Sunday, 20 May 2018

Chafariz de Andaluz: a "fonte dagoa dandalusos"

Desconhece-se a origem do nome do sítio. A mais simples — e. porventura,  a mais razoável — é-nos revelada por João Sousa Moura em Vestigios da lingua arabica em Portugal: ou lexicon etymologico das palavras, e nomes Portuguezes, que tem origem arabica (1789):
ANDALUZ طر اندل Andalus. Nome de hum bairro, e de hum chafariz nos arrabaldes de Lisboa, Fregue2ia de S. Sebastião da Pedreira. He appellido de hum homem natural da Andalusia, de quem o lugar tomou o nome: e vem a ser o lugar do Andaluz.


Passado o Viaduto acaba S. Sebastião, e começa Andaluz. O sítio do Andaluz — recorda-nos Norberto Araújo — é antiquíssimo, o avô de toda esta área, e a sua extensão oral foi muito vasta. Hoje está reduzido a um pequeno Largo, e — com o Largo das Palmeiras de permeio — à Rua do Andaluz, que leva à Praça José Fontana, antiga Cruz do Taboado.
Ora eis-nos defronte do famoso Chafariz de Andaluz [ou a “fonte dagoa dandalusos” (como era conhecida e designada em 1513), e da qual quis el-rei D. Manuel I trazer água para o Rossio], e que melhor diremos «Bica»  É o mais vetusto monumento — pobre monumento! — dêste género em tôda a Lisboa. A pedra da nau, de talhe bárbaro, interessantíssima, tem indiscutível valor arqueológico, e constitue um precioso elemento de estudo.

Chafariz de Andaluz [séc. XIX]
Largo de Andaluz; por trás do chafariz passa a Travessa de Lázaro Verde,
hoje Rua Actor Tasso
Fotografia anónima, in Lisboa de Antigamente

Na inscrição — que não nos é possível ler — vê-se a data de 1374 [vd. N.B.]. O Chafariz do Andaluz, no século XVI muito discutido em demandas para aproveitamento das suas águas, guarda a sua nascente num poço do quintal de um prédio, n.° 26, da Rua de S. Sebastião, onde hoje está instalado o Colégio Parisiense, prédio com quinta que pertenceu no século passado ao ministro do Bairro do Andaluz, João António Mayer; a quinta era no século XVIII de Francisco Garcia Lima, e fôra no principio do século XVI de D. Filipa Mendes. Certo é que desde 1524, pelo menos, a água estava municipalizada.
Há cêrca de vinte anos [c. 1919] a Junta de Freguesia tomou à sua conta a defesa do Chafariz, cuja água diziam. inquinada na passagem dos canos da nascente até ao tanque; a Câmara procedeu a vistorias, que se repetiram há pouco tempo.

Chafariz de Andaluz |entre 193- e 1947|
Largo de Andaluz
Observe-se o tubo de ferro perfurado para recolha da água e o suporte para recipientes.
Amaro de Almeida, 
in Lisboa de Antigamente

Pois a Bica do Andaluz — com seu tanque rectangular — é êste pouco que aqui vês. Na parede do fundo ostentam-se, como padrão, a pedra na qual se vê a nau, à esquerda, e a legenda indecifrável, à direita, e, por cima, um escudo com armas reais. Uma inscrição recentíssima diz: «Esta água é das galerias subterrâneas».

Chafariz de Andaluz |c. 1950|
Pedra de armas de D. Afonso IV sobre uma lápide bipartida, tendo, à esquerda, a nau vicentina das armas do brasão da Cidade e, à direita, a inscrição:
NA ERA DE 1374, O CONCELHO DE LISBOA MANDOU FAZER ESTA FONTE A SERVIÇO DE DEUS E DO NOSSO SENHOR REI DOM AFONSO POR GIL ESTEVES, TESOUREIRO DA DITA CIDADE, E AFONSO SOARES, ESCRIVÃO. A DEUS GRAÇAS
Eduardo Portugal, 
in Lisboa de Antigamente

Um tubo de ferro estende-se, desde há poucos anos [193-], da parede do fundo até à frente do tanque, facilitando por três orifícios [conseguimos contar cinco]  abertos nesse tubo para a colheita da água, que muitos crêem medicinal — o que não negamos.

Chafariz de Andaluz |entre 193- e 1947|
Largo de Andaluz

Pormenor do tubo de ferro instalado por volta de 1930 e os cinco orifícios para colheita da água.
Amaro de Almeida, in Lisboa de Antigamente

N.B. Inscrição gravada na lápide que mestre Araújo classifica como "indecifrável": «Na Era de 1374 o concelho de Lisboa mandou fazer esta fonte a serviço de Deus e do nosso Senhor Rei Dom Afonso por Gil Esteves, tesoureiro da dita cidade, e Afonso Soares, escrivão. A Deus graças»
Aquela data corresponde ao ano de 1336 da Era Cristã. A bica Funcionou até 1945, ano em que as suas águas foram desviadas para o esgoto por serem «provenientes de matéria orgânica». Chegou a alto estado de degradação, sendo restaurado em 1960.
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Bibliografia
ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, pp. 85-86, 1939,
Monumentos e edifícios notáveis do distrito de Lisboa, Volume 5, 1962.

6 comments:

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