Sunday, 25 February 2018

Associação do Registo Civil e Administração do Jornal «O Livre Pensamento»

Porventura a mais emblemática instituição para-maçónica activa no advento da República, a Associação do Registo Civil foi fundada pela Maçonaria, em 5 de Agosto de 1895. A sua designação inicial foi alterada e, em 1911, o complemento que é aposto evidencia os seus propósitos: Associação Propagadora da Lei do Registo Civil. Estava sedeada na Travessa dos Remolares, 30, 1º, com uma dependência e Administração do Jornal «O Livre Pensamento»  no Largo do Intendente Pina Manique, 45, 1º.

 
Entre os seus milhares de associados contam-se Manuel dos Reis Buíça e Alfredo Luís da Costa, a quem a História consignaria o epíteto de regicidas. Apesar de este acontecimento ter sido relatado na imprensa coeva como uma tragédia, é certo que muitas mulheres, à época, lutando pela implantação da República, se manifestaram claramente a favor do assassinato do Rei e príncipe portugueses, mostrando-se solidárias com as viúvas e filhos dos revolucionários, associando-se às iniciativas da «Associação do Registo Civil». Maria Veleda, em «A Vanguarda», num texto editado a 9 de Fevereiro de 1908, dirigido «Às Mulheres Portuguesas», interpela com veemência:
Por quem andam V. Ex.as de luto, minhas senhoras? É pelo seu rei? Pelo homem que, se ainda vivesse, teria lançado na consternação, no desespero, trezentas famílias dos presos políticos, ameaçados com a deportação, em paragens longínquas, varados pelos raios brasadores de um sol que assassina, expostos a toda a sorte de maus tratos e de ignomínias e para quem a morte constituiria a única libertação?
 
Associação do Registo Civil e Redacção e Administração do Jornal «O Livre Pensamento» [1911]
Largo do Intendente [Pina Manique :1955], 45
A importância desta Associação reflectiu-se na toponímia da época, sendo que o troço da Rua dos Anjos (
s nºs 1 a 47 e 2 a 38) foi primeiramente chamado  do «Registo Civil» (1920), passando novamente a Rua dos Anjos (1937).
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente
 
Em rigor, a militância feminina evidenciou-se nesta associação como plataforma de luta comum, pois pugnava pela Lei do Divórcio (aprovada logo em 1910), tendo a dessacralização da vida quotidiana nos seus principais actos — registos de nascimento, casamento e óbito — assumido primordial importância. A laicidade do Estado foi o estandarte deste movimento social que saudou vivamente a Lei da Separação da Igreja e do Estado (22 de Abril de 1911). De tal modo este dia se tornara emblemático que as escolas da Associação passaram a desfrutar de uma semana de férias de modo a celebrá-lo condignamente.

Associação do Registo Civil [c. 1911]
Travessa dos Remolares, 30
Associação do Registo Civil; Redacção e Administração do Jornal «O Livre Pensamento».
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente
 
Tal facto terá por certo concorrido para que algumas associadas se declarassem apenas  livres-pensadoras e não tivessem querido aderir, para além desta, a qualquer organização de  índole partidária.  Aderiram  a  esta  associação  mulheres  como  Deolinda  Lopes  Vieira  [Quartin]  e  Sofia  Quintino, para só lembrar duas.  Esta  colectividade  desenvolveu  uma  intensa  actividade  cívica,  criou  várias  escolas  e  organizou quatro congressos nacionais e um internacional. Foi encerrada e extinta, em  1938, pelo regime ditatorial (1926-1974). No dia 5 de Abril de 1907, o baluarte republicano  «O Mundo»  anuncia que se encontrava a  decorrer a subscrição para a compra de uma carreta  funerária e respectiva bandeira para as  exéquias fúnebres destinada:
Aos liberais e livres-pensadores 
Chamamos a atenção dos liberais e livres-pensadores para a subscrição  pública que esta colectividade está fazendo para a construção de uma  carreta funerária especial, que se distingue das outras  carretas que servem  para funerais católicos, e também para a confecção de  uma bandeira para  arvorar na sede da associação e para cobrir os ataúdes civis.  As  listas  para  esta  subscrição  encontravam-se  expostas   em  vários  estabelecimentos comerciais.

Manifestação anticlerical promovida pela Associação do Registo Civil de apoio ao ministro da Justiça, António Maceira [1912-01-14]
Praça do Comércio
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

 
Pela sua actividade cívica, cultural e benéfica foi considerada benemérita de instrução em 1925 e de utilidade pública em 1926. Em 1938 esta Associação foi administrativamente encerrada e extinta pelas autoridades.
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Bibliografia
unl.pt/Associação do Registo Civil, texto IL e MG, 2010.
Rede de Bibliotecas de Lisboa.

1 comment:

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