Esta noite, pelas 7 e meia horas, realisou-se a primeira experiencia das ascenções pela calçada do Lavra. Com a chegada dos srs. Antonio dos Santos Beirão e Antonio Ignacio da Fonseca, directores, Raul Mesnier, engenheiro, e varios convidados entre damas e cavalheiros que logo entraram na carruagem que estacionava no fundo da calçada do Lavra; Illuminou-se logo a rampa em toda a sua extensão, por meio de archotes, e as carruagens ascendente e descendente, partiram ao som das palmas e dos hourrahs, de centenas de curiosos que estacionavam no largo da Annunciada.A subida effectuou-se não só sem o menor incidente, mas até com um belo resultado, realmente inesperado pelo proprio engenheiro, como este mesmo nos disse depois. Com effeito, nem o material fixo, como rails, roldanaş, etc., nem o circulante, estão sufficientemente poidos para que os attrictos estejam reduzidos ao minimum.O que é realmente phantastico é o cruzamento das duas carruagens caminhando na rampa, em sentido opposto, com rapidez verdadeiramente vertiginosa. É claro que este cruzamento se faz sempre sem o menor perigo para os passageiros, por quanto as vidraças são todas gradeadas de largas redes de arame que não permittem que, por descuido alguem se lembre de deitar a cabeça ou um braço por ellas; e portanto apezar da pequena distancia em que se cruzam as carruagens, não ha o menor receio de desgraça pessoal.Fizeram-se quatro ascensões todas com o melhor resultado, e as carruagens chegavam sempre ao fundo da rampa saudadas por bravos enthusiasticos da multidão agglomerada no largo.Estas ascenções fizeram-se todas com grande regularidade, havendo apenas a notar a grande demora que ha entre a chegada e a partida. É tal demora proveniente, como hontem dissemos, da insufficiencia da canalisação da agua que não permitte que o deposito que existe em cada uma das carruagens e que leva 3:500 litros, se encha com a rapidez desejada.
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Calçada e Ascensor do Lavra |1943-09-03| Obras de renovação dos elevadores do Lavra. Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente |
Grandes louvores cabem por esta occasião á gerencia da companhia das aguas que, animada da melhor vontade, não só reduzida 30 réis por metro cubico a agua destinada ao serviço da empreza, (o que afinal de contas é ainda caro) mas prometteu mudar a canalisação com a maior rapidez, devendo esta noite mesmo, começar essa obra.Ouvimos varias pessoas manifestarem alguns receios de andar no ascensor, attendendo á possibilidade de qualquer incidente, da ruptura do calabre, por exemplo. Não deve, porém, haver o menor receio, porque esse caso está previsto. O gancho de ferro que entra na calha e prende o calabre [cabo] está ligado por uma forte molla a uma grande alavanca, na extremidade da qual existe um contra-peso de 80 kilogrammas.Se por qualquer eventualidade se quebrasse o calabre, soltava se a molla, cahia o contra-peso, e o freio automatico, constituido por fortissimas braçadeiras de aço, apertava o eixo das rodas que parariam instantaneamente. Para evitar o glissement, existe sob as rodas que são denteadas uma cremalheira que acompanha os carris e que impossibilita o menor movimento logo que o freio automatico aperte o eixo.Por esta singela descripção pódem os nossos leitores imaginar quão bem disposto se acha todo o machinismo para evitar os menores incidentes, e que os ascensores teem entre nós um largo futuro pela grande facilidade que ha de, por meio d'elles e por modico preço, vencer o accidentado terreno da nossa capital. [Leal: 1882]
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Calçada e Ascensor do Lavra |c. 1940| Largo da Anunciada com a Rua das Portas de Santo Antão; Palacete Alfredo de Andrade Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente |
Texto muito a propósito tendo em conta os acontecimentos actuais.
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