último senhor, e a Casa entrou no «inquilinato público» Muito do que conseguimos, aqui e ali, desvendar, já estaria perdido dentro de uma dúzia de anos.¹






 
 
Palácio dos Távora [c. 1900]
Travessa da Nazaré, 13 a 21
Machado & Souza, in AML





 
As suas antigas cocheiras, de linhas sóbrias e severas, são hoje ocupadas pelo ginásio. A antiga cozinha continua a manter os azulejos de padrão ou pombalinos da segunda metade do século XVIII que a revestem completamente. É difícil ultrapassar a extraordinária criatividade dos fabricantes de azulejos dessa época, bem como a dos técnicos que procediam à sua aplicação nas paredes.
A seguir ao grande terramoto que destruiu Lisboa em 1755, durante o Governo do Marquês de Pombal, 1.º Ministro do Rei D. José, houve necessidade de arranjar um material de revestimento barato e fácil de produzir, para ser usado nas novas construções que se erguiam rapidamente por toda a cidade. Assim, as oficinas de cerâmica começaram a produzir azulejo de padrão em grande escala para as novas casas e com as quais os compradores e os operários que os aplicavam, podiam fazer um sem número de combinações diferentes e muito imaginativas.

Palácio dos Távora,  azulejos [1968]
Travessa da Nazaré, 13 a 21
«Terraço com ampla vista sobre a cidade, verdadeiro miradouro»
Vasco Gouveia de Figueiredo, in AML

O Palácio Távora também tinha uma sala decorada com pinturas a fresco do século XIX com vistas do Palácio da Pena de Sintra, mas foram apagadas por um qualquer desígnio misterioso partido da edilidade camarária lisboeta, actual proprietária do imóvel.²

N.B. O edifício é — desde 1973 — ocupado pelo Grupo Desportivo da Mouraria, que também se chamou os «Leões da Mouraria», associação desportiva local.
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Bibliografia
¹ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIII, pp. 22-23, 1939.
²ADRIÃO, Vítor Manuel Mistérios de Lisboa, lendas e factos.

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